segunda-feira, 20 de outubro de 2008

“Visão” turva

Maria de Lurdes Rodrigues deu mais uma entrevista como só ela é capaz. Desta vez foi a revista Visão que se encarregou da difusão das baboseiras. É impossível deixar sem resposta algumas das pérolas do “discurso” da senhorita.
"A escola (…) é para as pessoas se qualificarem."
Que credenciais apresenta a senhora para estar à frente do Ministério da Educação, se nem entende para que serve a escola? A escola não existe para passar certificados, senhora Ministra. A escola existe para ensinar. Talvez a palavra lhe não agrade. Compreende-se, o governo a que pertence está pejado de gente inculta que despreza o saber, ou pior, que detesta quem denota algum conhecimento. Mas como socióloga tinha a obrigação de saber que as sociedades do tipo ocidental foram construídas tendo por base o dito conhecimento. O objectivo da escola é a transmissão de conhecimentos, a certificação é uma consequência da aquisição destes e não um fim em si mesmo.
Instada a comentar a elevada carga horária dos alunos, pergunta ao jornalista: " Mas o que é que retirava? Retira o Inglês ou as línguas estrangeiras? A Matemática? O Português?"
Que esperteza saloia, senhora Ministra… É a senhora que exerce o cargo de Ministra da Educação e não o jornalista. Mas se quer sugestões para a melhoria da qualidade do ensino, porque não pergunta a quem está diariamente no terreno, os professores? Não pergunta porque sabe perfeitamente a resposta. Deram-lha inúmeras vezes nas reuniões que efectuou com os presidentes dos conselhos executivos. Sabe perfeitamente que as ACND's (Formação Cívica, Área de Projecto e Estudo Acompanhado) não acrescentam nada de significativo aos conhecimentos que as (outras) disciplinas transmitem. Sabe perfeitamente que o conteúdo das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) cabe facilmente noutra qualquer disciplina. Sabe perfeitamente que a Educação Visual, a Educação Tecnológica e a Oferta de Escola (na área artistica), podem ser transformadas numa única disciplina de Expressão Artística. E por saber que assim é, é que o não faz. É que a escola que preconiza é a escola dos meninos entretidos de manhã à noite, com muitos “debates” e “pesquisas” e, “negociações” de regras de comportamento e, “direito ao sucesso” (a triste expressão da senhora DREN que num país governado por gente íntegra dava direito a exoneração).
"Não é dramático que os alunos não tenham música ou desporto na escola".
É uma boa desculpa para o facto de haver em Portugal várias escolas, construídas há mais de 20 anos, que continuam a aguardar a construção de um pavilhão desportivo. Gosta tanto dos exemplos estrangeiros quando eles lhes convêm, que a desafio a apontar um país evoluído da União Europeia, que não releve a educação para o desporto. E vem depois, a senhora e outros que tais, mostrar-se preocupada com a obesidade infantil, fingindo que, por exemplo, a “ideia genial” das aulas de substituição foi obra de outro idiota qualquer.
"No passado era uma escola pública reduzida a mínimos absolutamente intoleráveis, uma escola que funcionava das nove à uma".
Esqueceu-se de dizer que as únicas escolas que funcionavam num horário “tão reduzido” eram as do 1º Ciclo (antigas escolas primárias) cujos alunos têm idades compreendidas (na generalidade) entre os 6 e os 10 anos. Lanço-lhe o mesmo desafio que acima: aponte países desenvolvidos onde crianças desta idade permaneçam mais tempo na escola. É que a senhora quer retirar às crianças o tempo para brincar porque a escola que defende é, na generalidade, uma brincadeira; quer retirar o tempo para as crianças estarem com os progenitores para que alguns patrões sem escrúpulos elaborem horários de trabalho incompatíveis com a vida familiar. A sociedade que idealiza é a dos senhores e dos escravos. A escola que preconiza é a da estupidificação, através de alunos que repetem o que ouvem sem qualquer capacidade de raciocínio e de crítica fundamentada.
"Felizmente, temos muitos professores que aceitam, querem e consideram que estas são formas de valorizar a escola."
A senhora socióloga, cuja missão no Ministério da Educação parece ser a da produção de estatísticas que deturpem a realidade, deveria apresentar números que concretizem o significado de “muitos professores”. É que por mais incompetente que se seja, ocupando um cargo de topo numa qualquer organização, há sempre gentinha disposta a lamber-nos as botas, ainda que a imundice as cubra. Só por incapacidade psíquica ou por pura malvadez é que a senhora não admite que, as políticas execráveis que a sua equipa tem implementado (ou mantido), constituem o mais sério problema que a escola pública portuguesa enfrenta.
Apache, Outubro de 2008

3 comentários:

Diogo disse...

Absolutamente de acordo, Apache. Estive numa reunião de professores como pai (tenho um filho de 10 anos), e fiquei abismado com as charadas educativas. Os miúdos têm aulas de 90 minutos! Até eu tinha dificuldade em aguentar.

BIA disse...

Cem por cento de acordo. Quem assim escreve sabe o que diz!

Vou ler e reler. Quem me dera conseguir expressar-me assim, desta forma tão clara, directa e verdadeira! Se assim fosse, havia de escrever uma bela carta a esses senhores empinados que se julgam donos do mundo... (ai se eles caiem!)
Metade do meu tempo ando dopada, a outra metade durmo...grande parte da culpa desta minha actual situação é o lindo trabalho que andam a fazer à Educação...à minha querida "escola" e por não conseguir reagir adequadamente!

Bem hajam os que se não calam perante tanta abominação!

Abraço sentido


BIA

Apache disse...

É verdade, Diogo, aulas de noventa minutos, 13 disciplinas, apenas 2 intervalos durante a manhã, um deles passado na fila do bar para conseguirem comprar uma sandes e metade do outro a tentar ir à casa de banho (isto porque algumas escolas têm apenas 4 casas de banho para cerca de mil alunos. Isto para não falarmos das más condições físicas de algumas escolas e da lástima que são os actuais programas curriculares.

Obrigado pelas palavras, Bia. Não há nenhum problema com a tua escrita.
Um abraço.