O mérito a quem o tem…
Foi apresentado na passada quarta-feira, com a pompa e circunstância (entenda-se palhaçada) habitual o “Magalhães”, um computador portátil que na versão do Governo será distribuído por “meio milhão de alunos do 1º Ciclo do Ensino Básico” (a antiga escola primária).
Ainda, segundo o Governo, este “será o primeiro computador portátil com acesso à Internet montado em Portugal.”
Na apresentação do projecto, o Primeiro-Ministro afirmou que se trata de “um computador de última geração tecnológica - nomeadamente o último microprocessador da Intel”.
No Portal do Governo pode ler-se ainda que “o Magalhães é um computador portátil que permite o acesso à Internet, tem uma autonomia de seis horas, é resistente ao choque e à água e trabalha com qualquer sistema operativo.”
Na mesma apresentação, o Sr. Sousa, sem fazer (uma vez mais) a mínima ideia do que estava a dizer, aproveitou para informar que vai ser instalada ligação à Internet em todas as salas de aula e que a velocidade da Banda Larga será aumentada para um mínimo de 48 megabit por segundo. Anunciou ainda a instalação de câmaras de videovigilância e a criação de um cartão magnético que substitui o dinheiro e permite o controlo de entradas e saídas dos alunos.
No anúncio da iniciativa, a RTP foi ainda mais longe na asneira e, além de ter mostrado uma reportagem, com alunos bem mais velhos que aqueles a quem o portátil se destina, manuseando-o, anunciou o produto como uma estreia mundial e totalmente fabricado em Portugal.
Bom, em primeiro lugar, louve-se a capacidade que o “Seu Zé” tem em nos surpreender, dificilmente alguém conseguiria numa única iniciativa fazer e dizer mais asneiras. A saber:
Não é dado adquirido (bem pelo contrário) que a introdução de máquinas de calcular no primeiro ciclo do ensino básico, efectuada há alguns anos, tenha tido contributo positivo na melhoria das aprendizagens, antes, a sua introdução coincidiu no tempo com uma degradação acentuada dos conhecimentos dos alunos no final deste ciclo. E várias organizações ligadas ao ensino, nomeadamente a Sociedade Portuguesa de Matemática, através do seu Presidente, Nuno Crato, têm tecido duras criticas a esta medida, que consideram uma das principais causas do baixo nível de conhecimentos dos alunos na área da Matemática. A larga maioria dos professores de Matemática e de Ciências Físico-Químicas do 3º Ciclo e do Secundário (incluindo vários autores de manuais escolares), com quem tenho contactado, subscreve as palavras de Nuno Crato. Imagine-se agora, o que será a qualidade das aprendizagens futuras com a introdução do “Magalhães”, que será destruído a todas as crianças a partir dos 6 anos, a maioria das quais desconhece as mais elementares regras de comportamento em sala de aula. Das duas, uma, ou a iniciativa foi feita à revelia de qualquer parecer técnico credível, como é usual no Ministério da Educação, ou fica demonstrada uma clara intenção do Governo em desferir mais um rude golpe na já muito débil qualidade do nosso ensino.
Diz o Sr. Sousa que o portátil será distribuído a meio milhão de alunos, custando: 50 euros a quem não dispõe de apoios dos Serviços Acção Social Escolar (SASE), 20 euros, para quem está incluído no escalão B do SASE e, será gratuito para o escalão A. Como estão actualmente a frequentar o 1º Ciclo do Ensino Básico Público, pouco menos de 450 mil alunos e há 500 mil “Magalhães” será que vão obrigar todos os alunos a possuir o dito, mesmo aqueles cujas famílias, apesar de não serem apoiadas pelo SASE, mal dispõem de verba para comprar cadernos e material de escrita?
Na apresentação do “Magalhães” o Sr. Sousa usou e abusou uma vez mais da propaganda, sem pejo no recurso à mentira sistemática, como é aliás prática corrente de toda a equipa governativa. Afirmou que este é o primeiro computador portátil montado em Portugal, com acesso à Internet, mas, por exemplo, a empresa que vai ser responsável pela montagem do “Magalhães” (a JP Sá Couto) monta também o Tsunami e o Solbi e há mais empresas portuguesas que importam os componentes e montam os computadores em Portugal. Como bom vendedor de “banha de cobra”o dito Sr. Sousa afirmou que o portátil viria equipado com o último processador da Intel, mas segundo a directora-geral da plataforma para os mercados emergentes, Lila Ibraim, a primeira leva de computadores será equipada com o processador mais antigo da Celeron, ficando para mais tarde os equipados com o microprocessador Atom.
Inebriado pelas próprias palavras, o Sr. “inginheiro” prometeu uma autonomia de 6 horas para o “Magalhães”. Esperamos para ver. É que os primeiros portáteis, vendidos aos professores por 150 euros, integrados no pacote propagandístico do ano passado (e-escolas) apresentam a fabulosa autonomia de 50 minutos.
No pacote de promessas, consta ainda, a de todas as salas de aula terem ligação à Internet (ninguém percebeu ainda muito bem para quê) e com uma velocidade de 48 Mbps, quando a velocidade máxima disponível no mercado (para todos os operadores) é de 24 Mbps.
Já agora, uma correcção à peça da RTP que refere o “Magalhães” como totalmente produzido em Portugal. O que é produzido em Portugal é a caixa plástica exterior, e o pequeno logótipo nela colocado, tudo o resto é importado e montado cá pela já citada empresa de Matosinhos. O “Magalhães” é uma cópia integral (excepto a referida caixa exterior) do Classmate PC da Intel, disponível (com vários nomes comerciais diferentes) em cerca de 30 países.
E para terminar, uma perguntita para o Sr. Sousa: A Intel ganhou o concurso público para o fornecimento dos computadores e a JP Sá Couto o da montagem, ou…?
Hum… Pois…
Apache, Agosto de 2008