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sábado, 4 de fevereiro de 2012

Uma chibatada nos vendilhões

Vasco Graça Moura recentemente empossado como Presidente do Centro Cultural de Belém (CCB) propôs, e a Administração aceitou por unanimidade, a não aplicação do Acordo Ortográfico (AO) de 1990, que o anterior Governo introduziu à força nos organismos sob sua tutela directa ou indirecta e que o actual Governo insiste em aplicar à revelia de qualquer bom senso. O documento datado de 2 de Fevereiro, aprovado pela Administração do CCB, determina a desinstalação imediata do programa informático que procede à conversão automática da grafia dos textos para o novo AO e a aplicação, a toda a documentação, da ortografia vigente em Portugal antes da negociação do chamado Acordo Ortográfico de 1990.
Recorde-se que o AO havia sido imposto no CCB por uma directiva interna, datada de Setembro de 2011, assinada pelo antigo Presidente, António Mega Ferreira, que Francisco José Viegas, actual Secretário de Estado da Cultura (e simpatizante do aborto linguístico) pretendia reconduzir no cargo.
Vasco Graça Moura (VGM) justificando uma decisão que “meia” blogosfera apelida de corajosa, mas que se me afigura, essencialmente, coerente (VGM é um dos mais destacados críticos da aberração e já atingiu um patamar em que para sobreviver com dignidade não precisa fazer favores às meretrizes do regime) afirma que sempre disse ao Secretário de Estado da Cultura que era esta a sua posição, a qual é conhecida por todos os membros do Governo. Para VGM esta é uma decisão, apesar de tudo, aparentemente fácil, pois o CCB é uma fundação de direito privado não estando, portanto, sob tutela directa ou indirecta do Estado, não sendo obrigado à aplicação do AO. Note-se que a generalização da aplicação do dito ocorrerá(?) apenas em 2014 e mesmo depois dessa data não deverá ser possível encontrar forma de penalizar os privados pela sua não aplicação (além do ridículo da penalização por “erro ortográfico” acrescem, do ponto de vista jurídico, sérias dúvidas de constitucionalidade do AO).
Neste ano lectivo, em cumprimento do disposto na resolução do Conselho de Ministros, datada de 25 de Janeiro de 2011, liderado pelo agora refugiado em Paris, vários professores, nomeadamente de Língua Portuguesa, começaram a adoptar nas suas aulas (principalmente nos primeiros anos de escolaridade) a grafia do AO. Pergunto: entre tantos Directores de escolas, à beira da reforma, não haverá uma meia-dúzia com tintins suficientes para tomarem decisão idêntica à de VGM e suspenderem a aplicação da aberração? Ou estão com medo de levar tautau das mais delico-doces guardiãs da pateguice?
Apache, Fevereiro de 2012

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Do Acordo “horto-gráfico”… (2)

Ainda a propósito do (des)acordo ortográfico, Vasco Graça Moura, uma das personalidades mediáticas que mais se tem manifestado publicamente contra este escabroso cozinhado, esteve no programa da RTP1, “Bom dia, Portugal” e, como é seu hábito, não poupou críticas ao dito. Reproduzo aqui as palavras do escritor… “Devo dizer que considero o acordo ortográfico um chorrilho de asneiras, absolutamente incompatível com a dignidade da língua portuguesa e da identidade do nosso país, não por qualquer espécie de nacionalismo exacerbado, mas porque o acordo é completamente desajustado à maneira como nós falamos a nossa própria língua, e quando digo nós não digo apenas os portugueses de Portugal, digo os que falam português em Angola, em Moçambique, na Guiné-Bissau, em Cabo Verde, em São Tomé e até em Timor. O acordo vem desfigurar a maneira de pronunciar, e instaurar a mais perigosa confusão para a ortografia. É mesmo o contrário da ortografia. Este combate nem é inglório nem é em vão. Porque o acordo não pode entrar em vigor. Basta dizer o seguinte. O acordo é internacional. Para um acordo internacional entrar em vigor é necessário que seja ratificado por todos os países que o subscrevem. Não aconteceu ainda. É completamente inválido o protocolo modificativo, que prevê que apenas três países subscrevam e ratifiquem, para depois se aplicar aos restantes. Não estando o acordo em vigor no plano internacional, também não pode estar no plano nacional. Primeira questão. Segunda questão, mesmo que estivesse, um pressuposto da aplicação do acordo é a existência de um vocabulário ortográfico comum, o que quer dizer dos sete países que subscreveram o acordo. Não existe. Sem esse vocabulário ortográfico, não pode ser aplicado.” “(…) Se amanhã a facultatividade for a regra, quer dizer que você pode escrever uma palavra com ‘p’ mudo ou ‘c’ mudo e eu posso escrevê-la sem eles, e valem as duas formas. Desapareceu a ortografia, a maneira correcta de escrever, para ficar tudo «à vontade do freguês». Considero perigoso, porque o acordo tem critérios divergentes e imprecisos, e portanto impede que haja formulações padrão, que permitam escrever tudo da mesma maneira. O Professor António Emiliano demonstrou que há palavras que, com o acordo, se podem escrever de quatro a trinta e duas maneiras diferentes. Então onde está a unidade ortográfica? Quer-se evitar um divórcio entre a grafia brasileira e a grafia portuguesa, e vai-se instaurar, muito pior que um divórcio, o caos total na maneira de escrever a nossa língua? E acha natural que se suponha que eu tenha que saber como se pronuncia a minha língua no Brasil, por exemplo, para saber como a hei-de escrever? Porque tem de se saber onde é que se pronuncia o ‘p’ e o ‘c’, nas várias formas ditas cultas de português (também ninguém sabe o que é uma forma culta, no sentido em que o acordo a refere), tenho de saber como se fala a minha língua num país estrangeiro para poder escrever a minha própria língua?” “(…) As vogais, no Brasil, são abertas, e em Portugal tendem para o emudecimento. Por isso, quando estão lá um ‘p’ ou um ‘c’ ditos mudos (impropriamente chamadas consoantes mudas) estão lá porque têm uma função, que é a de abrir a vogal que as antecede. Isto é absolutamente fundamental. Se há irresponsáveis políticos (de que eu exceptuo, neste momento, a Ministra da Educação, que, apesar de tudo, tem tido o cuidado de protelar [a aplicação]) que não prestam atenção a isto, nem sequer deviam ter cargos políticos. Isto é um crime contra a língua portuguesa, e sendo um crime contra a língua portuguesa é um crime contra a identidade nacional."
Apache, Fevereiro de 2011

sábado, 2 de janeiro de 2010

Gostaram, querem mais? Lambuzem-se!

“Em tempo de balanços, eu, pecador, me confesso. Pelas reacções exacerbadas de algumas criaturas que regularmente escrevem em blogues ou enviam uns comentários enxofrados para a redacção do Diário de Notícias, apercebo-me de que sou um sujeito de um reaccionarismo sem remédio, indigno de se exprimir em letra de forma, devendo até ser silenciado de vez neste jornal diário cujas quartas-feiras me obstino em conspurcar. Para evitar o alvoroço destas contundências assim eriçadas em prol do saneamento sumário de quem tão mal opina, não me valeu de nada ter procurado agir com alguma moderação hebdomadária, usando de prudente e edulcorado estilo e pagando o preço de alguma insinceridade própria. Porque eu, reconheço, nem sempre tenho sido cem por cento sincero na minha funesta execrabilidade. Por vezes, se acaso estava a pensar na "choldra" do venerando Afonso da Maia, mais me valia ter tido a coragem de falar logo em "canalha". E podia muito bem louvar-me em Guerra Junqueiro para falar de "um povo imbecilizado e resignado (…) que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem de onde vem, nem onde está, nem para onde vai". Depois, não foi lá muito brilhante só me terem ocorrido termos como "fraude", "traquibérnia" e outros sarcasmos de congruente quilate, sempre que ouvi o Governo, apaniguados e adjacentes a asnear, ou a dizer e a prometer mundos e fundos enterrando-nos cada vez mais, ou sempre que os vi meter os pés pelas mãos e as mãos pelos pés, sem vergonha nem contenção, fosse no Parlamento, fosse perante as magistraturas, fosse na comunicação social. O que eu devia era ter aplaudido essa vilanagem, ao menos por assumir a única transparência de ser tão igual a si mesma que já não engana nem convence ninguém. E além disso, de pouco me valeu sustentar, em nome da mais elementar profilaxia e em obediência a um correspondente imperativo de higiene política, que o Governo devia ser derrubado o mais depressa possível. Tudo isso é tão óbvio que eu não precisava de recorrer a uma formulação tão radicalmente fracturante que só serviu para carregar as visagens ofendidas de umas tantas harpias que para aí crocitam exultantes de socialismo, de par com baratas tontas e demais almas satisfeitas com o status quo. Entretanto, ponderei. Fiz mal em convencer-me de que era mais do que tempo de o Presidente da República dar um pontapé nos fundilhos do Primeiro-ministro. Afinal, isso é o que o Primeiro-ministro mais deseja e tenta provocar todos os dias. Passei a alimentar a fundada expectativa de que Cavaco Silva não embarque em provocações e pantominas, mas sem deixar de manter o homem ao alcance da biqueira. «Just in case.» Devo ainda reconhecer que não me valeu de nada ter afirmado que o Governo não valia a ponta de um chavelho e que Portugal se estava a tornar numa fossa nauseabunda, e muito menos ter tido a tentação de qualificar o estado a que isto chegou com uma comum palavra de cinco letras. Abstive-me desse vezo plebeu por meras questões de sensibilidade pituitária. Poderei sempre usar o eufemismo menos fétido de que o país está na perda. Mas o certo é que cominei aos interessados que se besuntassem indiscriminadamente e não atentei em que o verbo reflexo "besuntar-se" pode ter conotações desagradáveis de chafurdação excrementícia, embora eu apenas tivesse em mente uma substância mais propriamente vaselínica, apontando ao massajar das ventas estanhadas com qualquer unguento benfazejo para aformoseamento, tanto dos rostos e das cútis, como das políticas hipócritas, dos erros crassos, das batotas escandalosas e das corrupções mal disfarçadas. Em tempos de palinódia, há que abandonar essa ideia primária de besuntação e pedir desculpa aos mais alérgicos por não o ter feito mais cedo. Afinal, o sucesso de um cronista faz-se de complacências discretas com a mundanal trepidação… E assim, no começo de um novo ano fremente de promessas radiosas e de monumentais aldrabices e falhanços concomitantes, parece-me preferível transpor daquele plano superficial e epidérmico para outro, mais gustativo e entranhável. E passo a dizer: Com que então votaram nessa gente? Quiseram elegê-los? Gostam do resultado? Pois agora lambuzem-se!”
Vasco Graça Moura, no “Diário de Notícias” de 30 de Dezembro