«HanusheK, economista da Educação por quem Nuno Crato tem grande apreço e trouxe recentemente a Portugal, foi dos primeiros a apontar a “falta de incentivos mercantis” (Journal of Human Resources, Junho de 1979) quando analisava a eficiência em Educação. Atente-se bem à semântica da expressão, não descuidada num académico com a responsabilidade dele. Mercantil é um adjectivo que se refere ao comércio, à mercancia, coisa bem afastada do objecto da Educação, suponho eu. Se tomarmos o vocábulo em sentido figurado, diz-se daqueles que perseguem só ganhos materiais, que são interesseiros e meros especuladores. A génese da avaliação do desempenho pode ser facilmente compreendida por quem a estude a partir da segunda metade do século passado, quando tomou relevância a preocupação política e económica de analisar em detalhe os custos de produção do serviço público de Educação. Por o ter feito, por a ter abordado na prática, em experiências e projectos de natureza educacional e empresarial, compreendo-a bem, rejeito-a como panaceia para a melhoria da qualidade da Educação e lamento que os professores e a sociedade em geral a aceitem como os crentes aceitam os dogmas, isto é, com reverência sacra. A avaliação do desempenho tornou-se um instrumento de uma concepção tecnocrática de gestão. A prática de modelos estereotipados para a realizar está estudada e reprovada pelo balanço dos resultados. Assim, a grande alteração que ficou por fazer foi desistir dela. O processo deveria ser indissociável da avaliação do desempenho de cada escola, depois de alterar radicalmente o modelo de gestão vigente. É estúpido avaliar com as mesmas referências e medidas o que é radicalmente diferente. É estúpido impor a todos o mesmo processo. É estúpido confundir a Educação com a actividade mercantil. Sei que incorro na fúria de muitos. Mas é o que penso e o que considero essencial. Tudo o mais é acessório, embora relevante, por ser tomado por essencial.
Posto isto, vejamos, então, o acessório. Isenta-se da avaliação cerca de um terço dos docentes em exercício. Esperta malha. Calam-se muitos. Reduz-se o número de aulas a observar e, com isso, custos enormes e logística disforme. Pouco importa que se recupere, implicitamente, o conceito de professores titulares e que vá às urtigas o rigor do ministro e o que resta da coerência do seu discurso.
Quotas viram percentis. Boa jogada! É mais erudito, ou não fora o ministro um mestre em Estatística e o secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar um anterior defensor da avaliação de Maria de Lurdes Rodrigues. E neste ambiente em que todos começam a fazer de conta que não foram o que foram e não disseram o que disseram, faz de conta que as quotas desapareceram. Como reclamavam os sindicatos. Se assinarem rápido o papel, substituam “acordo”, de má memória, por um sinónimo. “Ajuste directo” ou “conúbio” seria perfeito e adequado aos tempos!»
Se afastarem a espuma, encontram o mesmo disfarce ideológico, que visa condicionar a independência intelectual e profissional do exercício da docência: pela precarização da profissão (fala Crato de assistir os “novos” isentando os “velhos”, ignorando que muitos dos “novos” têm 10, 15 e até mais anos de exercício); pela proletarização da profissão; pela persistência da desconfiança militante na classe; pelo refinamento dos padrões de desempenho, como se professor fosse sapateiro (sem desprimor para com tal ofício).
Também isto, Álvaro de Vancouver, o ajudará a saber o que é um neoliberal.
Santana Castilho, no “Público” de 17 de Agosto
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