sexta-feira, 24 de outubro de 2008

"Como é possível a generalização da loucura?" - Santana Castilho

"Ao memorando de entendimento entre a plataforma sindical e o Ministério da Educação, assinado a 17 de Abril de 2008, sucedeu uma atmosfera beligerante latente e um clima de apaziguamento pelo terror. Entrou-se numa espécie de guerra fria, que tem garantido a paz entre ministério e sindicatos pelo preço da escravidão endémica dos professores. Ora equilíbrios conseguidos sobre desequilíbrios, ou entendimentos momentâneos sobre desentendimentos de toda a vida são coisas de engenharia social doentia, que só podem produzir desastre. A face visível desse desastre é o actual êxodo dos professores mais experientes. A invisível, ainda mais grave e comprometedora do futuro do país, é a imbecilização crescente dos alunos, sujeitos a lógicas de sucesso sem conhecimento e anestesiados por Magalhães a pataco. Em 2007 reformaram-se cerca de 3300 professores. Este ano já vamos em mais de 5000 e o ritmo parece estar a acelerar. É só ver as longas listas do Diário da República. Os testemunhos, chapados na imprensa, de docentes que aceitam penalizações gravosas de 30 e 40 por cento sobre pensões de reforma para toda a vida, ao mesmo tempo que reiteram o amor a uma profissão que, garantem, abraçaram por vocação e só abandonam por coacção, transformam um processo de reforma num processo de excomunhão. Um país maduro estaria hoje a reflectir aturadamente sobre o que Fernando Savater escreveu: “A primeira credencial requerida para se poder ensinar, formal ou informalmente e em qualquer tipo de sociedade, é ter-se vivido: a veterania é sempre uma graduação.” A vida dos professores nas escolas tem-se vindo a transformar num inferno. A missão dos professores, que é promover o saber e o bem colectivo, está hoje drasticamente prejudicada por uma burocracia louca e improdutiva, que os afoga em papéis e reuniões e os deixa sem tempo para ensinar. A carga e a natureza do trabalho a que se obrigam os professores são uma violentação e um retrocesso a tempos e a processos que a simples sensatez reprova liminarmente. Ocorre, então, a pergunta: como é possível a generalização da loucura? A resposta radica no uso do modelo publicitário (cortejo ridículo de 23 governantes para entregar o Magalhães e 35 páginas de publicidade paga e redigida sob forma de artigos são exemplos bem recentes) e das técnicas populistas. O Governo tem conduzido a sua campanha de subjugação dos professores repetindo até à exaustão os mesmos paradigmas falsos e os mesmos slogans facilmente memorizáveis pelos justiceiros dos “privilégios” dos docentes. As ideias (a escola a tempo inteiro, por exemplo) são tão elementares como as que promovem os produtos de uso generalizado (o Tide lava mais branco). Mas tal como os consumidores se tornam fiéis ao produto cujo slogan melhor memorizam, embora sabendo que a concorrência faz exactamente o mesmo, assim se têm cativado apoiantes com a solução de problemas imediatos, que nada têm a ver com o ensino. E a dissolução sociológica dos professores pela via populista tem procurado ainda, com êxito, identificar e premiar uma nova vaga de servidores menores - tiranetes deslumbrados ou adesivos - que responderam ao apelo e massacram agora os colegas, inflados com os pequenos poderes que o novo modelo de gestão das escolas lhes proporciona. A experiência mostrou-me que o problema do ensino é demasiado sério e vital para o abandonarmos ao livre arbítrio dos políticos. "Bolonha", a que este Governo aderiu, ou a flexibilização das formações, que este Governo promoveu através do escândalo das "novas oportunidades", não se afastam, nos objectivos, dos tempos da submissão ao evangelho marxista, ou seja, os interesses das crianças e dos jovens cedem ante a ideologia dominante e o resto só conta na medida em que seja eleitoralmente gratificante. Assim, contra a instauração de um regime de burocracia e terror, para salvaguardar a sanidade mental e intelectual dos professores, encaro o protesto e a resistência como um exercício a que ninguém tem actualmente o direito de se furtar."
Santana Castilho – Professor do Ensino Superior

5 comentários:

BIA disse...

Bom dia, bem hajas meu irmão de jornada!

Posso usar este texto que aqui tens, na minha página?

Será uma forma sacudir as mentes de quem o vier a ler, de contribuir para um melhor conhecimento da situação e de protestar contra o rumo a que estão a empurrar o nosso País.

Abraço aberto ao teu


BIA

Apache disse...

Este texto não é da minha autoria, Bia. Está aqui publicado porque o subscrevo, mas é da autoria de Santana Castilho e veio no Público do passado dia 16.
De qualquer forma podes publicar qualquer texto aqui do blogue da minha autoria. Quanto aos outros (estão a letra azul) saíram na comunicação social, portanto acho que podem ser republicados.

Abraço.

Diogo disse...

Apache,

A letra azul sobre preto dificulta a leitura dos textos. Tive de copiar o texto para uma folha Word para o conseguir ler.


O que os sucessivos governos têm andado a fazer, com o actual a bater todos os recordes, são políticas terroristas contra alunos e professores. Mas este género de políticas não se esgota no ensino.

Abraço

BIA disse...

Sim, meu amigo, eu percebi de quem é o texto desde o início. Está bem indicado!

Acho que é uma boa ideia postá-lo também no meu blog! já que não posso fazer mais nada!


Abraço amigo


BIA

Apache disse...

Diogo, não encontro explicação para as tuas “reclamações”. A letra em azul clarinho destaca-se bem em fundo preto. Não acho que letras brancas em fundo preto contrastem de forma muito diferente (em termos de cansaço para a vista) de letras pretas em fundo branco. A maioria dos blogues são em fundo branco, escolhi o preto para variar um pouco, permite um bom contraste com as cores claras, enquanto o branco contrasta melhor com cores escuras, mas não muitas disponíveis. Será que não há algum problema com o ajuste de cor, brilho ou contraste do teu monitor? Ou com a resolução? Já tentaste fazer zoom (no canto inferior direito do monitor)? Nunca ninguém tinha reclamado. Sinceramente, não estou com tempo, nem muita vontade de mudar o fundo. Ao fazê-lo, perdem-se as alterações feitas ao “modelo”.
Quanto ao comentário, tens razão. Infelizmente, este tipo de políticas não se esgota no ensino.

Abraço, Bia.