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sábado, 7 de janeiro de 2012

Outro(?) Janeiro

"Surge Janeiro frio e pardacento,
Descem da serra os lobos ao povoado;
Assentam-se os fantoches em São Bento
E o Decreto da fome é publicado.

Edita-se a novela do Orçamento;
Cresce a miséria ao povo amordaçado;
Mas os biltres do novo parlamento
Usufruem seis contos de ordenado.

E enquanto à fome o povo se estiola,
Certo santo pupilo de Loyola,
Mistura de judeu e de vilão,

Também faz o pequeno “sacrifício”
De trinta contos – só! – por seu ofício
Receber, a bem dele… e da nação."
José Régio, 1969

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

"Desfolhada" – Simone de Oliveira

Poema escrito em 1968 por José Carlos Ary dos Santos, com o título “desfolhada portuguesa”, foi em 1969 renomeado para “desfolhada”. Nesse ano, com música de Nuno Nazareth Fernandes e orquestração de Joaquim Luís Gomes vence o Festival da Canção, interpretado pela voz colossal da Simone de Oliveira.

“Corpo de linho lábios de mosto meu corpo lindo meu fogo posto. Eira de milho luar de Agosto, quem faz um filho fá-lo por gosto. É milho-rei milho vermelho, cravo de carne bago de amor. Filho de um rei que sendo velho volta a nascer quando há calor. Minha palavra dita à luz do sol nascente meu madrigal, de madrugada amor, amor, amor, amor, amor presente em cada espiga desfolhada. Minha raiz de pinho verde meu céu azul tocando a serra. Oh minha água e minha sede, oh mar ao sul da minha terra. É trigo loiro é além Tejo, o meu país neste momento. O sol o queima o vento o beija, seara louca em movimento. Minha palavra dita à luz do sol nascente meu madrigal, de madrugada amor, amor, amor, amor, amor presente em cada espiga desfolhada. Olhos de amêndoa cisterna escura onde se alpendra a desventura. Moira escondida moira encantada lenda perdida lenda encontrada. Oh minha terra, minha aventura. Casca de noz desamparada. Oh minha terra, minha lonjura, por mim perdida, por mim achada.”
Apache, Fevereiro de 2010

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

"Cavalo à solta" - Mafalda Arnauth

Um poema de Fernando Tordo, na voz de Mafalda Arnauth

"Minha laranja amarga e doce, meu poema Feito de gomos de saudade, minha pena Pesada e leve, secreta e pura Minha passagem para o breve, breve Instante da loucura. Minha ousadia, meu galope, minha rédea Meu potro doido, minha chama, minha réstia De luz intensa, de voz aberta Minha denuncia do que pensa Do que sente a gente certa. Em ti respiro, em ti, eu provo Por ti consigo esta força que de novo Em ti persigo, em ti percorro Cavalo à solta pela margem do teu corpo. Minha alegria, minha amargura Minha coragem de correr contra a ternura. Minha laranja amarga e doce, minha espada Poema feito de dois gumes, tudo ou nada Por ti renego, por ti aceito Este corcel que não sossega À desfilada no meu peito. Por isso digo canção, castigo Amêndoa, travo, corpo, alma, amante, amigo Por isso canto, por isso digo Alpendre, casa, cama, arca do meu trigo. Minha alegria, minha amargura Minha coragem de correr contra a ternura Minha ousadia, minha aventura Minha coragem de correr contra a ternura Minha alegria, minha aventura Minha coragem de correr contra a ternura."

sábado, 31 de outubro de 2009

Nunca vais saber

"Nunca vais saber a sombra que fere o olhar o sorriso breve sem luz no caminho longo a fechar... Nunca vais saber o longo vácuo infinito a saudade já a sangue gravada na mudez nua de um grito... Nunca vais saber a lágrima quente na cama os olhos de seda rasgada o gelo firme na chama... Nunca vais saber a mão crispada e vazia o desejo insano mordido na intensidade do dia... Nunca vais saber o luar que me corre nas veias das noites, de prata vestidos e loucuras tecidas a meias... Nunca vais saber que és tu quem eu trago comigo que és tu quem me assalta ao acordar com um susto quente no peito... Nem nunca vais saber que sonho sempre contigo e que à noite... em ti me aconchego, e que é em ti que eu me deito... Não! Tu nunca vais saber..."
MCB 2008
De uma amiga (grande na escrita) que hoje é pequenina, a quem aproveito para dar os parabéns e desejar muitas felicidades

terça-feira, 6 de outubro de 2009

"A Gaivota" - Amália Rodrigues

"Se uma gaivota viesse trazer-me o céu de Lisboa, no desenho que fizesse, nesse céu onde o olhar é uma asa que não voa, esmorece e cai no mar. Que perfeito coração no meu peito bateria, meu amor na tua mão, nessa mão onde cabia perfeito o meu coração. Se um português marinheiro, dos sete mares andarilho, fosse quem sabe o primeiro a contar-me o que inventasse, se um olhar de novo brilho no meu olhar se enlaçasse. Que perfeito coração no meu peito bateria, meu amor na tua mão, nessa mão onde cabia perfeito o meu coração. Se ao dizer adeus à vida as aves todas do céu, me dessem na despedida o teu olhar derradeiro, esse olhar que era só teu, amor que foste o primeiro. Que perfeito coração morreria no meu peito, meu amor na tua mão, nessa mão onde perfeito bateu o meu coração." Poema de Alexandre O'Neill com música de Alain Oulman, em jeito de homenagem à voz inconfundível de Amália Rodrigues (1 de Julho de 1920 – 6 de Outubro de 1999)

Apache, Outubro de 2009

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Dona Flor e seus dois maridos

A propósito das críticas tecidas por António Barreto, no “Público” de ontem, às políticas educativas seguidas pela cúpula dirigente do respectivo ministério, o professor Manuel Brás, do blogue “Amêijoa Fresca” resume assim, a acção da tutela:
"À lenta deriva inicial, segue-se o rápido afundamento, da política demencial regulamento atrás de regulamento. A ideia de facilidade é democrática e igualitária, é esta a moralidade de uma política segmentária! Com base na autoridade do mais puro despotismo, tamanha é a imbecilidade deste ignóbil autismo! As oportunidades perdidas desta bandeira educativa, pois as pessoas foram iludidas pela propaganda governativa. Esta triste realidade, com milhões desperdiçados, é feita de futilidade e de diplomas amassados! Sem retorno tangível para o resto da sociedade, esta política fungível dilacera até à saciedade! Mais que esfarrapada, o ridículo simplista, a justificação empapada da educação socialista. Tamanha é a coragem desta ridícula postura, a educação é uma miragem com esta falta de cultura! Os despojos educativos desta política miserável, são ademais elucidativos da podridão deplorável." [Manuel Brás]
Apache, Julho de 2009

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

"Será?" - Pedro Abrunhosa

"Será que ainda me resta tempo contigo,
ou já te levam balas de um qualquer inimigo.
Será que soube dar-te tudo o que querias,
ou deixei-me morrer lento, no lento morrer dos dias.
Será que fiz tudo o que podia fazer,
ou fui mais um cobarde, não quis ver sofrer.
Será que lá longe ainda o céu é azul,
ou já o negro cinzento confunde o Norte com o Sul.
Será que a tua pele ainda é macia,
ou é a mão que me treme, sem ardor nem magia.
Será que ainda te posso valer,
ou já a noite descobre a dor que encobre o prazer.
Será que é de febre este fogo,
este grito cruel que da lebre faz lobo.
Será que amanhã ainda existe para ti,
ou ao ver-te nos olhos te beijei e morri.
Será que lá fora os carros passam ainda,
ou estrelas caíram e qualquer sorte é bem-vinda.
Será que a cidade ainda está como dantes,
ou cantam fantasmas e bailam gigantes.
Será que o sol se põe do lado do mar,
ou a luz que me agarra é sombra de luar.
Será que as casas cantam?, e as pedras do chão?,
ou calou-se a montanha, rendeu-se o vulcão.
Será que sabes que hoje é domingo,
ou os dias não passam, são anjos caindo.
Será que me consegues ouvir,
ou é tempo que pedes, quando tentas sorrir.
Será que sabes que te trago na voz,
que o teu mundo é o meu mundo e foi feito por nós.
Será que te lembras da cor do olhar,
quando juntos, a noite, não quer acabar.
Será que sentes esta mão que te agarra,
que te prende com a força do mar contra a barra.
Será que consegues ouvir-me dizer,
que te amo, tanto quanto, noutro dia qualquer.
Eu sei que tu estarás sempre por mim,
não há noite sem dia, nem dia sem fim.
Eu sei que me queres, e me amas também
me desejas agora como nunca ninguém.
Não partas então, não me deixes sozinho…
Vou beijar o teu chão e chorar o caminho.
Será?…"
[Talvez o melhor poema de] Pedro Abrunhosa

terça-feira, 25 de setembro de 2007

História sem fim

"Sou uma folha de Outono que cai lenta no chão… Sou um raio de sol a morrer no horizonte… Sou uma gota de sangue a escorrer na tua mão… Sou o som seco de uma água sem fonte…
Sou o ópio do sonho, o nevoeiro da cor… Sou o silêncio turvo do eclipse da vida… Sou a seiva da noite… sou o aroma da dor… Sou o riso amargo… a lágrima perdida…
Sou a história sem fim, a folha queimada… Sou a pegada na lama… o rasto de ser… Sou o frio da pedra… sou a sombra do nada… Sou o destino que não vai acontecer…" MCB (Darkmorgana), 1992

domingo, 21 de janeiro de 2007

Algo "com contornos de ainda"...

O poema que se segue é da autoria da Ni e foi deixado como comentário ao meu anterior "post". Pela qualidade (evidente), não podia deixar por publicar.
Algo "com contornos de ainda"... Estranha coisa esta com contornos de ainda que não se vê, mas mais do que toque que se pressente, é presente. Estranha coisa esta com contornos de ainda que não se canta, como grito interdito, mas é dor e alegria crescente. Estranha coisa esta com contornos de ainda que de tanto salgar a alma, suavemente a adoça. Estranha coisa esta com contornos de ainda que da vontade faz silêncio e do coração (parece que) troça. Estranha coisa esta com contornos de ainda que de tanto te negar e de ti se querer libertar, mais a ti se enlaça, em nó cego que não finda. Estranha coisa esta com contornos de ainda nem solar, nem lunar, que sem te ter anula o singular, e que do horizonte não tangível persiste em esperar a tua vinda.
Nina Castro, 18 de Janeiro de 2007

domingo, 1 de outubro de 2006

"Fado Perdição" - Cristina Branco

[O velhinho "fado perdição" que tantos interpretaram, mais que pela música, vale pelo poema e (aqui) por uma das mais belas vozes da nova geração de fadistas.]
“Este amor não é um rio, tem a vastidão do mar… E a dança verde das ondas soluça no meu olhar. Tentei escrever as palavras nunca ditas entre nós… Mas pairam sobre o silêncio nas margens da nossa voz. Tentei esquecer os teus olhos, porque não sabem ler os meus… Mas neles cresce a alvorada que amanhece a Terra e os Céus. Tentei esquecer o teu nome, arrancá-lo ao pensamento… Mas regressa a cada instante entrelaçado no vento. Tentei ver a minha imagem mas foi a tua que vi no meu espelho… porque trago os olhos rasos de ti. Este amor não é um rio, tem abismos como o mar… E o manto negro das ondas cobre-me de negro o olhar. Este amor não é um rio… Tem a vastidão do mar…” Fado Perdição – Cristina Branco

domingo, 6 de agosto de 2006

Sinais dos Tempos?... (2)

[Beirute, Capital do Líbano, início da manhã, 5 de Agosto de 2006... ] "Pergunto ao vento que passa notícias do meu país e o vento cala a desgraça, o vento nada me diz. Pergunto aos rios que levam tantos sonhos à flor das águas e os rios não me sossegam, levam sonhos, deixam mágoas. Levam sonhos, deixam mágoas, ai rios do meu país... minha pátria à flor das águas, para onde vais? Ninguém diz. Se o verde trevo desfolhas, pede notícias e diz ao trevo de quatro folhas, que morro por meu país. Pergunto à gente que passa, porque vai de olhos no chão? Silêncio... é tudo o que tem quem vive na servidão. Vi florir os verdes ramos, direitos e ao céu voltados. E a quem gosta de ter amos, vi sempre os ombros curvados. E o vento não me diz nada, ninguém diz nada de novo. Vi minha pátria pregada nos braços em cruz, do povo. Vi minha pátria na margem dos rios que vão pró mar, como quem ama a viagem, mas tem sempre de ficar. Vi navios a partir (minha pátria à flor das águas), vi minha pátria florir (verdes folhas verdes mágoas). Há quem te queira ignorada e fale pátria em teu nome. Eu vi-te crucificada nos braços negros da fome. E o vento não me diz nada, só o silêncio persiste. Vi minha pátria parada, à beira de um rio triste. Ninguém diz nada de novo, se notícias vou pedindo. Nas mãos vazias do povo vi minha pátria florindo. E a noite cresce por dentro dos homens do meu país. Peço notícias ao vento e o vento nada me diz. Quatro folhas tem o trevo, liberdade quatro sílabas. Não sabem ler é verdade aqueles para quem eu escrevo. Mas há sempre uma candeia dentro da própria desgraça, há sempre alguém que semeia, canções no vento que passa. Mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não!"
Trova do vento que passa - Manuel Alegre

quarta-feira, 12 de julho de 2006

"Cinderela" - Carlos Paião

"Eles são duas crianças a viver esperanças, a saber sorrir.
Ela tem cabelos louros, ele tem tesouros para repartir.
Numa outra brincadeira passam mesmo à beira sempre sem falar.
Uns olhares envergonhados e são namorados sem ninguém pensar.
Foram juntos, outro dia, como por magia, no autocarro, em pé.
Ele lá lhe disse, a medo: «O meu nome é Pedro e o teu qual é?»
Ela corou um pouquinho e respondeu baixinho: «Sou a Cinderela».
Quando a noite o envolveu ele adormeceu e sonhou com ela...
Então,
bate, bate, coração,
louco, louco, de ilusão.
A idade assim não tem valor.
Crescer,
vai dar tempo p'ra aprender,
vai dar jeito p'ra viver,
o teu primeiro amor.
Cinderela das histórias, a avivar memórias, a deixar mistério…
Já o fez andar na lua, no meio da rua e a chover a sério.
Ela, quando lá o viu, encharcado e frio, quase o abraçou.
Com a cara assim molhada ninguém deu por nada, ele até chorou...
Então,
bate, bate, coração,
louco, louco, de ilusão.
A idade assim não tem valor.
Crescer,
vai dar tempo p'ra aprender,
vai dar jeito p'ra viver,
o teu primeiro amor.
E agora, nos recreios, dão os seus passeios, fazem muitos planos.
E dividem a merenda, tal como uma prenda que se dá nos anos.
E, num desses momentos, houve sentimentos a falar por si.
Ele pegou na mão dela: "Sabes Cinderela, eu gosto de ti..."
Carlos Paião - Cinderela

domingo, 2 de julho de 2006

Egoísmo

Que me importa
amor
que seja dia
ou que seja noite iluminada.
Que me importa
amor
que seja a chuva
ou um novelo de paz a madrugada.
Que me importa
amor
que seja o vento
ou a flor, o fogo mais aceso
Que me importa
amor
que seja a raiva.
Que me importa
amor
que seja o medo.
Maria Teresa Horta

sábado, 27 de maio de 2006

Porque não oiço no ar – Hélder Moutinho

Eu sei que a Primavera já chegou, aliás, já cheira a Verão aqui em Lisboa, prevêem-se para hoje 34º, mas hoje… hoje apetece-me que o Inverno seja quando o homem quiser. É estranho, eu sei, eu não gosto do Inverno, mas… Talvez, laivos de saudade… Porquê?
“Porque não oiço no ar a tua voz Entre brumas e segredos escondidos E descubro que o silêncio entre nós São mil versos de mil cantos escondidos. Porque não vejo no azul-escuro da noite Nas estrelas esse brilho que é o teu E procuro a madrugada que me acoite Num poema que não escrevo mas é meu. Olho o vento que se estende no caminho E ensaia a tua dança de voar És gaivota que só chega a fazer ninho Quando o tempo te dá tempo para amar. Mas também se perde o tempo que se tem Para gastar só quando chega a Primavera Veste um fato de saudade amor e vem Que é Inverno, mas eu estou à tua espera.” Porque não oiço no ar – Hélder Moutinho