quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O ranking das escolas

Na passada terça-feira, a SIC divulgava o ranking das escolas do ensino secundário (com mais de 100 provas realizadas), ordenado de acordo com as classificações obtidas pelos alunos nos exames nacionais, às 12 disciplinas mais representativas. Como era de esperar, acentuou-se a tendência dos 4 anos anteriores, de afundamento na tabela, das escolas públicas. Continua (à semelhança do sucedido em 2008) a não haver nenhuma pública nos 10 primeiros lugares e contam-se apenas 6 nos 25 lugares cimeiros. É claro que estes rankings interessam essencialmente aos estabelecimentos de ensino privado que ocupam os primeiros lugares, porque daí advém a publicidade resultante da conclusão fácil de que as escolas onde os alunos obtêm (em média) melhores resultados, apresentam a melhor qualidade de ensino. Será? Convém lembrar que parte significativa dos professores que leccionam no privado, fazem-no por não terem obtido colocação em escolas públicas, o que inviabiliza qualquer conclusão em termos de qualidade do corpo docente, em ambas as realidades. Convém ainda esclarecer que a maioria das escolas públicas faz selecção de alunos, umas de forma mais directa, recusando liminarmente os que apresentam classificações mais baixas, outras indirectamente, através das elevadas mensalidades cobradas. Uma das curiosidades deste ranking, é constatar que, após 4 anos e meio de tutela de Maria de Lurdes Rodrigues à frente do Ministério da Educação, com quase todas as medidas de politica educativa centradas: na avaliação do desempenho docente, no aumento dos equipamentos tecnológicos e, no aumento do tempo de permanência de docentes e de discentes, nas escolas, os alunos dos estabelecimentos de ensino público, se afastam cada vez mais do desempenho dos seus colegas do privado. Quanto tempo mais é preciso, para que certa gentinha perceba que a grande diferença entre o público e o privado está no aluno?! São os alunos, através do seu comportamento, da sua atenção, do seu empenho e participação nas actividades, o factor determinante das classificações obtidas. Papel importante, através do acompanhamento dos mesmos (da disciplina que incutem, das expectativas que geram), é o desempenhado pelos encarregados de educação. Tudo o mais, são pormenores. O texto que a seguir transcrevo, publicado no blogue “Pedro na Escola”, relata um caso real que vai de encontro ao que muitos professores pensam mas poucos têm a coragem de assumir. “Hoje, recebemos um telefonema de uma jornalista do jornal Público, que desejava saber quais foram os factores que nos fizeram subir mais de 700 lugares no ranking nacional, segundo as estatísticas daquele órgão de comunicação social. Nós ainda não sabíamos do nosso lugar no ranking, mas a senhora jornalista fez o favor de informar. Um salto fabuloso! A simpatia da senhora jornalista foi tanta que até sugeriu respostas: mudança de práticas?, mudança de professores?... Com o devido respeito, tenho a dizer que é preciso muita patetice junta e concentrada para sequer se ousar pensar que se trepam 700 lugares num ranking às custas de mudança de práticas ou de professores. É preciso viver mesmo noutro planeta para se adiantar hipóteses destas. Francamente! Ainda assim, foi necessário dar resposta à senhora jornalista, não sei bem para quê, pelo que se gerou ali logo uma saudável discussão sobre os tais factores que fizeram a diferença. Eu tentei forçar a barra, insistindo que o único factor em causa era a mudança dos pais dos alunos. Alunos diferentes, porque pais diferentes, e o resto são estórias da Carochinha, disse eu. Não colou. Assim sendo, elencámos três factores para justificar o salto: 1- Em 2008, não tínhamos uma turma de CEF no 9º ano, pelo que a exame foram alunos interessados, alunos assim-assim e alunos que se estavam a borrifar completamente para a escola (estes com a conivência dos pais, obviamente). Em 2009, mais de um terço dos alunos do 9º ano estavam num CEF, pelo que, automaticamente, acabaram os níveis 1, e os níveis 2 ficaram em minoria. 2- Os alunos que foram a exame, em 2008, tiveram um 3º ciclo para esquecer, sempre com malucos na turma, a provocarem diariamente perturbações e interrupções das aulas para tratar da indisciplina. Os alunos que saíram do 2º ciclo com quatros e cincos, terminaram o 3º ciclo, incapazes de passar acima da fasquia do 3. Tiveram azar, coitados, aqueles que sonhavam voar mais alto, porque, às custas de três ou quatro “órfãos de pais vivos”, ficaram com as “pernas cortadas” para o futuro. 3- Calhou, em 2009, grande parte dos alunos vir desde o 7º ano sem malucos nas turmas e, além disso, grande parte dos alunos ter pais com expectativas, que nunca se demitiram do seu papel de pais, nem das suas exigências para com os deveres e obrigações dos filhos (entenda-se: estudar, ter bons resultados e ter bom comportamento). Calhou, simplesmente. Tiveram sorte, estes alunos. Têm pernas para andar, uns querem seguir para medicina, outros para engenharias, e por aí fora. As práticas lectivas, os apoios dados pela escola, a qualidade dos professores e mais uma mão-cheia de balelas que enchem páginas de jornais, revistas e blogues, são de uma irrelevância brutal neste assunto. Lamento como tanto se insiste em factores que, na minha humilde opinião, não passam de poeira, de tão insignificantes que são. E falo com conhecimento de causa. Fui professor destes alunos que subiram 700 lugares no ranking, durante todo o 3º ciclo, e preparei-os para o exame nacional. Tal como todos os meus colegas de Matemática que também prepararam os seus alunos para o exame nacional. Ao contrário do que muitos patetas pensam, não se faz pão sem farinha! E a minha escola teve muita sorte, porque, em 2009, teve um saco cheio de farinha, quando habitualmente o saco traz bem mais areia do que farinha...”
Apache, Outubro de 2009

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