"Eras sobre eras se somem, no tempo que em eras vem. Ser descontente é ser homem... Que as forças cegas se domem pela visão que a alma tem!" (Fernando Pessoa)
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terça-feira, 11 de novembro de 2014
domingo, 28 de setembro de 2014
Pesquisa inconveniente (2)
As “ilhas de plástico”
O Projecto Malaspina permitiu também,
não propriamente uma conclusão, antes uma constatação que já quase "toda a gente"
sabia mas raramente aparece referida na comunicação social: a famosa “Ilha de
Plástico”, supostamente existente entre a costa dos estados norte-americanos do
Oregon e da Califórnia e o arquipélago do Havai, obviamente, não existe. Muito menos, as cinco
“ilhas” modernamente alegadas. [Após o sucesso mediático da invenção da dita
”Ilha de Plástico” (numa zona, relativamente isolada, para onde a circulação
oceânica conduziria os plásticos flutuantes) alguns oportunistas alegaram
existirem ainda mais quatro ilhas “idênticas” noutras tantas zonas remotas do
planeta, onde as correntes oceânicas são similares.]
A possível existência da “ilha”
foi prevista em 1988 pela NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration)
dos Estados Unidos e “confirmada” em 1997 pelo oceanógrafo e velejador desportivo,
Charles J. Moore, no regresso da competição de veleiros “Transpacific Yacht Race”.
No entanto, só em 2008 a “ilha de plástico” atingiu o estatuto de verdadeiro
mito urbano quando em Fevereiro foi sucessivamente anunciada pela BBC e pelo
jornal britânico “The Independent”. Apesar de nunca ter sido captada qualquer
imagem de satélite, sequer de avião, da alegada “ilha”, esta chegou a ser anunciada com sendo do tamanho do Texas. Justificando esse facto, alguns ambientalistas alegaram que a
“ilha” (mas tarde, cinco “ilhas”) seria constituída por pequenas partículas de
plástico que só poderiam ser observadas nos
locais, de muito difícil acesso, a bordo de embarcações.
Confirmou-se “agora”, através
desta expedição, que as “ilhas” não existem e que a quantidade de plásticos nos
oceanos não tem aumentado desde a década de oitenta do século passado. A máxima
concentração encontrada aproxima-se dos 200 gramas de plástico por quilómetro
quadrado de oceano (o equivalente, em média, a uma garrafa plástica de um litro
e meio, por cada 21 campos de futebol) cerca de 26 vezes inferior ao que é
habitualmente alegado em textos menos sensacionalistas (por exemplo a Wikipédia, de 5,1 quilogramas por
quilómetro quadrado).
Apache, Setembro de 2014
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domingo, 2 de fevereiro de 2014
Das praxes...
«Não vou
comentar os acontecimentos do Meco, de uma escala apesar de tudo rara ou
inédita. Mas, dado o clima da semana, julgo ser obrigatório escrever sobre as "praxes"
que, ao que consta, provocaram os acontecimentos. Pior ainda, não consigo fugir
ao consenso geral: mesmo quando não são propensas ao perigo, as
"praxes" são uma manifestação de idiotia e uma explicação para o
nível geral do nosso ensino superior.
As
reportagens sobre os jovens afogados vão mostrando porque é que tantas
criaturas terminam a licenciatura sem uma vaga ideia do respectivo conteúdo, de
resto frequentemente superficial. O universo das "praxes" é um
currículo à parte, repleto de hierarquias, estatutos, símbolos de honra e
desonra, códigos de conduta e normas de vestuário que os leigos devem aprender
com zelo, sob pena do que calha, incluindo, em situações extremas, da morte.
Não admira que, enquanto se dedicam às ordens do "Dux" (?), os "estudantes"
não tenham vagar para o propósito oficial das universidades, as quais assistem
impávidas à troca do saber especializado pela iniciação paralela à reverência,
à prepotência, à desumanização, ao colectivismo e, afinal, à cretinice. Se a aversão
à liberdade é uma marca nacional, o desejo de pertença, uma discutível virtude,
realiza-se aqui da maneira mais primária.
"Aqui",
onde? É justo distinguir entre universidades com e sem aspas. O peso das
"praxes" é menos relevante nas instituições em que os estudantes, por
incrível que pareça, têm de estudar. A importância da capa e da batina cresce
em função da insignificância da instituição, o que, em Portugal, equivale a
dizer que as "praxes", se levadas ao limite da sua essencial
selvajaria, são sobretudo característica das "universidades"
particulares, por cá quase uma contradição nos termos.
No mundo
civilizado, as melhores escolas são, como seria de esperar, as que funcionam à
margem do Estado. No mundo que nos tocou em sorte, em que o ensino público já é
o que é, a iniciativa privada foi incapaz de criar um simulacro - ou, vá lá,
uma caricatura - de Yale ou Harvard. Em vez disso, ergueu uns barracões sem
dignidade nem docentes que, grosso modo, encheu com o refugo do numerus
clausus. Nesses lugares, as "praxes" fingem uma tradição e servem de
currículo. Por regra, a coisa não vai além da trapaça; ocasionalmente, chega à
tragédia. Em ambas as circunstâncias, à semelhança dos rapazes e raparigas
mortos na praia, as diversas "Lusófonas" são um caso de polícia.»
Alberto Gonçalves, no “Diário de Notícias”
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quinta-feira, 2 de janeiro de 2014
Nuno Crato: devagar, devagarinho, ao ritmo jacobino (2)
Depois de completar dois anos e meio à frente do Ministério da Educação e Ciência (MEC), para mais com o Estado a necessitar, cada vez mais, de profunda dieta de emagrecimento não se percebe tanta timidez, tantos recuos, tanta cedência aos caprichos de meia dúzia de alucinados líderes de organizações habituadas a colocarem interesses partidários à frente dos interesses da Escola Pública e do país.
Deixo algumas perguntas que, espero, motivem alguma reflexão.
Porque é que um dos países mais pobres da União Europeia insiste em ter uma das escolaridades obrigatórias mais longas?
Porque é que um dos países da União Europeia com maiores taxas de insucesso avança tão timidamente com o Ensino Vocacional e tarda uma profunda reforma dos currículos e ofertas do Ensino Profissional?
Porque é que um dos países com mais licenciados e mestres em Ensino, no desemprego, permite que instituições de ensino superior de qualidade medíocre continuem a abrir, anualmente, inúmeras vagas? Quanto tempo mais demorará o MEC a perceber que tem de impor uma nota mínima (decente) de acesso a estes cursos e uma limitação significativa da oferta, restringindo-a, preferencialmente, a instituições credíveis?
Quando se perceberá, em Portugal, que só os melhores alunos do Ensino Secundário podem ser professores e não os que entram para esses cursos superiores por não terem média académica para outros ou porque as instituições para onde entram lhes oferecem notas de conclusão que noutras instituições só seriam possíveis atribuir a candidatos capazes de usar simultaneamente dois ou mais neurónios?
Quanto tempo mais esperará o MEC para deixar claro que quaisquer provas de âmbito nacional, independentemente da sua designação e dos seus destinatários, corresponde a uma necessidade social impreterível, pelo que, não poderá ser boicotada (como se está a tornar frequente) pelo (legítimo) exercício do direito à greve, nem mesmo daqueles que por limitações cognitivas ainda não perceberam que já não estamos no PREC?
Deixo algumas perguntas que, espero, motivem alguma reflexão.
Porque é que um dos países mais pobres da União Europeia insiste em ter uma das escolaridades obrigatórias mais longas?
Porque é que um dos países da União Europeia com maiores taxas de insucesso avança tão timidamente com o Ensino Vocacional e tarda uma profunda reforma dos currículos e ofertas do Ensino Profissional?
Porque é que um dos países com mais licenciados e mestres em Ensino, no desemprego, permite que instituições de ensino superior de qualidade medíocre continuem a abrir, anualmente, inúmeras vagas? Quanto tempo mais demorará o MEC a perceber que tem de impor uma nota mínima (decente) de acesso a estes cursos e uma limitação significativa da oferta, restringindo-a, preferencialmente, a instituições credíveis?
Quando se perceberá, em Portugal, que só os melhores alunos do Ensino Secundário podem ser professores e não os que entram para esses cursos superiores por não terem média académica para outros ou porque as instituições para onde entram lhes oferecem notas de conclusão que noutras instituições só seriam possíveis atribuir a candidatos capazes de usar simultaneamente dois ou mais neurónios?
Quanto tempo mais esperará o MEC para deixar claro que quaisquer provas de âmbito nacional, independentemente da sua designação e dos seus destinatários, corresponde a uma necessidade social impreterível, pelo que, não poderá ser boicotada (como se está a tornar frequente) pelo (legítimo) exercício do direito à greve, nem mesmo daqueles que por limitações cognitivas ainda não perceberam que já não estamos no PREC?
Apache, Janeiro de 2014
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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
Nuno Crato: devagar, devagarinho, ao ritmo jacobino
O actual Ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, é (como
muitos certamente saberão) uma das pessoas (talvez a par de Maria Filomena
Mónica) que nas últimas décadas mais tem pensado, baseado sobretudo em
experiência pessoal, a educação lusa, nomeadamente os métodos de ensino e os
resultados alcançados. Não obstante os muitos livros publicados
(maioritariamente na área da divulgação científica), Crato atingiu popularidade e
notoriedade, sobretudo entre a classe docente, com o seu livro, “O eduquês em discurso
directo – Uma crítica da Pedagogia Romântica e Construtivista” (na sequência do
livro de Filomena Mónica, “Filhos de Rousseau”) que constitui uma crítica pertinente
e fundamentada à nebulosa ideologia que tomou de assalto a escola pública,
sobretudo a partir da reforma introduzida no início da década de 70 (do século
passado) pelo ministro Veiga Simão. No livro, Crato ataca frontalmente a
doutrina vigente, nomeadamente a pedagogia do laxismo e da irresponsabilidade, ridicularizando
um certo lixo discursivo, tão actual, como o “aprender a aprender”, o “ensino
centrado no aluno”, a “aprendizagem em contexto”, etc.
Com a tomada de posse do actual Governo, que apresentava
Nuno Crato à frente do (enorme) Ministério da Educação e Ciência, muitos
professores aguardaram esperançosamente que uma profunda reforma educativa
fosse encetada (na linha do que o (agora) ministro defendeu publicamente) devolvendo
à Escola Pública, a qualidade e a dignidade que várias décadas de socialismo
haviam destruído.
Crato (ex-maoísta) começou lenta e timidamente aquilo que
para muitos seria a “longa marcha” pela restituição dos valores perdidos.
Reforçou os tempos lectivos de disciplinas nucleares (Matemática e Português);
reduziu aos primeiros ciclos (e às ofertas de escola) a tralha das áreas curriculares
não disciplinares (como a Área de Projecto e a Formação Cívica); introduziu
(ainda que timidamente) Exames Nacionais no 4.º e no 6.º ano; permitiu o
regresso (se as escolas assim entenderem) às aulas de 45 ou 50 minutos de duração;
encerrou (ainda que após injustificados prolongamentos de prazos) os Centros Novas
Oportunidades.
Mas, passados os primeiros meses de “estado de graça”,
percebeu-se que muito do que se esperava (de acordo com a opinião publicamente
manifestada) do Ministro, tardava em concretizar-se. A última versão do
Estatuto do Aluno deixa muito a desejar quanto à prometida devolução da
autoridade ao professor; a extensão dos exames nacionais de 9.º ano a mais
disciplinas continua uma miragem (e no corrente ano lectivo, o IAVE (sucessor
do GAVE) acabou com os Testes Intermédios a várias disciplinas alegando
desinteresse das escolas na sua aplicação); uma redução significativa da carga
horária dos alunos (receosamente iniciada) continua por aplicar; o Ensino
Vocacional avança ao ritmo do movimento das placas tectónicas; e a, tão
mediatizada, Prova de Avaliação de Conhecimentos e Competências para docentes
contratados é, agora, mera inspiração do anedotário nacional.
(continua)
Apache, Dezembro de 2013
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quarta-feira, 20 de novembro de 2013
O que é “fazer Ciência”?
O professor (da Universidade do Algarve) Igor Khmelinskii relata, neste ‘post’ do seu blogue “Clima Virtual versus Clima Real”, que gastou metade do seu dia (1 de Novembro) a assistir à 5.ª Conferência Portuguesa de Ciências Polares e concluiu que os conferencistas, supostos cientistas (seniores), não sabem como se faz Ciência.
Desde os primeiros anos de escolaridade incutimos nos alunos a importância do conhecimento científico. Nos últimos anos do Ensino Secundário, os estudantes das áreas científicas passam metade do seu tempo de escola a adquirirem conhecimentos científicos [infelizmente (e cada vez mais) também alguns pseudocientíficos]. Muitos chegam à universidade para se graduarem em áreas científicas. Alguns são cientistas profissionais. E, no entanto, (já muitos de nós verificámos que) a esmagadora maioria deles não sabe o que é, ou como se faz, Ciência.
As ciências aplicam o método científico, isto é: observam determinado acontecimento; formulam hipóteses justificativas e/ou explicativas do mesmo; planeiam e executam experiências, investigações, trabalhos de campo que tentem negar as hipóteses; se o conseguem, formulam novas hipóteses e repetem os trabalhos; se o não conseguem, as hipóteses não negadas transforma-se em teses. É a este conjunto de procedimentos que chamamos “fazer Ciência”. O objectivo (final) do trabalho dos cientistas é provar que as hipóteses (formuladas) estão erradas.
Então, porque é que a maior parte dos (alegados) cientistas gasta somas colossais de dinheiros públicos e toda a sua vida profissional a tentar demonstrar que as hipóteses que formulou são verdadeiras? Alguém, alguma vez, conseguiu provar a veracidade de alguma?
Apache, Novembro de 2013
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sábado, 13 de abril de 2013
As novas oportunidades de velhos oportunistas
«Sem pompa nem circunstância, encerraram os Centros Novas Oportunidades (NO). As NO responderam às carências do País em matéria de certificações sem responder às carências do País em matéria de aprendizagem. Ou seja, as pessoas entravam formal e tecnicamente desqualificadas nos espaços de formação e, decorridos meses, deles saíam apenas tecnicamente desqualificadas. Pelo meio, a troco de "histórias de vida" e conversa fiada, ganhavam um papel que lhes garantia a posse do 9.º ou do 12.º ano. Mil e oitocentos milhões de euros depois, 400 mil portugueses são os confusos proprietários do tal papel e os candidatos ao desemprego ou a profissões desvalorizadas que sempre haviam sido. Ao contrário do que alguns charlatães chegaram a afirmar, criticar as NO não significava insultar os incautos que por elas passaram: ao arregimentar incautos para efeitos de propaganda, as NO eram o insulto. E a abolição de um insulto é uma boa notícia.
Estranhamente, essa notícia não mereceu os festejos suscitados por uma segunda notícia feliz e quase simultânea, a da demissão do ministro Miguel Relvas, que obtivera uma licenciatura à custa do exacto tipo de equivalências imaginárias que fundamentavam as NO. Mais estranho é que muitos dos que defendiam as NO sejam os mesmos que, com alguma razão e escassa legitimidade, acharam o processo do "dr." Relvas um atentado à democracia. Se o processo do "dr." Relvas é misterioso, não se compara ao mistério das reacções que fomentou.
Uma reacção típica consistiu em afirmar que a demissão pecou por tardia. Nada a obstar: por lealdade, necessidade ou pura dependência, o dr. Passos Coelho deixou que os estragos provocados pelo currículo "académico" do "dr." Relvas se prolongassem indefinidamente, com custos que o Governo dispensava. Apesar disso, o "dr." Relvas lá acabou por sair, o que nem sempre se pode dizer de governantes com licenciaturas igualmente duvidosas que se agarraram ao poder e sobreviveram à revelação das trapalhadas universitárias.
Outra reacção à saída do "dr." Relvas indigna-se com Nuno Crato, que alegadamente guardou por dias ou semanas o relatório da Inspeção-Geral da Educação e Ciência acerca do famoso canudo. Os indignados esquecem-se de que é inédito um ministro concordar com uma decisão que coloca em causa um seu colega. Sobretudo esquecem-se de que o antecessor desse ministro contemplou indiferente uma aldrabice similar à do "dr." Relvas (indiferente, vírgula: fechou a universidade em questão sem beliscar os respectivos beneficiados).
Uma terceira reacção trata de esclarecer que o "dr." Relvas não era, cito, "um ministro qualquer", logo a confirmação das habilidades praticadas na Lusófona abala gravemente o Governo. Acho óptimo que abale, ainda que ache esquisito o facto de governos anteriores escaparem ilesos à revelação de habilidades semelhantes praticadas por um membro que também não era um ministro qualquer: era o primeiro.
Entre as donzelas ofendidas com a novela do "dr." Relvas há inúmeras galdérias em novelas passadas. Hoje, puxam da virtude com o zelo com que ontem disfarçavam o vício. Levá-las a sério é reduzir Portugal a uma anedota. Como o "dr." Relvas, mas não só o "dr." Relvas.»
Alberto Gonçalves, no “Diário de Notícias” de 7 de Abril
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quarta-feira, 27 de junho de 2012
Dos exames...
“Duas palavrinhas:
Duas palavrinhas para iniciar a conversa: ouvi parte de um recente Fórum TSF sobre exames, em que era convidado o professor Carlos Fiolhais — a introduzir o tema, entrevistado por telefone. Tinha de sair (justamente para os exames…) e apanhei aqui o resto do Fórum, no De Rerum Natura. Fórum, comentários, desabafos — a coisa toda.
Sou professor em exercício e já ando há 40 anos nestas andanças; também fui aluno — 27 anos de escolaridade variada até aos meus 37 anos de idade — ainda sou quando calha, e já tive tempo para amadurecer ideias, porque ruminei sobre o assunto.
Matéria remoída:
A última frase que ouvi ao jornalista da TSF antes de abrir o debate, e de eu sair de casa, foi a seguinte: «Faz sentido ser mais exigente? Ou corremos o risco de, às tantas, estarmos apenas a preparar os alunos para os exames sem lhes dar uma formação mais global? Retomando aquela metáfora do futebol: ensinamos a marcar penáltis, não os ensinamos a jogar em equipa.»
Depois, começou a dança.
Primeira reacção que tive: os exames não são uma marcação de penáltis. O professor Carlos Fiolhais foi aceitando a comparação com o futebol com alguma reserva, dando-lhe o valor que merece a tentação, provocada pela simultaneidade do campeonato europeu. Mas percebeu a fragilidade de alguns paralelos, frisando que não se tratava bem da mesma coisa.
De facto, o erro de partida assenta numa crença bastante popular na seguinte ideia: o conhecimento é algo complexo, profundo, construído. O exame é um acaso, uma superficialidade, uma simplificação. E os alunos são treináveis para o momento, sem passar pela permanência.
Nada mais falso! Devo explicar o seguinte: tenho dado, durante a minha vida profissional, essencialmente, três disciplinas: Desenho, História da Arte e Geometria Descritiva. Diria que a primeira, a artística, é muito vocacional — embora seja passível de aprendizagem por qualquer pessoa normal; a segunda, é da área das humanidades; a última, é uma linguagem de representação gráfica de base matemática. Três áreas muito diferentes, por conseguinte.
Tive alunos em situação de exame nas três disciplinas. E garanto-lhe, caro Leitor, que, após 40 anos de ensino, não faço a menor ideia do que é «treinar um aluno só para o exame».
Porquê? Porque isso não é possível: de facto, o conhecimento é complexo, profundo e construído, de modo que o ensino tem de transmitir todas essas qualidades. O exame limita-se a verificar se o ensino foi eficaz, e se a aprendizagem correspondeu.
3 pontos:
1. Nós (os portugueses) pensamos que há grandes sortes e grandes azares na vida, e que nos exames os deuses jogam aos dados. Isto é patente nos comentários no Fórum que ouvi e li, e é corrente nos debates sobre educação. Porquê? Porque é voz corrente que para tudo o que vale a pena na vida há truques, atalhos, golpes.
Realidade crua — e dura: para exames, não há. A única forma de preparar gente para exame, é dar a matéria toda, insistir no que é fundamental (leia-se: estruturante), e insistir na seriedade do estudo e do trabalho dos discentes. E rever, e tornar atrás, e voltar a dar a mesmíssima matéria, para de novo provocar os cérebros a meditar nas mesmas questões, mas numa nova perspectiva: de revisita, de revisão, de redescoberta — tal qual como se conhecem os meandros de uma cidade: a pouco e pouco, mas com muito passeio, muita insistência, até a ter (quase) conquistada, perspectiva a perspectiva, aroma a aroma, restaurante a restaurante. Acho esta comparação melhor que a do futebol.
2. Nós (os portugueses) pensamos que há nervos, e que há stress, e brancas, e que é possível que alguém saiba imenso e faça um exame miserável. Porquê? Porque temos um ensino extraordinariamente maternal, protector, que infantiliza e, portanto, diminui e fragiliza os alunos. Ora um aluno que sabe a matéria — toda a matéria — pode ter uma ou outra surpresa em exame. Como num teste. Ou como na vida. Mas funciona, porque sabe a matéria — toda a matéria. Uns pontos melhor, outros pior, sabe. Não porque tenha estado a ser soprado por um preparador de exames, ou por três directas nas vésperas: apenas porque anda a estudar aquilo há dois, há três anos.
Se um estudante disser que sabia tudo e depois, com os nervos, teve uma branca e foi-se abaixo, uma de duas coisas se passa: o estudante não se preparou (e engana-se ou mente com os dentes todos que tem), ou o estudante tem, de facto, um problema grave de ansiedade paralisante que tem de ser visto por um médico (situação preocupante, que não deve ocorrer apenas em situação de prestação de contas escolares).
3. Nós (os portugueses) pensamos que há a matéria para exame (aahrgh!) e os outros saberes (hmmm!…). Porquê? Porque jornais, cientistas da educação, redes sociais, TV, taxistas, políticos, comentadores, mães e pais sortidos, colegas da bicha da caixa de supermercado, sociólogos, oradores de café, tudo quanto é fazedor e desfazedor de opinião — incluindo um número de profissionais do ensino — foram martelados, nos últimos 20 ou 30 anos, com um refrão: «há más e boas matérias, há aquilo que se marra e há coisas mais sérias» (pode cantar com a musiquinha «Quem tem medo do Lobo Mau?»).
De facto, o saber acumulado por séculos de ensino diz-nos o seguinte: lidar com conteúdos propicia competências; trabalhar sozinho fornece concentração; o trabalho de grupo é interessante nalgumas actividades, perfeitamente dispensável noutras — pelo que deve ser, singelamente, adequado —; tudo aquilo que não é praticado é esquecido (até andar a pé); e tudo isto é perfeitamente natural, de modo que saber a matéria para exame é estruturante, e é essa estrutura que parece apoiar os outros saberes. (Porque é que a expressão me irrita? Porque é saloia: é de gente que pouco sabe, armada aos cágados. Confesso: também isto são outros saberes…)
Ponto final:
Solução fácil: tomem-se todos aqueles (professores, sobretudo) que dizem que é possível treinar alunos ignorantes para fazer só o exame, e dêem-se-lhes turmas. Para eles aplicarem as suas teorias, e os meninos terem notas capitais. Vão ver o brilharete que fazemos nas estatísticas da OCDE!
Solução custosa: tratemos de fazer exames decentes (muitos, são-no!), e de verificar se tudo está a correr bem — os docentes a ensinar, os discentes a aprender. É, de momento, a única forma conhecida de verificar se o ensino de Vila Real de Santo António equivale ao de Abrantes ou ao de Viana do Castelo, e se todos são consistentes.
Os meninos preparados e minimamente cumpridores vão —surpreendentemente — passar; e com orgulho, tanto quanto me lembro das minhas próprias provas — já que nunca fui grande espingarda como aluno: nem sempre oleado, encravava, às vezes…”
Duas palavrinhas para iniciar a conversa: ouvi parte de um recente Fórum TSF sobre exames, em que era convidado o professor Carlos Fiolhais — a introduzir o tema, entrevistado por telefone. Tinha de sair (justamente para os exames…) e apanhei aqui o resto do Fórum, no De Rerum Natura. Fórum, comentários, desabafos — a coisa toda.
Sou professor em exercício e já ando há 40 anos nestas andanças; também fui aluno — 27 anos de escolaridade variada até aos meus 37 anos de idade — ainda sou quando calha, e já tive tempo para amadurecer ideias, porque ruminei sobre o assunto.
Matéria remoída:
A última frase que ouvi ao jornalista da TSF antes de abrir o debate, e de eu sair de casa, foi a seguinte: «Faz sentido ser mais exigente? Ou corremos o risco de, às tantas, estarmos apenas a preparar os alunos para os exames sem lhes dar uma formação mais global? Retomando aquela metáfora do futebol: ensinamos a marcar penáltis, não os ensinamos a jogar em equipa.»
Depois, começou a dança.
Primeira reacção que tive: os exames não são uma marcação de penáltis. O professor Carlos Fiolhais foi aceitando a comparação com o futebol com alguma reserva, dando-lhe o valor que merece a tentação, provocada pela simultaneidade do campeonato europeu. Mas percebeu a fragilidade de alguns paralelos, frisando que não se tratava bem da mesma coisa.
De facto, o erro de partida assenta numa crença bastante popular na seguinte ideia: o conhecimento é algo complexo, profundo, construído. O exame é um acaso, uma superficialidade, uma simplificação. E os alunos são treináveis para o momento, sem passar pela permanência.
Nada mais falso! Devo explicar o seguinte: tenho dado, durante a minha vida profissional, essencialmente, três disciplinas: Desenho, História da Arte e Geometria Descritiva. Diria que a primeira, a artística, é muito vocacional — embora seja passível de aprendizagem por qualquer pessoa normal; a segunda, é da área das humanidades; a última, é uma linguagem de representação gráfica de base matemática. Três áreas muito diferentes, por conseguinte.
Tive alunos em situação de exame nas três disciplinas. E garanto-lhe, caro Leitor, que, após 40 anos de ensino, não faço a menor ideia do que é «treinar um aluno só para o exame».
Porquê? Porque isso não é possível: de facto, o conhecimento é complexo, profundo e construído, de modo que o ensino tem de transmitir todas essas qualidades. O exame limita-se a verificar se o ensino foi eficaz, e se a aprendizagem correspondeu.
3 pontos:
1. Nós (os portugueses) pensamos que há grandes sortes e grandes azares na vida, e que nos exames os deuses jogam aos dados. Isto é patente nos comentários no Fórum que ouvi e li, e é corrente nos debates sobre educação. Porquê? Porque é voz corrente que para tudo o que vale a pena na vida há truques, atalhos, golpes.
Realidade crua — e dura: para exames, não há. A única forma de preparar gente para exame, é dar a matéria toda, insistir no que é fundamental (leia-se: estruturante), e insistir na seriedade do estudo e do trabalho dos discentes. E rever, e tornar atrás, e voltar a dar a mesmíssima matéria, para de novo provocar os cérebros a meditar nas mesmas questões, mas numa nova perspectiva: de revisita, de revisão, de redescoberta — tal qual como se conhecem os meandros de uma cidade: a pouco e pouco, mas com muito passeio, muita insistência, até a ter (quase) conquistada, perspectiva a perspectiva, aroma a aroma, restaurante a restaurante. Acho esta comparação melhor que a do futebol.
2. Nós (os portugueses) pensamos que há nervos, e que há stress, e brancas, e que é possível que alguém saiba imenso e faça um exame miserável. Porquê? Porque temos um ensino extraordinariamente maternal, protector, que infantiliza e, portanto, diminui e fragiliza os alunos. Ora um aluno que sabe a matéria — toda a matéria — pode ter uma ou outra surpresa em exame. Como num teste. Ou como na vida. Mas funciona, porque sabe a matéria — toda a matéria. Uns pontos melhor, outros pior, sabe. Não porque tenha estado a ser soprado por um preparador de exames, ou por três directas nas vésperas: apenas porque anda a estudar aquilo há dois, há três anos.
Se um estudante disser que sabia tudo e depois, com os nervos, teve uma branca e foi-se abaixo, uma de duas coisas se passa: o estudante não se preparou (e engana-se ou mente com os dentes todos que tem), ou o estudante tem, de facto, um problema grave de ansiedade paralisante que tem de ser visto por um médico (situação preocupante, que não deve ocorrer apenas em situação de prestação de contas escolares).
3. Nós (os portugueses) pensamos que há a matéria para exame (aahrgh!) e os outros saberes (hmmm!…). Porquê? Porque jornais, cientistas da educação, redes sociais, TV, taxistas, políticos, comentadores, mães e pais sortidos, colegas da bicha da caixa de supermercado, sociólogos, oradores de café, tudo quanto é fazedor e desfazedor de opinião — incluindo um número de profissionais do ensino — foram martelados, nos últimos 20 ou 30 anos, com um refrão: «há más e boas matérias, há aquilo que se marra e há coisas mais sérias» (pode cantar com a musiquinha «Quem tem medo do Lobo Mau?»).
De facto, o saber acumulado por séculos de ensino diz-nos o seguinte: lidar com conteúdos propicia competências; trabalhar sozinho fornece concentração; o trabalho de grupo é interessante nalgumas actividades, perfeitamente dispensável noutras — pelo que deve ser, singelamente, adequado —; tudo aquilo que não é praticado é esquecido (até andar a pé); e tudo isto é perfeitamente natural, de modo que saber a matéria para exame é estruturante, e é essa estrutura que parece apoiar os outros saberes. (Porque é que a expressão me irrita? Porque é saloia: é de gente que pouco sabe, armada aos cágados. Confesso: também isto são outros saberes…)
Ponto final:
Solução fácil: tomem-se todos aqueles (professores, sobretudo) que dizem que é possível treinar alunos ignorantes para fazer só o exame, e dêem-se-lhes turmas. Para eles aplicarem as suas teorias, e os meninos terem notas capitais. Vão ver o brilharete que fazemos nas estatísticas da OCDE!
Solução custosa: tratemos de fazer exames decentes (muitos, são-no!), e de verificar se tudo está a correr bem — os docentes a ensinar, os discentes a aprender. É, de momento, a única forma conhecida de verificar se o ensino de Vila Real de Santo António equivale ao de Abrantes ou ao de Viana do Castelo, e se todos são consistentes.
Os meninos preparados e minimamente cumpridores vão —surpreendentemente — passar; e com orgulho, tanto quanto me lembro das minhas próprias provas — já que nunca fui grande espingarda como aluno: nem sempre oleado, encravava, às vezes…”
António Mouzinho, no blogue “De Rerum Natura”
sexta-feira, 18 de maio de 2012
O preço da fraude
O Ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, anunciou hoje que o programa Novas Oportunidades custou cerca de mil e oitocentos milhões de euros.
O facto admite dois comentários antagónicos:
Dado o elevado número de adultos que aderiram à iniciativa, se se optasse pela qualificação dos mesmos, melhorando e acrescentando conhecimentos, provavelmente, ter-se-ia gasto mais dinheiro;
Constatando-se que a iniciativa (além da propaganda política que lhe está associada) mais não pretendia que a mera distribuição de certificados a eito, era perfeitamente possível, com apenas três ou quatro centenas de milhar de euros imprimir e distribuir os certificados, inclusive em papel de melhor qualidade. Mas até pelo papel e aspecto gráfico do certificado se percebeu que a iniciativa interditara palavra qualidade.
Um estudo estatístico sobre o impacto da iniciativa [fundamentalmente sobre o processo de RVCC (Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências)] encomendado ao Instituto Superior Técnico, que incide nas dimensões: empregabilidade; probabilidade de encontrar um emprego; e remunerações foi (também) hoje tornado público e está disponível aqui.
O estudo, que compara dois grupos de adultos, um de participantes em processo de RVCC e outro, de controlo, constituído por não participantes conclui que:
“Os participantes em processos RVCC são, em média, mais novos e entraram mais cedo no mercado de trabalho, quando comparados com os não participantes. Têm também uma maior probabilidade de estar desempregados e de experimentarem durações de desemprego mais longas (…)”;
“Os participantes recebem, em média, remunerações inferiores às que auferem os não participantes. A evolução das remunerações ao longo dos anos mostra que o grupo de participantes detém características que levaram à perda de rendimento real (…)”;
“(…) os processos RVCC Profissionais melhoram a empregabilidade, em particular para os homens. Os RVCC Escolares têm algum impacto positivo na probabilidade de encontrar um emprego, apenas no caso de participantes que frequentaram, em complemento, Formações Modulares Certificadas (…)”;
“A generalidade dos resultados obtidos indica que os RVCC não têm impacto na evolução das remunerações do trabalho.”
Apache, Maio de 2012
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sexta-feira, 13 de abril de 2012
Do Acordo “horto-gráfico” (4)…
«É fascinante que um pequenino bando de ociosos tenha decidido corromper a língua de milhões. O fascínio esvai-se quando se percebe que os ociosos atingiram os intentos. O Acordo Ortográfico, criação de arrogantes com uma missão, é oficial e está aí, perante a complacência dos poderes públicos em princípio eleitos para defender o país e não para o enxovalhar deliberadamente.
Até hoje não se percebe a serventia do dito Acordo. A partir de hoje, também não se irá perceber. Ao que consta, a ideia seria “unificar” a escrita de todos os países de expressão portuguesa. Naturalmente, ficou muito longe disso. Ainda que não ficasse, onde estaria o ganho? Por mim, os brasileiros e os moçambicanos são livres de adoptar o húngaro sem que eu os censure ou sequer note a diferença. Não sou brasileiro nem moçambicano. Sou português e, não fosse pedir demasiado, dava-me jeito redigir na língua em que cresci. À revelia da proclamação gratuita de Fernando Pessoa, a minha pátria não é a língua portuguesa. Mas a minha língua é.
Em abono dos Malacas Casteleiros e restantes conspiradores do Acordo, é verdade que semelhante aberração não caiu do céu. A repugnância que esses senhores dedicam às palavras, e que os leva a esventrá-las sem escrúpulos, encontra um ambiente hospitaleiro na sociedade em geral, a começar pelos políticos que avalizaram a vergonha lexical em curso. Dificilmente os sujeitos cuja retórica é um amontoado de “alavancagens” e “empoderamentos” travariam a degradação do vocabulário.
E o resto não melhora. Da televisão às SMS, do Facebook à escola, pouco, quase nada, nos lembra que comunicamos no mesmo idioma do referido Pessoa. Assistir a um “telejornal”, ler um texto produzido pelo universitário médio ou espreitar os padrões do romance contemporâneo indígena é descer a jargões e graus de analfabetismo abjectos, com ou sem "c". Porém, se os maus-tratos à língua já eram habituais, não eram obrigatórios. E essa é a diferença entre temer pela vida de um moribundo e assinar, oficial e urgentemente, o respectivo óbito.»
Alberto Gonçalves, no Diário de Notícias
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quinta-feira, 1 de março de 2012
“Quebrar o silêncio… em desacordo!”
«É lei histórica que a opressão económica atrai a opressão cultural e que nunca faltarão Miguéis de Vasconcelos para concretizar ambas. Refiro-me, claro está, ao “acordo” Ortográfico, esse pináculo da arrogância legislativa, de cuja necessidade só lembraria aos nossos “espetaculares” deputados e também, arrogância minha em dizê-lo, a quem de imprimir livros faz vida e mercadoria, mais dinheiro com dinheiro naquele acto.
Coloca tal gentalha, povo, mestres e linguistas de cócoras, como de igual modo faz quem nos tem governado, a quem de vender a força de trabalho não consegue alternativo acto.
Protegidos uns, pelo falacioso pregão que da dívida todos somos responsáveis e que todos devemos pagar o que muito, alguns, poucos desfrutaram. Os outros fazem da etimologia, da história que faz uma língua, coisa sem valor, talvez na mesma proporção que ignoram na História o valor de factos e actos.
Eu fico contente por ainda haver rebeldes. Honra a Vasco Graça Moura!
Honra também às inúmeras faculdades e universidades que ainda não aderiram à infâmia do acto legislado e “acordado”!
Honra aos mestres como Vitorino Magalhães Godinho e aos noventa por cento de linguistas que demonstraram o seu desacordo em acto.
Selo a minha posição agindo em total acordo com a intenção do poema emprestado e em acto partilhado:
Dois mil e dezasseis, o mais tardar,
programa-se a extinção da letra “H”.
Vão os interessados demonstrar
aos iletrados que, entre as consoantes,
mais muda, absurda, irrelevante, ...não “á”.
Sonhem-se os livros “re-editados”,
os “corretores” patenteados,
“corrêtamente” “desagasados”,
e os “omens” de “oje” já reciclados
(pelo “corropio” dos lestos formadores)
na grafia-da-moda que já está
– e não mais se conceba a "ora agá"! –
nos softwares dos computadores
– únicos doutos escrevedores... –
faseadamente, ainda antes
da queda iminente da cedilha
(anacrónica, cómica excrescência),
mas é preciso tempo e paciência,
para fazer render – e muito! – a pastilha...
A vogal vã, o "U" após o "Q",
é outra para sair se não se lê...
Não se diz, vai cair. Ponto final.
Mas, por enquanto, é confidencial...
Viste murchar os pontos cardeais?
Não leste e estás a “leste”? Queres comer
onde não resta espaço, estás a mais...
Uns anitos que fiques, irás ver
vender Portugal com letra pequena...
Ainda estás aí?... Não tenhas pena.
Pedras e letras valem uns tostões
a uns poucos “expertos” comilões...
O País-nação estará fora de cena.
E enquanto não falir, deficitário,
grafe-se “portugal” no Novo Dicionário.
[poema de Madalena Homem Cardoso]»
Texto de Aníbal Oliveira, professor da Escola Secundária de Cacilhas-Tejo
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sábado, 4 de fevereiro de 2012
Uma chibatada nos vendilhões
Vasco Graça Moura recentemente empossado como Presidente do Centro Cultural de Belém (CCB) propôs, e a Administração aceitou por unanimidade, a não aplicação do Acordo Ortográfico (AO) de 1990, que o anterior Governo introduziu à força nos organismos sob sua tutela directa ou indirecta e que o actual Governo insiste em aplicar à revelia de qualquer bom senso. O documento datado de 2 de Fevereiro, aprovado pela Administração do CCB, determina a desinstalação imediata do programa informático que procede à conversão automática da grafia dos textos para o novo AO e a aplicação, a toda a documentação, da ortografia vigente em Portugal antes da negociação do chamado Acordo Ortográfico de 1990.
Recorde-se que o AO havia sido imposto no CCB por uma directiva interna, datada de Setembro de 2011, assinada pelo antigo Presidente, António Mega Ferreira, que Francisco José Viegas, actual Secretário de Estado da Cultura (e simpatizante do aborto linguístico) pretendia reconduzir no cargo.
Vasco Graça Moura (VGM) justificando uma decisão que “meia” blogosfera apelida de corajosa, mas que se me afigura, essencialmente, coerente (VGM é um dos mais destacados críticos da aberração e já atingiu um patamar em que para sobreviver com dignidade não precisa fazer favores às meretrizes do regime) afirma que sempre disse ao Secretário de Estado da Cultura que era esta a sua posição, a qual é conhecida por todos os membros do Governo. Para VGM esta é uma decisão, apesar de tudo, aparentemente fácil, pois o CCB é uma fundação de direito privado não estando, portanto, sob tutela directa ou indirecta do Estado, não sendo obrigado à aplicação do AO. Note-se que a generalização da aplicação do dito ocorrerá(?) apenas em 2014 e mesmo depois dessa data não deverá ser possível encontrar forma de penalizar os privados pela sua não aplicação (além do ridículo da penalização por “erro ortográfico” acrescem, do ponto de vista jurídico, sérias dúvidas de constitucionalidade do AO).
Neste ano lectivo, em cumprimento do disposto na resolução do Conselho de Ministros, datada de 25 de Janeiro de 2011, liderado pelo agora refugiado em Paris, vários professores, nomeadamente de Língua Portuguesa, começaram a adoptar nas suas aulas (principalmente nos primeiros anos de escolaridade) a grafia do AO. Pergunto: entre tantos Directores de escolas, à beira da reforma, não haverá uma meia-dúzia com tintins suficientes para tomarem decisão idêntica à de VGM e suspenderem a aplicação da aberração? Ou estão com medo de levar tautau das mais delico-doces guardiãs da pateguice?
Apache, Fevereiro de 2012
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terça-feira, 24 de janeiro de 2012
A JSD e o delírio “eduquês”
Um texto do jornal Público (alegadamente citando a Lusa), do passado Domingo, dá conta da oposição da JSD ao fim da Formação Cívica, proposta por Nuno Crato na reformulação curricular actualmente em discussão pública.
Lê-se no texto que o Governo «pretende terminar com esta disciplina.» Talvez seja uma incorrecção acidental mas chamar disciplina a algo que nos dez anos da sua existência nunca passou (felizmente) de uma Área Curricular Não Disciplinar (ACND) soa a algo idêntico a xingar continuadamente um bêbado na praça pública e, depois de morto, vir aclamar as suas virtudes.
No segundo parágrafo do texto cita-se Duarte Marques (o actual líder da JSD) referindo que «a forma como a formação cívica tem sido ensinada e integrada nos currículos, nos últimos tempos, “é completamente díspar”, existindo casos em que as horas da disciplina “não são usadas para isso”». Pergunto: para isso, o quê? Os professores têm a velha mania de tentar minimizar os estragos causados pelos devaneios didáctico-curriculares do Ministério da Educação e, regra geral, tentando dar alguma utilidade à “coisa” (normalmente atribuída aos Directores de Turma) usam-na para tentar resolver problemas disciplinares e de assiduidade, e incutir nos alunos algumas regras de comportamento, tarefa (da qual alguns pais se demitem) que se tem revelado infrutífera, na maioria dos casos. Não era isto que se pretendia com a Formação Cívica? É verdade que o Ministério nunca soube (ou nunca quis) dizer abertamente o que pretendia com a “invenção” e nalgumas escolas avançou-se para uma tentativa de doutrinação politico-ideológica pouco tolerável em Democracia, mas acredito tratar-se de casos pontuais pouco relevantes no contexto nacional.
Sobre o tema vale a pena ler o professor Ramiro Marques no seu ProfBlog e que transcrevo parcialmente.
«Lembro, no entanto, que a área curricular de Formação Cívica, criada em 2001 pelo Governo de António Guterres (Decreto-Lei 6/2001), era Santos Silva o ministro da educação, existe há uma década no currículo sem que se tenham vislumbrado melhorias no civismo, quer nas escolas quer na sociedade em geral. Ao invés, uma das maiores preocupações dos professores é precisamente a falta de civismo de muitos alunos e até de alguns pais. A realidade deixa cair por terra a tese dos benefícios e utilidade da área de Formação Cívica na promoção do civismo nas escolas.
Não só o civismo, entendido como reconhecimento e prática das virtudes éticas, das relações de cortesia e da boa convivência social, não melhorou como é justo afirmar que o conhecimento dos alunos sobre factos e teorias básicas da ciência política e sobre os autores que criaram os fundamentos da liberdade e da democracia é agora menor do que era antes da introdução da área da Formação Cívica no currículo. Tão pouco existe relação entre a área da Formação Cívica e a qualidade das aprendizagens ou a prevenção do abandono escolar. Um estudo realizado, em 2006, pela Escola Superior de Educação de Setúbal, com o título Qualidade de Ensino e Prevenção do Abandono Escolar: O Papel das ACND, conclui pela não existência de qualquer correlação entre essas variáveis. Um estudo conduzido pelo IESE, também em 2006, com o título Monitorização e Acompanhamento do Currículo Nacional do Ensino Básico para as ACND, chega a resultados semelhantes.
Há uma clara divisão entre a esquerda e a direita acerca do modo como o civismo deve ser promovido nas escolas.
A esquerda faz da Formação Cívica um espaço curricular centrado na participação cívica, no activismo político, no comprometimento com causas sociais e no alargamento dos chamados direitos sociais e culturais. Metodologicamente, a esquerda acentua a preferência pela discussão de dilemas éticos, pela participação colectiva na tomada de decisões e pela democracia participativa em detrimento do estudo e debate dos grandes autores, da história das ideias políticas e dos textos fundadores do pensamento democrático.
A esquerda parte do pressuposto de que é possível ensinar a formação cívica através do envolvimento dos alunos em debates sobre temas fracturantes, regra geral em ruptura com a tradição e os costumes vigentes, e através da tomada colectiva de decisões, dando aos alunos a oportunidade de criarem e aprovarem as regras e as normas através de um processo de transferência do poder e da autoridade dos professores para os alunos. A ênfase é colocada no desenvolvimento do raciocínio sobre questões sociais, éticas e políticas, colocando os alunos na posição de criadores de valores em ruptura com a ordem cultural e cívica estabelecida. O objectivo é criar activistas do social e do político. Todos os temas fracturantes são oportunidades para treinar os alunos no processo de construção do activismo político e cultural, incluindo aqui a dimensão sexual e afectiva da vida. A dimensão dos comportamentos, das acções, é desvalorizada pela esquerda em benefício da construção de uma retórica anti-sistema e anti-tradição.
No meu ponto de vista, uma Formação Cívica deste tipo, que é a que temos tido, não tem bondade nem utilidade nenhuma. Não faz falta ao currículo. É um meio de promoção do ressentimento, da soberba e da arrogância na juventude.
A direita parte do pressuposto de que não é possível ensinar o civismo. Se o civismo não se ensina como é que ele se aprende? Por contágio, por imitação, pela adesão a narrativas e a uma tradição cultural e pela imersão em ambientes onde o civismo se vive e cuida.
Assim sendo, não é útil a existência de um gueto curricular para se ensinar civismo tanto mais que a aprendizagem do civismo se faz por impregnação, contágio e imitação. Ou a escola tem um ambiente onde se vive o civismo ou não tem. Se tem, a aprendizagem do civismo faz-se naturalmente em todas as disciplinas, salas de aula e espaços escolares. Se não tem, é impossível aprender o civismo.»
Apache, Janeiro de 2012
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sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
“Era uma vez a confiança”
«A solução para os gravíssimos problemas que nos afectam é um empreendimento colectivo. Mas todos os empreendimentos colectivos falham se a sociedade não sentir confiança. As pessoas aceitam os sacrifícios se as convencerem de que eles resolvem os problemas. Confiança e reciprocidade são palavras-chave. Infelizmente, o Governo ignora-as.
Os portugueses estão mergulhados em sofrimento: famílias envergonhadas, lançadas numa pobreza com que nunca sonharam; velhos sem dinheiro para a farmácia; jovens sem horizontes de futuro; crianças com fome; professores sem escola; desemprego galopante; empresas falidas; assaltos violentos todos os dias. Tudo contemplado por um Governo incontinente nas nomeações políticas, imoral na distribuição de benesses, insensível, perito em abater, incapaz de erigir, que não gera confiança.
As alterações curriculares do sistema de ensino, já aplaudidas por alguns, são uma pantomina. São a evidência da boçalidade técnica dos que as propõem. A discussão pública que se segue já morreu, por uma questão de confiança metodológica. Gente séria e competente aborda o currículo assim: primeiro estabelecem-se as metas, isto é, o ponto de chegada dos alunos a ensinar; depois definem-se os programas que podem cumprir esses objectivos; e só no fim, obviamente, se fixam as cargas horárias adequadas. Mas o ministro começou por fixar já as horas para cada disciplina e a estrutura global. Chamou a isso a primeira etapa. Anunciou que a segunda será a definição das metas. E garantiu que só mais tarde reformulará os programas. Qualquer trapalhão não faria pior. O ministro não fundamentou. Achou! E eu acho que o ministro mentiu quando afirmou que a proposta de revisão curricular não foi feita "a olhar para orçamento". Porque qualquer cidadão minimamente informado sabe que dessa revisão jamais poderia resultar um acréscimo de despesa. Porque o orçamento não era uma variável. Era um determinante. O que vem a seguir é uma farsa. As metas e os conteúdos programáticos dependerão das horas já fixadas, vergando a pedagogia e as ciências à contabilidade, da qual a Educação é, hoje, mero adereço. Crato podia, ao menos, ter sido intelectualmente honesto. Não promovendo a discussão pública de algo cujos fundamentos ainda não foram estabelecidos. Não invocando pressupostos que nunca explicitou. Ele, que sempre falou da necessidade de reduzir a dispersão curricular no ensino básico, aumentou-a no 2º ciclo. Ele, que tinha a obrigação de acomodar a decisão errada de prolongar a escolaridade obrigatória até aos 18 anos com uma reorganização curricular do secundário, particularmente no que a vias técnicas e profissionais respeita, decidiu, apenas, uma mais que questionável quebra da carga horária no 12º ano (sem olhar ao orçamento, disse). Pediu contributos públicos. Aqui tem o meu. É pena que nenhuma televisão o confronte com alguém que lhe dissesse, na cara, o que a verdade reclama.
Tenho à minha frente duas cartas assinadas pela presidente do Conselho Directivo do Instituto da Segurança Social. Numa, a incompetente presidente comunica a um cidadão (a quem os serviços que dirige reconheceram, anteriormente, isenção legal de contribuir para a segurança social) que lhe foi fixada, oficiosamente, a obrigação de pagar, todos os meses, a quantia de 186,13 euros, por ter tido, em 2010, um rendimento de 600 euros. Na outra, da mesma bestial natureza, outro cidadão (com actividade legalmente suspensa e reconhecida como tal pela repartição de finanças da sua residência) é informado que a brincadeira a que a senhora preside lhe fixou uma mensalidade de 124,09 euros, por ter tido, em 2010, um rendimento de 3.975 euros. A primeira vítima pagaria 2 233,56 euros, por ter ganho 600. E a segunda pagaria 1 489,08, isto é, quase metade do que ganhou, o que, apesar de tudo, a torna credora da arbitrária generosidade oficiosa: 600, ganhos, pagam 2 233,56 mas 3 975, ganhos, “só” pagam 1 489,08. É público que foram emitidas milhares de cartas deste teor (outra, denunciada neste jornal, aplicava a mesma chapa de 186,13 euros a um falecido em 1998). Quando a leviandade desta sócia do CDS foi branqueada com uma referência simples “a erro que vai ser corrigido”, foi-se, definitivamente, a confiança no ministro que a tutela, correligionário da mesma agremiação.
O ministro da Defesa foi recentemente à Mauritânia assinar um acordo. Viajou de Falcon. O Falcon avariou. Outro Falcon voou com uma equipa técnica para reparar o primeiro. Quanto custou tudo isto? Para o cidadão que não esqueceu a demagogia da suposta poupança em viagens aéreas, de início de mandato, que acontece à confiança?
Primeiro foi o secretário de Estado da juventude. Agora, foi o próprio primeiro-ministro que instigou milhares de professores a emigrarem. Salazar exportava negros sem qualificação profissional para as minas de ouro da África do Sul. Passos Coelho quer exportar, para qualquer África, jovens qualificados, cuja formação custou milhões. Eis o Estado Novo do século XXI, a passos de coelho. Que vergonha nacional este baixar de braços, esta confissão pública de incapacidade e de desistência, num país fustigado por um saldo populacional em queda alarmante. Não se pode governar promovendo a depressão colectiva e formatando a cabeça dos cidadãos para um futuro de miséria. Tamanha cobardia política arrasta na lama a confiança dos portugueses.
George Orwell disse um dia que “ver o que está à frente do nariz requer uma luta constante”. Tanto maior, digo eu, quanto mais crescem os narizes dos políticos.»
Santana Castilho, no “Público” da passada quarta-feira
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segunda-feira, 24 de outubro de 2011
A "socratização" do país
Passaram mais de quatro meses desde a tomada de posse do Governo que PSD e CDS formaram, na sequência dos resultados das últimas eleições. No entanto, a cada dia que passa se fica mais com a sensação que é o Zé (ou um seu clone) quem continua à frente dos destinos do país.
Começou por ser Nuno Crato (o actual Ministro da Educação) quem, após ter criticado fortemente o modelo de avaliação de professores e dito que era necessário mais rigor, exigência e disciplina na sala de aula, a única coisa que conseguiu (até ao momento) foi aprovar um modelo de avaliação de professores que se distingue do anterior (fundamentalmente) pela periodicidade da atribuição formal de classificação, que passou de 2 para 4 anos. Quase tudo, o resto, permanece “na gaveta”. A Parque Escolar parece ir escapar incólume à auditoria imposta; o Programa Novas Oportunidades tem uma cara nova na liderança mas não se sentem (para já) alterações ao fedor; o rigor, a exigência e a disciplina parecem ser palavras afastadas nos novos dicionários feitos à medida do “acordo horto-gráfico”. Em matéria de educação, a montanha pariu um crato.
No que se refere aos restantes elementos do Governo, as diferenças face aos anteriores, se existem, não são fáceis de encontrar. À semelhança do que se passara nos últimos meses da era “rosinha”, só o Ministro das Finanças e o Primeiro-Ministro parecem exibir prova de vida. O primeiro, tal como o seu antecessor, para anunciar PEC’s sucessivos; cortes na despesa (ou melhor, em algumas despesas) meramente cosméticos e principalmente subidas de impostos, algumas, como os cortes nos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos, dando a entender que o texto constitucional, em casa do doutor Gaspar, é impresso em papel Renova de folha dupla. O segundo, tal como era habitual no bichano de Vilar de Maçada, a limitar as suas funções às viagens ao estrangeiro para o tradicional beija-mão à imperatriz germânica e às tradicionais “tiradas” para as televisões, entre a mentira e os ataques de idiotice compulsiva, como por exemplo quando disse que os funcionários públicos veriam (nos próximos dois anos) os seus vencimentos reduzidos em cerca de 14% porque havia um estudo que demonstrava que ganhavam mais 15% que o privado (estudo que o Zé já tinha usado em tempos (igualmente com as conclusões devidamente distorcidas) para justificar o ódio que os tolos costumam cultivar ante os servidores do Estado. Claro que Passos Coelho, como antes Sócrates, poderiam ter percebido que no sector público cerca de 45% dos funcionários são (no mínimo) licenciados e que no privado esse número ronda os 13%. Mas se conseguissem perceber isso teriam sido colocados a dirigir os destinos do país?
Apache, Outubro de 2011
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quarta-feira, 12 de outubro de 2011
A praga ‘eduquêsa’ no ensino da Biologia
A propósito de um texto de Helena Damião, no blogue “De Rerum Natura”, sobre a qualidade (ou a sua ausência) dos manuais de Inglês, o professor de Biologia, Miguel Marques, comenta:
“Nos manuais de Biologia é o regabofe modernaço de manipulação política disfarçada de ciência. Mas a culpa é de quem elabora os programas. Eu conheço pessoalmente alguns desses aleijados politicamente correctos. Dominam a linguagem hermética do eduquês, mas no fundo são uns "doutores" completamente ignorantes.
No programa do 12º Ano, a pseudo-ciência reina.
Os alunos começam a ser doutrinados com os problemas de reprodução e bebés proveta, passam de imediato para o instituto de oncologia, onde estudam oncogenes e anticorpos monoclonais, (matérias marginais mesmo para quem quer entrar em Medicina); depois para o programa político da Green Peace, com especial destaque para a ideia peregrina da sustentabilidade, sem o mínimo de reflexão sobre o que significa a sustentabilidade e sobretudo como se pratica a sustentabilidade.
No fim, estudam uma ETAR que só pode servir para depurar esta porcaria de programa. Valha-nos isso!
Os alunos entram na Universidade sem saber o mínimo de Botânica, Zoologia, Teoria de Evolução, Embriologia, Sistemática, etc.
A maioria dos professores são incapazes de perceber, que mais do que um programa de Biologia, estão a reproduzir inconscientemente um programa político radical.”
Apache, Outubro de 2011
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quarta-feira, 5 de outubro de 2011
O que é o ‘eduquês’?
No seu blogue, o professor Ramiro Marques explica, de forma simples mas (ou talvez por isso) muito eficaz, o que é o ‘eduquês’. Vale a pena ler:
“O ‘eduquês’ é uma ideologia pedagógica parida no ventre da esquerda pós-moderna com adeptos à esquerda e à direita. Expressa-se numa retórica que faz da mudança permanente a missão da escola.
Alimenta-se da suspeição a tudo o que possa ser conotado com a escola tradicional, vista pelos ideólogos do ‘eduquês’ como repressiva, castradora e elitista. Afirma-se em oposição a ela. Deixa-se contaminar pelas ‘ecotretas’ e pela "religião do clima". Manifesta uma crença quase religiosa no poder que as tecnologias têm de transformar o ensino. Agarra-se a tudo o que é novidade pedagógica e quanto mais exótica e improvável a novidade maior a militância com que é acriticamente defendida.
O ‘eduquês’ é uma forma de acriticismo pedagógico. Esgota-se na forma, anula o conteúdo. Desvia o professor das funções letivas, esmaga-o com tarefas que estão a montante e a jusante do processo de instrução: reuniões para preparar planos, reuniões para fazer planos, reuniões para avaliar os resultados dos planos e relatórios para dar conta da avaliação dos planos.
O ‘eduquês’ é uma forma de burocracia pedagógica que alimenta e se alimenta da complexidade. Gosta de siglas, usa uma linguagem hermética, incorpora estrangeirismos e exprime-se num discurso redondo.
Em vez de valorizar o processo de transmissão do conhecimento científico, centra-se na manipulação política dele. Alimenta-se de uma cultura de ressentimento contra os padrões culturais e as tradições do Ocidente. Valoriza o exótico, o que nos é distante e o que não é nosso.
Faz da escola um instrumento de engenharia social em nome de uma igualdade fabricada que esmaga o mérito e desconfia da excelência.
Padece de 10 pecados mortais:
1. Concepção instrumental da educação: "aprender a aprender", "aptidão para o pensamento crítico", "aptidões metacognitivas", "aprendizagem permanente".
2. Desenvolvimentalismo romântico: "escola centrada na criança", "diferenças individuais dos alunos", "ensinar competências e não os conteúdos".
3. Pedagogia naturalista: "construtivismo", "aprendizagem por descoberta", "aprendizagem holística", "método de projecto", "currículo em espiral", "aprendizagem temática".
4. Antipatia pelo ensino de conteúdos: "os factos não contam tanto como a compreensão", "os factos ficam desactualizados", "menos é mais", "aprendizagem para a compreensão".
5. A desvalorização dos padrões culturais tidos como relativos e subjectivos, portanto irrelevantes.
6. Crítica do uso da memória e recusa das actividades de repetição, tidas como não significativas, portanto inúteis.
7. Defesa da ideia falsa de que as crianças só compreendem o que lhes está próximo e o que é concreto e manipulável.
8. Primazia à componente lúdica e recreativa por oposição à valorização do esforço na aprendizagem.
9. Redução da aprendizagem a um processo construtivista que diminui a função de transmissão dos conteúdos.
10. Visão anti-intelectualista da cultura e da educação.”
Apache, Outubro de 2011
sábado, 1 de outubro de 2011
“Bolos para o IPCC/ONU, morte para os africanos”
Num comentário ao artigo intitulado “Comida para todos”, da autoria de Olivier de Schutter, Relator Especial da ONU para o direito à alimentação, publicado a 11 de Abril de 2011 no Jornal de Negócios, o professor Igor Khmelinskii (Físico, de formação académica) da Universidade do Algarve escreve, no seu blogue “Clima Virtual vs Real”:
«O autor dedica a maior parte do artigo à apresentação das medidas, que embora façam todo o sentido, dificilmente seriam implementadas pelos países da G20, em benefício das nações pobres, pois as próprias G20 sofrem as consequências da crise financeira e das desastrosas políticas ambientais e energéticas que estão a implementar, não dispondo por isso de possibilidade de ajudar as nações pobres.
Por outro lado, o autor mostra uma incompetência profissional surpreendente para quem é supostamente um perito na matéria, passo a citar:
"... No futuro, espera-se que as alterações climáticas conduzam a mais choques na oferta..."
Falso. As mudanças climáticas são periódicas, razão pela qual o clima do futuro não será diferente do clima de um passado não tão longínquo como isso.
“... Mas a agricultura também é uma grande culpada pelas mudanças climáticas, responsável por 33% de todas as emissões de gás com efeito de estufa..."
Falso. Não são os gases com efeito de estufa que provocam as mudanças climáticas, mas sim as alterações de actividade solar, sendo estas também periódicas.
Entretanto, em nada nos surpreende a publicação deste artigo no JN, bem conhecido pela propaganda desenfreada de ideologia misantrópica de eco-terrorismo, dirigido tanto contra as nações pobres, como contra as nações desenvolvidas e ricas.
Ora o autor não consegue perceber que o dióxido de carbono atmosférico beneficia a agricultura, aumentando os rendimentos sem quaisquer gastos adicionais, razão pela qual precisamos de mas CO2 na atmosfera. Por outro lado, não precisamos de reduzir as emissões de CO2 nem de qualquer outro gás com efeito de estufa, pois as suas consequências climáticas negativas existem apenas nas mentes delirantes dos peritos climáticos do IPCC/ONU e nos seus modelos de um sistema climático virtual, inteiramente ilusórios e enganadores, que nada têm a ver com a nossa realidade.»
Bem-vindo ao mundo real (também chamado: “dos cépticos”), professor.
Apache, Outubro de 2011
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sábado, 24 de setembro de 2011
“Desculpe o auê”
Valter Lemos (por favor, não comecem já a rir) escreve (ou provavelmente alguém por ele) hoje, no Expresso, em defesa do Programa Novas Oportunidades, projecto que maquinou com Luís Capucha e que o actual Ministro da Educação, Nuno Crato, mandou avaliar. Por esta altura estão os hipotéticos leitores a sentirem uma certa urticária antevendo que me preparo para comentar o texto atribuído ao ex-Secretário de Estado da Educação. Vamos lá a ter calma e a respirar fundo… Ok! Agora pensem lá se faz algum sentido comentar textos de quem ainda não aprendeu a argumentar?
Bom, agora que os hipotéticos leitores estão mais descansados, resta-me deixar um pequeno conselho que, talvez, uma alma caridosa possa fazer chegar ao senhor doutor por Boston: Valter, o conceito de “ciúme social” (não é que não soe bem para título de uma música pimba mas) deixará de te fazer sentido no dia em que aprenderes a pentear-te e a escolher as peúgas.
Apache, Setembro de 2011
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domingo, 18 de setembro de 2011
Disparates à moda da OCDE
«Hoje voltou à baila a questão das Novas Oportunidades e voltaram a falar governantes anteriores (não seria melhor haver um período de nojo?). O tema foi propiciado pela notícia de que no Relatório da OCDE "Education at Glance 2011" Portugal aparece, com 96%, em 1.º lugar de entre os países analisados no que respeita à taxa de finalização do secundário (o indicador que faz notícia é o A2). Como se calcula? Divide-se o número de diplomas passados a quem quer que seja do 12º ano pelo número de jovens com 17 anos. Ora acontece que cerca de um terço (34%) são diplomas a pessoas maiores de 25 anos das Novas Oportunidades passados, como se sabe, de qualquer maneira. Poderiam até ser mais e a nossa taxa de sucesso ultrapassar alegremente os 100%. Foi precisamente de 34% o nosso aumento relativamente a 2008, isto é, a taxa de sucesso normal no secundário não teve praticamente nenhuma variação. Isso dever-nos-ia fazer reflectir um pouco. Não há caso de nenhum outro país com 34% de diplomas passados de qualquer maneira a quem quer que seja. E isso dever-nos-ia também fazer reflectir um pouco. O relatório traduz o nome da iniciativa política do governo anterior para "New Opportunities". Mas, de facto, a expressão portuguesa não tem tradução possível, porque lá fora ninguém faz o mesmo.»
Professor Carlos Fiolhais, na passada terça-feira, no blogue “De Rerum Natura”
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