Às 15:50, terminava em Lisboa a conferência de imprensa dada pelo advogado Garcia Pereira e por um grupo de professores que, no exercício do direito de expressão e de livre pensamento exibiram com distinção, pública lição de cidadania.
A todos os que entenderem útil, não só nas questões relacionadas com a avaliação docente mas, de uma forma geral, enquanto expositor (por analogia) da forma inconstitucional e atabalhoada como o Ministério liderado por Maria de Lurdes Rodrigues tem produzido leis, regulamentos e despachos, deixo (via “A Educação do Meu Umbigo”) as conclusões do parecer hoje integralmente divulgado.
«1ª O normativo contendo o sistema de quotas para a avaliação dos professores estabelecido e constituído pelas disposições conjugadas do artigo 46º, nº 3 do ECD, aprovado pelo Decreto-Lei nº 15/2007, de 19/1 e do Decreto Regulamentar nº 2/2008, em particular o seu artigo 21º, nº 5, deve reputar-se de ferido de múltipla inconstitucionalidade material, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade, da transparência, da justiça e da imparcialidade (artigos 13º, 266º, nº 2 da Constituição).
2ª Sendo o regime de avaliação dos professores claramente matéria de reserva de lei (em sentido amplo), e aliás constante do próprio ECD, em todos os pontos em que um Decreto Regulamentar disponha de forma diversa do estatuído naquele, ou interprete ou integre alguma das suas normas, ou venha criar regime jurídico novo, ele padecerá de inquestionável e incontornável ilegalidade, por força do artigo 112º, nº 1 da CRP.
3ª O específico regime (de alteração do ECD) consagrado no Decreto-Lei nº 15/2007, havendo sido produzido pelo Governo no âmbito de matéria de reserva pelo menos relativa de competência da Assembleia da República, por força do artigo 165º, nº 1, alíneas b) e t), mas sem estar a coberto da competente autorização legislativa, tem de ter-se por organicamente inconstitucional.
4ª Não constando do Decreto-Lei nº 15/2007, bem como de todos os diplomas legislativos e regulamentares subsequentes, que contêm inequivocamente matéria de “legislação do trabalho” a que se refere o artigo 56º, nº 2, alínea a) da CRP, a referenciação exacta e concreta de como e quais as associações sindicais que terão sido prévia e efectivamente ouvidas, mas apenas a declaração “tabelar” de que “foram observados os procedimentos da Lei nº 23/98, de 26/5″, todos esses diplomas se têm de ter formalmente inconstitucionais.
5ª Ao consubstanciar uma substancial inovação que representa um verdadeiro e próprio retrocesso ou desvalorização categorial dos professores, afectando os valores da segurança jurídica e da tutela das expectativas legítimas, alterando-lhes de forma tão drástica quanto inesperável e inesperada “as regras do jogo” no decurso do mesmo, tratando desigualmente e em função de critérios em absoluto aleatórios e arbitrários (v.g. o mero desempenho de cargos apenas nos últimos sete anos) situações substancialmente iguais e afectando de forma desproporcionada, desadequada e desnecessária o princípio da liberdade de escolha da profissão e acesso à Função Pública e de nelas permanecer e progredir, o regime constante do ECD com a nova redacção conferida pelo citado Decreto-Lei nº 15/2007 padece, também, de múltipla inconstitucionalidade material, por violação dos artigos 2º, 18º, 47º e 266º, nº 2 da CRP.
6ª Como o está também a solução normativa consubstanciadora das elevadíssimas percentagens do cumprimento das actividades lectivas exigidas para a obtenção de “Excelente” (95% no artigo 46º, nº 5 do ECD de 2007 e …. 100% no artigo 21º, nº 5 do Decreto Regulamentar nº 2/2008), ao menos se interpretada e aplicada no sentido de que qualquer docente que não cumpra actividade lectiva numa situação de força maior, de exercício de um direito ou de cumprimento de um dever que não é legalmente equiparado a serviço efectivo nos termos do artigo 103º do ECD é considerado em situação de incumprimento da actividade lectiva e, logo, gravemente prejudicado ou mesmo de todo impossibilitado no acesso àquela classificação.
7ª Todos os pontos em que os Decretos Regulamentares – (v.g. Decreto Regulamentar nº 1-A/2009) quando por exemplo vem inovar ou alterar o ECD, ao estabelecer que a avaliação científico-pedagógica, imprescindível nos termos do ECD na avaliação de todos os docentes, seria afinal apenas exigível para um certo universo mais reduzido de professores, que a avaliação dos membros do Conselho Executivo depende exclusivamente do seu Presidente e que este seja avaliado apenas pelo Director Regional da Educação - se e quando venham inovar ou alterar o regime constante do acto legislativo - têm de se ter por manifestamente ilegais, por violação do mesmo ECD, estando vedado a este, pelo artigo 112º, nº 5 da C.R.P., autorizar tais “inovações” ou “alterações” por via regulamentar.
8ª O artigo 10º do Decreto-Lei nº 200/2007 está em frontal contradição com a letra e a “ratio” do ECD de 2007 visto que este considera que a atribuição da categoria de professor titular com as suas funções acrescidas (v.g. de avaliação de outros professores) se fundamenta num critério de maior experiência acumulada e aquele vem impor a consideração de apenas os últimos sete anos lectivos, desvalorizando todos os restantes.
9ª O facto de constituírem factor de classificação do docente - independentemente da sua suspensão nesta fase - as classificações por ele atribuídas aos alunos é susceptível de representar um óbvio e inaceitável conflito de interesses, gerador de constitucionalmente inaceitáveis dúvidas objectivas acerca da imparcialidade do docente.
10ª Face quer ao ECD (maxime, o seu artigo 44º), quer aos subsequentes Decretos Regulamentares (seja ao nº 2/2008, seja ao nº 1-A/2009), forçoso é concluir que em lugar algum do regime jurídico se estatui a obrigação de apresentação pelo docente dos referidos objectivos individuais ou a consequência jurídica de que a não apresentação impossibilite o decurso do processo de avaliação, constitua infracção disciplinar e inviabilize a contagem do tempo de serviço do professor.
11ª Sendo que todos os comandos em matéria de entrega pelos professores dos objectivos individuais decorrentes dos Decretos Regulamentares que vão contra ou para além do estabelecido no ECD (designadamente quando sejam interpretados e aplicados como significando estatuir a obrigatoriedade daquela entrega) serão manifestamente ilegais, e uma vez que num Estado de direito, o Estado e toda a Administração Pública devem actuar em estrita obediência à lei (maxime, a lei constitucional), as únicas conclusões que se impõem retirar é que não apenas por parte dos professores nenhuma obrigação existe, fixada por norma legal válida, da apresentação dos respectivos objectivos individuais, como nenhuma consequência pode advir do incumprimento ou desobediência de um comando ou ordem ilegal, designadamente de ordem disciplinar (procedimento por pretensa violação do dever de obediência) ou outra (perda de tempo de serviço).
12ª Tal obrigação não poderá também considerar-se validamente constituída se os respectivos pressupostos fácticos e temporais não estiverem reunidos, sendo assim igualmente ilegítima a tentativa de imposição de que a definição dos objectivos individuais ocorra não no período inicial do ciclo de avaliação mas mais de cinco meses depois, e o mesmo se dizendo quanto à fixação e divulgação dos “instrumentos de registo” e dos “instrumentos de medida” a que se reportam os artigos 6º e 8º do Decreto Regulamentar nº 2/2008.
13ª Rigorosamente a mesma conclusão se impõe, e até por maioria de razão, se na Escola ou Agrupamento de Escola de todo não existirem, não houverem sido estabelecidos ou não tiverem sido disponibilizados aqueles mesmos “instrumentos”.
14ª Por fim, todo o “regime simplificado” estabelecido pelo Decreto Regulamentar nº 11/2008, representando uma alteração por via de fonte inferior à Lei do regime do ECD (maxime do seu artigo 44º), tem de se ter por manifestamente ilegal, o mesmo se devendo dizer dos artigos 2º, 5º e 7º do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009.»
Apache, Fevereiro de 2009
2 comentários:
E então?! Qual a sua opinião???
Peço desculpa por não ter respondido antes mas só agora vi este seu comentário.
Apetece-me devolver-lhe a pergunta…
Tanto Vossa Alteza como o Doutor Garcia Pereira (GP) são especialistas na área, portanto, de pouco vale a minha opinião, no entanto aqui fica.
Tenho muitas dúvidas em relação ao ponto 4 destas conclusões, em tudo o mais, tirando um ou outro pormenor de somenos importância, subscrevo a opinião de GP.
A novidade lançada por este ministério de alterar por Decreto Regulamentar, Portaria, Despacho (e até e-mail não assinado) o disposto em Decretos-Lei e Leis parece não deixar dúvidas que deve ter-se por inconstitucional, por violação do disposto no art. 112º da Constituição da República Portuguesa, quanto à hierarquia das fontes de direito.
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