quinta-feira, 1 de maio de 2008

A falta de “Visão”

A última edição da revista “Visão” coloca o Primeiro-Ministro britânico, Gordon Brown, no lugar mais baixo da tabela de “mais e menos” da semana, devido à manifestação de professores contra as suas políticas educativas, que juntou nas ruas de Londres cerca de 10 000 professores. Curiosamente, esta mesma revista, colocou Maria de Lurdes Rodrigues a meio da escala, quando à pouco mais de um mês, uma manifestação por razões semelhantes, juntou nas ruas de Lisboa 100 000 docentes. Comparando a realidade portuguesa com a inglesa, significa que em Portugal, a manifestação teve 60 vezes mais participantes e a “visão” atribui-lhe metade da importância. Diz que é uma espécie de jornalismo…
Apache, Maio de 2008

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Contos Proibidos (3)

25 de Abril… Os dias seguintes
“Os militares, como afirma o próprio Otelo, tinham então como meta «a restauração do prestígio das Forças Armadas» e não são aparentes quaisquer indícios de que, por detrás do Movimento das Forças Armadas, existisse um plano politicamente concertado e ideologicamente fundamentado. Spínola era um anticomunista convicto e, no fundo, considerava-se um patriota com a missão de restabelecer em Portugal uma democracia mais ou menos liberal e manter a possível unidade do «império colonial» em moldes que os Movimentos de Libertação pudessem aceitar. (…) A Junta de Salvação Nacional dificilmente poderia, no dia 25 de Abril, ser considerada de esquerda e muito menos associada ao Partido Comunista. Quaisquer extrapolações posteriores só se compreendem para justificar a incapacidade, quer da direita, quer da esquerda democrática, para então fazer compreender aos homens do MFA as vantagens e superioridade da via democrática. O general Spínola que, enquanto presidente da Junta de Salvação Nacional, seria nomeado Presidente da República, Silvério Marques, Pinheiro de Azevedo, Galvão de Melo, Diogo Neto, Costa Gomes eram todos homens de direita; por outro lado, pouco se conhecia a respeito da personalidade de Rosa Coutinho, apesar de bem visto pelos americanos após um curso que frequentara naquele país. Costa Gomes, que posteriormente viria a ser aliciado para o campo comunista, atingindo mesmo o mais baixo grau de subserviência ao dar cobertura às actividades da estratégia soviética através do Conselho Mundial da Paz, era inicialmente parte do establishment ocidental, tendo mesmo sido ele o primeiro a propor o general Spínola para presidente da Junta. O primeiro-ministro escolhido em segunda mão para chefiar o Primeiro Governo Provisório, Prof. Adelino da Palma Carlos, era um republicano «maçom», de pendor mais conservador que liberal. Os membros do Primeiro Governo Provisório eram igualmente, na sua grande maioria, liberais e conservadores nomeados com base nas propostas e recomendações dos chefes partidários, com excepção de Raul Rego e Firmino Miguel. (…) Dados os sentimentos anticomunistas do general Spínola, dada a sua amplamente demonstrada ignorância política e o facto de se saber que Mário Soares teria dito ao general que se Cunhal não entrasse ele também não entrava para o Governo, parece evidente que a decisão foi influenciada decisivamente pelos socialistas. (…) O mundo inteiro recebera o anúncio do 25 de Abril com grande regozijo e quem dava garantias e tranquilizava os governos aliados de Portugal na NATO era exactamente o general Spínola e não o socialista Mário Soares, co-signatário de um «inquietante» acordo de governo com o Partido Comunista. (…) O Partido Socialista achava o seu secretário-geral fundamental para organizar um partido que a 25 de Abril não existia «de facto» e que, como se veria alguns meses depois, ia sendo entregue» ao PCP no seu 1º Congresso. (…) Algo semelhante me dissera em tempos Olof Palme que tivera vários contactos com Otelo Saraiva de Carvalho por quem nutria grande simpatia. Contou-me, durante um momento de boa disposição no centro de formação do movimento sindical sueco, em Bommersvik, que Otelo lhe dissera durante a sua primeira visita a Portugal, em Outubro de 1974, que antes do 25 de Abril sempre considerara a social-democracia demasiado à esquerda. Era opinião do malogrado primeiro-ministro da Suécia, que Otelo e os capitães de Abril que ele tivera oportunidade de conhecer, não passavam de militares inicialmente bem-intencionados e politicamente «analfabetos», que o PCP habilmente conseguira, com apoio da comunicação social, transformar em «estrelas». (…) Mário Soares chegara a Portugal sob a influência do contrato político acordado com o PC em Paris em 1973 e, pior do que isso, perfeitamente convencido de que o PS estava predestinado a um papel subalterno em relação aos comunistas. (…) Embora surpreendidos com o golpe, a satisfação com a queda do regime de Marcello Caetano foi unânime em todo o mundo e nenhuma dificuldade existiria para o reconhecimento do novo Governo. Aliás, antes mesmo de Mário Soares iniciar, a 2 de Maio de 1974, o seu périplo com a finalidade de alegadamente obter reconhecimento e apoio para o novo regime, já se tornara mais que evidente que a nomeação de Spínola para Presidente da República, a declaração do MFA e a composição da Junta de Salvação Nacional eram mais do que indícios suficientes para tranquilizar os aliados tradicionais de Portugal. O que já lhes era mais difícil de aceitar - isso sim - era a inclusão de Álvaro Cunhal e de dirigentes comunistas no governo. E não se pense que as objecções a tal precedente num país da NATO, eram só dos EUA. Os socialistas presentes em governos europeus de países da NATO, como os da Grã-Bretanha, Alemanha, Noruega e Dinamarca demonstraram igual perplexidade! É portanto neste contexto que se devem compreender as manobras e o círculo vicioso de contra-informação e decepção em redor da nomeação de Mário Soares para ministro dos Negócios Estrangeiros. (…) Apesar da fama e prestígio que adquirira, essencialmente derivados das suas reconhecidas qualidades militares e, posteriormente, pela coragem de enfrentar Marcello Caetano, Spínola não tinha condições políticas para ser Chefe de Estado. E nenhum dos seus conselheiros foi capaz de o demover da ideia de incluir o PCP no governo. Que Mário Soares o tivesse feito compreende-se, dado o ainda fresco programa de acção comum e a subalternidade a que o PS parecia disposto a submeter-se. Agora que Freitas do Amaral também o tenha aconselhado nesse sentido é deveras surpreendente e mostra, de facto, as grandes responsabilidades que a direita teve no avanço comunista em Portugal. Num acto demonstrativo de grande versatilidade da direita portuguesa o ex-procurador à Câmara Corporativa e, então, conselheiro de Estado da «Revolução», lembraria Spínola de que já De Gaulle tinha incluído comunistas no governo francês «a seguir à vitória dos aliados na Segunda Grande Guerra». Mas, o conselho de Freitas do Amaral nem sequer se pode comparar à situação em Portugal após o 25 de Abril. É que os Aliados saíram vitoriosos de uma Guerra devastadora contra o nazismo e contra o fascismo graças à sua tardia aliança com a União Soviética de Estaline e, em França, os comunistas tiveram um papel decisivo na Resistência e no apoio ao general De Gaulle para Presidente da República. Em Portugal a «resistência» comunista, se bem que meritória, não foi decisiva para a queda do regime que, segundo o próprio Freitas do Amaral, não era um regime fascista e a designação de Spínola não seria influenciada pelo Partido Comunista. (…) Por esta altura, o tesoureiro do partido era um dos fundadores presentes em Bad Munstereifel. Carlos Carvalho, que usava como método de contabilidade a acumulação de papelinhos soltos, onde ia depositando números e com os quais passava recibos. Método aliás legado aos seus sucessores. Diplomatas e delegações estrangeiras eram recebidas nos corredores e nas escadas.”
Rui Mateus em “Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido, 1996”

domingo, 27 de abril de 2008

Velhas "notícias” sobre Alterações Climáticas

O medo das catástrofes climáticas é tão velho como a humanidade. Com a evolução do conhecimento científico, esse medo tendia a diminuir, mas eis que surgiu a comunicação social de massas…
24 de Fevereiro de 1895 – New York Times – “Geólogos pensam que o mundo vai congelar de novo”. 7 de Outubro de 1912 – New York Times – “O professor Schmidt avisa-nos que vem aí uma nova Idade do Gelo”; - Los Angeles Times – “A quinta idade do gelo vem a caminho. A raça humana terá de lutar contra o frio, pela sobrevivência”. 9 de Agosto de 1923 – Chicago Tribune – “Cientista diz que o gelo do Árctico vai cobrir o Canadá”. 10 de Agosto de 1923 – Washington Post – “Vem aí uma nova Idade do Gelo”. 6 de Abril de 1924 – Los Angeles Times – “ Se isto for verdade, deveremos considerar que estamos a entrar noutra Idade do Gelo”. 11 de Março de 1929 - Los Angeles Times – “A maioria dos geólogos pensa que o mundo está a ficar mais quente e que irá continuar a aquecer”. 15 de Maio de 1932 - New York Times – “A cobertura de gelo dos Pólos está a derreter”. 6 de Novembro de 1939 – Chicago Daily Tribune – “Chicago lidera uma lista de milhares de cidades à volta do mundo, que têm sido afectadas por uma estranha tendência de aquecimento do clima, verificada nas últimas duas décadas”. 10 de Agosto de 1952 – New York Times – “Aprendemos que o mundo tem vindo a aquecer no último meio século”. 8 de Janeiro de 1954 – World Report – “Os invernos estão a ficar temperados e os verões secos. Os glaciares retrocedem e os desertos avançam”. 20 de Fevereiro de 1969 - New York Times – “A cobertura de gelo do Árctico está minúscula. O oceano, junto ao Pólo Norte tornar-se-á mar aberto dentro de uma ou duas décadas”. 15 de Novembro de 1969 – Science News – Saber durante quanto tempo mais vai continuar este arrefecimento é um dos maiores desafios da civilização”. 11 de Janeiro de 1970 - Washington Post – “Invernos mais frios no alvorecer da Nova Idade do Gelo”. 29 de Dezembro de 1974 - New York Times – “As actuais alterações climáticas resultarão em mortes em massa e provavelmente em anarquia e violência”. 28 de Abril de 1975 – Newsweek – “O mundo arrefece. A escassez de alimentos como resultado das alterações climáticas, pode começar brevemente, talvez dentro de dez anos. No centro da questão está o acentuado arrefecimento da Terra”. 21 de Maio de 1975 – New York Times - Um dos mais severos arrefecimentos de sempre torna-se inevitável”. 12 de Janeiro de 1976 - New York Times – “O frio já matou centenas de milhar de pessoas nos países pobres”. 22 de Agosto de 1981 - New York Times – “Está previsto um aquecimento global de uma magnitude sem precedentes”. 18 de Janeiro de 2006 - Washington Post – “O aumento das temperaturas altera literalmente os fundamentos da vida no planeta”. 26 de Março de 2006 – Time – “O gelo dos Pólos derrete cada vez mais depressa (…) A Terra está a ser devastada pela seca (…) A subida do nível do mar está a afundar as populações costeiras (…) Quaisquer que sejam as análises, a Terra está no ponto de viragem. O clima está a implodir e o responsável é o aquecimento global.” Percebem agora porque é que o Al Gore começou a jogar múltiplas e diz que podemos vir a morrer congelados por causa do aquecimento global? Se aquecer, ele tem razão, se arrefecer também, é a fórmula do sucesso garantido, ou a arte da aldrabice, a que alguns chamam política e outros, negócio. Nada de novo, aqui, “debaixo” do Sol.
Apache, Abril de 2008

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Dona Lurdes, ao "Correio da Manhã" (2)

CM - Não havia também algum medo dos professores de fazerem participações disciplinares dos alunos? Das consequências que lhes podiam cair em cima? MLR - Isso pode existir. Já me têm feito referências a essa possibilidade. Mas voltamos de novo ao ponto da organização funcionar. O professor até pode ter receio ou até pode ter medo. Admito. Não é saudável, mas admito. Apache - Medo? Ainda a semana passada fui instrutor de um Processo disciplinar com 17 participações e essa turma tem mais de 60. Imaginem que os professores perdiam o medo de fazer participações disciplinares… (…) Uma das críticas que se faz é ao facilitismo instalado na escola pública. Não há exigência, não há trabalho. Que a escola devia chumbar quem não sabe e não trabalha? Concorda com isto? Sabe que há muitas contradições nesse discurso. E no nosso sistema há muitas contradições. Porque, em minha opinião, a repetência ou o chumbo é o elemento mais facilitista do sistema educativo. Bem, se o discurso do facilitismo tem contradições, esta argumentação tem o quê?
Eis-nos irremediavelmente à deriva, num universo paralelo… Mais facilista? Como? É a coisa mais fácil. O aluno está com dificuldades, fica ali num cantinho da sala e no final do ano repete. Isso é o que há de mais facilitista no nosso sistema. E são muitos e pratica-se com demasiada frequência. Hum… Talvez o problema esteja precisamente no facto de as salas terem cantos, uma sala redonda ajudava certamente na compreensão desta lógica da batata. Com muita frequência? Sim. Eu tenho um estudo do PISA (Programme for International Student Assessment) com coisas muito interessantes. Este estudo procura comparar os resultados dos países do Sul que têm todos estes fenómenos da repetência e como a repetência não ajuda a melhorar os resultados escolares. Ah, pois… Se os alunos passarem todos, os resultados escolares são melhores. Raciocinio muito elaborado... Não ficam a saber mais? Não. O princípio é este: não sabes, ficas mais um ano para repetires toda a matéria que deste para ficares a saber. E o que acontece é que a segunda parte desta premissa não se verifica. Ele chumba, fica para repetir, repete mas não aprende. Pelo contrário. Desaprende. Donde se conclui que o melhor é os alunos não irem à escola, evitam “desaprendizagens”… Fica pior? Fica pior. E por isso é que eu digo que é facilitista porque é a maneira de deixar os alunos entregues a si mesmo. É uma contradição do nosso sistema. Que é considerar que a exigência se mede pelo número dos que repetem. Nós temos inúmeros alunos a repetir muito mais do que a média de todos os países da Europa ou mesmo da OCDE. Somos o País em que há mais repetências. Este estudo vinha no fundo do pacote das bolachas… Mais chumbos? Somos o País em que há mais chumbos. E por aí o nosso sistema não seria facilitista, seria exigente, mas na realidade é facilitista porque essa repetência não serve para aumentar o rigor e a exigência de trabalho com esses alunos. Ficam numa espécie de limbo que depois prejudicam muitíssimo os nossos resultados como se pode ver no estudo do PISA. Numa espécie de limbo, está a ficar esta entrevista, algures entre a falta de vergonha e a incapacidade de encadeamento lógico das ideias. Prejudicam como? Se considerarmos na amostra os alunos que não repetem, os alunos que estão no ciclo adequado à sua idade têm valores iguais à média dos países da OCDE. Até produzimos mais excelência. Isto é, os nossos alunos do 7 º ano muito bons são melhores do que os muito bons dos outros países. Mas depois temos o peso dos que chumbam, dos que ficam retidos, que puxam os nossos resultados médios para baixo. Cá está… O sistema é facilitista, mas produzimos mais excelência... “Mas depois temos o peso dos que chumbam”… Hum… Não será o chumbo dos que pesam? Ficam para trás? Vão repetindo, ficam para trás e pesam nos resultados globais muito negativamente porque a repetência, de facto, na minha opinião, é facilitista porque não é um meio de os obrigar a estudar a mais e a aprender. Daí que se um aluno que não faz a ponta de um corno, passar, sente-se imediatamente obrigado a estudar, até porque sabe a partida que se o não fizer, para castigo, passa de novo. A entrevista prosseguiu no mesmo tom. Faz-se uma afirmação populista e seguidamente fundamenta-se o seu contrário. Continuar a publicar esta entrevista podia prejudicar gravemente a saúde metal de hipotéticos leitores, daí, ter optado por interrompê-la aqui. Se quiserem arriscar (à vossa responsabilidade), ela encontra-se aqui. Esperem… Se acham que estou a exagerar ao prevenir-vos, reparem no estado lastimável em que ficou o jornalista (António Ribeiro Ferreira), que escreveu assim no final… “Maria de Lurdes Rodrigues não pára, muitas vezes nem para almoçar. A semana que passou foi uma delas. Praticamente sem tempo para almoçar. E a mulher dura, necessariamente com muito mau feitio para suportar os ataques duríssimos de sindicatos e da generalidade dos partidos da Oposição, é uma senhora adorável que pergunta ao jornalista se pode ir comendo umas bolachas durante a entrevista. Uma mulher determinada, inteligente, que percebe bem as razões que levam os professores para a rua. Nunca, em trinta anos, alguém lhes impôs princípios que são hoje universais.” Depois não digam que não avisei…
Apache, Abril de 2008

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Dona Lurdes, ao “Correio da Manhã”

CM - Este acordo com os sindicatos a propósito da avaliação dos professores teve por base uma chantagem do Governo, como afirmou a socialista Ana Benavente? MLR - Não, não foi feita nenhuma chantagem. Repare, o que aconteceu é que, em minha opinião, os professores foram induzidos no erro de pensar que era possível não haver avaliação e daí não ocorrerem nenhumas consequências. Apache - Não creio que os professores achassem possível não haver avaliação, isso implicava que os docentes considerassem que Portugal se pautaria por critérios idênticos aos dos países mais avançados da Europa, como, por exemplo, a Finlândia. Os professores portugueses não são tão optimistas. Tem consequências nos contratos e nos vencimentos? O que está estabelecido no decreto regulamentar é que a avaliação, que no anterior modelo não tinha qualquer consequência em termos de progressão na carreira e contagem do tempo de serviço, neste modelo tem consequências. Mente, ou na hipótese moralmente menos danosa, não sabe ler. O antigo diploma que regulava a avaliação docente: Decreto Regulamentar nº 11/98, de 15 de Maio “Artigo 12º 6 – A atribuição ao docente em avaliação de uma primeira menção qualitativa de Não satisfaz produz os efeitos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 48º do ECD.” [reincidência] “Artigo 18º 7 – A não atribuição da menção qualitativa de Satisfaz determina a aplicação do disposto nos nºs 3 ou 4 do artigo 48º do ECD, consoante os casos.” O antigo Estatuto da Carreira Docente: Decreto-Lei nº 139-A/90 de 28 de Abril, sucessivamente alterado pelos Decretos-Lei nºs 105/97 de 29 de Abril e 1/98 de 2 de Janeiro “Artigo 48° Efeitos da atribuição da menção de Não Satisfaz 1 - A atribuição da menção qualitativa de Não satisfaz determina que não seja considerado o período a que respeita para efeitos de progressão na carreira ou, tratando-se de docente em pré-carreira, para efeitos de ingresso na carreira. 2 - A primeira atribuição da menção qualitativa de Não satisfaz determina a permanência do docente no escalão em que se encontra, devendo ser acompanhada de uma proposta de formação que permita ao docente superar os aspectos do seu desempenho profissional identificados como negativos no respectivo processo de avaliação. 3 - A atribuição de uma segunda menção qualitativa de Não satisfaz determina a cessação de distribuição de serviço lectivo ao docente em avaliação, devendo o órgão de gestão do estabelecimento de educação ou de ensino propor a reconversão ou reclassificação profissional do docente em situação de carreira ou pré--carreira, nos termos da lei. 4 - A verificação da situação prevista no número anterior determina a cessação da nomeação provisória no termo do ano escolar, no caso de docentes em pré-carreira.” Foi isso que alguns apelidaram de chantagem? Claro. O que acontece é que Governo nenhum, na minha opinião, estaria disponível para abrir uma excepção para os professores num quadro em que toda a administração pública está a ser avaliada e tem condicionamentos na sua progressão em função dos resultados da avaliação. Hum… Acho que devia aproveitar o programa Novas Oportunidades e matricular-se no Primeiro Ciclo do Ensino Básico, para adquirir competências ao nível da leitura? E os professores não têm consequências tão gravosas, pois não? No caso da administração pública é pior porque mesmo com avaliações positivas o que acontece é que as progressões estão dependentes da autorização da chefia directa, de questões orçamentais. Já no caso dos professores, a sua avaliação depende da boa disposição dos avaliadores (a chefia directa) no dia do preenchimento das grelhas e obviamente de questões orçamentais, para variar. Estão limitadas. Exactamente. E no caso dos professores a situação é muito diferente porque nós temos a noção de que a função docente é diferente, mais exigente, tem outras características, tem um modelo diferente. Pois, é preciso ir buscar os alunos a casa, engraxar os sapatos aos avaliadores, usar muito as Tecnologias da Informação e Comunicação, elogiar as Áreas Curriculares Não Disciplinares e proporcionar muito conforto aos alunos. Tudo com muita tranquilidade, sem stresses. (…) Foram precisos muitos anos para se arranjar um modelo de avaliação dos professores. Porquê? Por receio político? (Outro com graves problemas de memória) E de outros funcionários públicos, não foram só os professores. Esta situação não era um exclusivo dos professores. Foi difícil, está ainda a ser difícil, vai ser difícil durante alguns anos porque foram muitos anos em que aquilo que vigorou foi um paradigma que é contrário, em quase todas as dimensões, àquele que é o paradigma que estamos a tentar concretizar agora. Um paradigma contrário em quase todas as dimensões? Deve ser de um universo paralelo… Uma espécie de antimatéria dos paradigmas… É um novo paradigma? (Olha, aprendeu uma palavra nova…Quando explicarem ao Albino o que é um paradigma, aproveitem e expliquem também a este.) É um novo paradigma seguramente. Repare. A divisão da carreira em duas categorias é uma situação que é muita estranha para os professores. Porque durante trinta anos as associações sindicais construíram um grupo homogéneo, acabaram com todas as diferenças. “Muita estranha”? “As organizações sindicais construíram um grupo homogéneo”? Terão construído os professores? Acabaram com todas as diferenças? E eu que estava convencido que a beldade do Departamento de Artes tinha qualquer coisa diferente de mim… Todos iguais? Todos iguais. Os professores do 1 º ciclo eram diferentes, os professores de ginástica eram diferentes, os professores de educação visual eram diferentes de todos os outros professores. Tudo acabou. A única variável que os professores continuaram a considerar legítima para os distinguir era o tempo de serviço. Era a carreira. “Todos iguais.” Pronto, está confirmado. Que desilusão! “Os professores de ginástica”? Que é isso? “Tudo acabou.” Pois, agora distinguem-se pela capacidade de lamber botas e por passar todos os alunos, saibam ou não. Com conforto e tranquilidade, claro. Só isso? Só isso. Mas esse tempo de serviço era muitas vezes um tempo de calendário. “Tempo de calendário”? Será uma alteração climática? Não significava serviço efectivo? Não, era um tempo de calendário. Agora estamos a propor uma alteração completa. Que é a reestruturação da carreira em sentido vertical, a sua verticalização. E isso é absolutamente necessário porque se fazem as comparações com outras profissões e com a profissão docente em outros países e este é o caminho natural de evolução de uma profissão. Nenhuma profissão pode ser de progressão cilíndrica, em que não há nenhuma estruturação vertical. Porque isso é contrário ao princípio de carreira. “Não, era um tempo de calendário.” Deve ser o tal paradigma, contrário em todas as dimensões… Esqueceu-se que já havia uma progressão na carreira. A idade não perdoa… “Progressão cilíndrica, em que não há nenhuma estruturação vertical”? O poço da morte não é, que esse tem estruturação vertical. Porquê? O princípio de carreira a estruturar as profissões significa que se admite que mais tempo de serviço significa mais experiência, mais competências. Há carreiras em que nós admitimos que o tempo de experiência conta, é uma mais-valia. Por exemplo na carreira docente, por isso havia vários escalões. Isso não se passava com os professores? Não. Havia carreira, havia os professores mais experientes, mais graduados e melhor remunerados mas isso não correspondia a nenhuma responsabilidade. O que fizemos foi reestruturar, no fundo formalizámos essa diferença e os professores com mais experiência e mais competências devem assumir mais responsabilidades no interior da escola, mais tempo de trabalho na escola e devem ter mais responsabilidades na avaliação e acompanhamento dos professores mais novos. E isto são mecanismos comuns a todas as profissões e eram uma excepção na função docente. Eram uma excepção, não. Agora é que são. Convém relembrar os esquecidos que os titulares (de onde saem os avaliadores, por nomeação do Director e não por qualquer critério de mérito) foram “classificados” com base em cargos exercidos nos últimos 7 anos e não com base no desempenho pedagógico em 20 ou 30 anos de carreira. E isso é muito estranho para os professores? Eu sei que é muito importante concretizar estes princípios. Mas também sei que isto é muito estranho para a maioria dos professores. Muito estranho, de facto. A larga maioria dos professores pauta-se por critérios de dedicação e de mérito, não por amizades, conluios e compadrios. Era o tal paradigma de que falava? É. Pronto, agora já sabemos o que é um paradigma… De outras dimensões, é certo, mas havemos de chegar aos paradigmas do nosso universo, com tranquilidade… (…) Mas os sindicatos queixam-se que de a sua equipa quando vai para negociação já vai com posições definitivas e apenas perguntam a opinião deles. Que não há verdadeiras negociações. Vamos lá ver. O que é a negociação? A negociação não pode significar, é bom que não signifique, a perda daquilo que são os pontos de partida, os pontos de referência. O Ministério da Educação, pelas razões que já lhe disse, considera muito importante reestruturar a carreira em duas categorias: professor e professor titular. “O que é a negociação?” Oh, não… Vem aí outro paradigma contrário em todas as dimensões… E os sindicatos nem querem ouvir falar disso? Os sindicatos reagem negativamente, não aceitam a necessidade de reestruturar a carreira por razões que eu consigo compreender até pela história recente da carreira docente. Não aceitam. Hum… Afinal consegue (ainda que com dificuldade) compreender este universo. Mas o Ministério vai para a frente com a proposta, apresenta uma proposta de reestruturação da carreira. Os sindicatos vão para a negociação e de duas, uma: ou têm capacidade de destruir, convencer o Ministério da Educação de que isto é errado, ou não. Os sindicatos, “ou têm capacidade de destruir ou não”? O sindicalista suicida… mais uma figura de outras dimensões… (…) Quando é que um professor sente de facto na pele e é penalizado por ser um mau professor? (Por outras palavras, quando é que é chicoteado na praça pública?) No segundo ciclo. Com a confirmação. Todos aqueles que tiverem uma avaliação, conforme a avaliação negativa sofrerão os efeitos desse resultado. Falando da qualidade dos professores. O ponto máximo de mobilização dos professores, na manifestação de 8 de Março, foi a avaliação. Muitos professores terão medo da avaliação? Qual é, em sua opinião, a qualidade média dos professores? É boa, medíocre ou má? Já me têm feito essa pergunta. Vou só trincar mais umas bolachinhas… Qual é a sua ideia, que expectativa tem dos resultados da avaliação? Acho que a profissão dos professores é como todas as outras profissões. Excepto a de político. Não quero cá misturas com outras dimensões… Claro. Há de tudo. Veja a comparação que muitas vezes se faz entre a escola pública e a escola privada. Diz-se que a escola privada funciona melhor, tem melhores resultados, tem melhores professores, podia deduzir-se isso. Mas não se pode dizer isso, até porque a base de recrutamento dos professores é a mesma. Muitas vezes os professores são os mesmos, porque acumulam. As escolas profissionais são um exemplo dessa acumulação. Ups… Fugiu-lhe a língua para a verdade. É como os professores que têm bons resultados numas turmas e maus noutras. Tragam cá outra vez a cassete, para a senhora ouvir. Aí a idade… Essas acumulações não prejudicam a escola pública? Nestes últimos três anos criámos umas regras que impedem essas acumulações com a facilidade que acontecia anteriormente. Mas como lhe dizia, a base de recrutamento é a mesma. O que muda são as regras, a organização. As organizações quando funcionam superam as insuficiências dos profissionais. Pois. Infelizmente, a organização, Ministério da Educação, funciona tão mal que não supera as insuficiências, cria-as.
(...) E de preparação de base, não acha? De preparação de base. Também admito. Mas não é nada que não se supere com o trabalho. Nós aprendemos muito ao longo da vida, mesmo com uma preparação de base deficiente. Veja-se o caso (paradigmático) do “Inginheiro”… Isso leva-nos ao novo modelo de gestão das escolas. Ao modelo de gestão e ao modelo de avaliação também. A avaliação dá às escolas, a quem dirige as escolas, tanto do ponto de vista da gestão como pedagógico, os meios para distinguir os melhores professores. No fundo, para estabelecer os diferenciais de qualidade. Estabelecer o que é um professor excelente para essa organização, o que é muito bom e por aí adiante. E os professores com esses referenciais podem evoluir e aproximar-se desses modelos. Coisa que agora ainda não há na escola pública. Agora em espaços organizacionais em que estes modelos não existem, tanto faz ser muito bom como muito mau, não há consequências. É por isso que eu sou uma defensora do modelo de avaliação. Deste ou de outro qualquer. Já tenho dito e repito. Eu acho que não há modelos ideais. Cada País tem o seu modelo. Se é uma defensora de qualquer modelo porque é que acabou com o anterior, menos mau que este? “Cada país tem o seu modelo”? Nós temos o do Chile e da Colômbia. É muito subjectivo? O importante é que exista um modelo, que tenha consequências e que seja apropriado pelos próprios profissionais, que sejam os profissionais a defender o modelo de avaliação. Isso é absolutamente essencial. Pois… Que o modelo seja objectivo, justo, isso agora não interessa nada… (...)
O novo modelo de gestão, com a figura do director, não vai permitir resolver em grande parte os problemas de indisciplina e violência nas escolas? Para o problema da indisciplina eu acho que há um conjunto de medidas que têm de ser convergentes com esse objectivo. O modelo de gestão que foi aprovado e que será agora publicado é um modelo que reforça a autoridade, os princípios de autoridade e de responsabilização no interior da organização. Agora também foi importante a revisão do Estatuto do Aluno. Eu também acho que qualquer dos dois pode contribuir decisivamente para abandalhar mais. Percebe-se, de facto, a interligação dos dois diplomas… Também muito contestado. Foi importante a revisão na dimensão da desburocratização do procedimento. Na possibilidade da repreensão automática. Porque no anterior estatuto a repreensão não era automática. Primeiro fazia um requerimento e depois é que repreendia. Isso é que não pode ser. "A repreensão não era automática"? “Um requerimento”?
Lá vamos nós de novo para a Twilight Zone…
Apache, abril de 2008

domingo, 20 de abril de 2008

Falta-nos saber o preço…

«O Ministro do Trabalho foi o mediador do conflito da Educação, tendo chamado o líder da CGTP, Manuel Carvalho da Silva, para desbloquear a guerra aberta entre os sindicatos e Lurdes Rodrigues. (…) No dia 29 de Março, o Ministro do Trabalho telefona a Carvalho da Silva pedindo-lhe um encontro, que acontece no gabinete do ministro. Tinham passado 11 dias sobre o encontro da delegação da CGTP com o Primeiro-Ministro, em São Bento, onde a guerra na Educação fora aflorada. Os cem mil manifestantes foram a almofada necessária para que Carvalho da Silva pedisse “uma saída para este conflito”, sem a qual, terá deixado claro, não haveria possibilidade de acalmar todos os outros sectores. Sócrates, por seu lado, não deixou passar a oportunidade de ter pela frente o líder sindical para solicitar a sua intervenção na resolução de um problema que, a agudizar-se, não traria senão prejuízos para ambas as partes. Carvalho da Silva foi sensível à argumentação do Primeiro-Ministro, talvez ‘sugestionado’ pelo facto de estar em curso a revisão do Código Laboral e de os sindicatos, participando na solução, ganharem a médio prazo créditos sobre o Governo. Os recados estavam dados e o governo passou à acção. Vieira da Silva foi o mandatário da tentativa de aproximação entre professores e ministério. Reuniu, primeiro com o dirigente da Inter. Depois, solicitou a sua ajuda para conseguir chamar ao ministério o líder da Fenprof. Mário Nogueira juntar-se-ia no dia 31 ao encontro com Carvalho da Silva e com o Ministro do Trabalho. (…)» [“Expresso” – 19 de Abril de 2008] A ser verdadeira (e até agora não foi desmentida), a notícia deixa claro que a Plataforma de Sindicatos da Educação vendeu os professores ao Governo em troca de benesses ainda não apuradas nas negociações laborais que as centrais sindicais mantêm com o Executivo. Resta agora aos professores sindicalizados responder condignamente aos vendilhões.
Apache, abril de 2008

sábado, 19 de abril de 2008

Alguma luz…

Em resposta ao repto lançado por vários movimentos independentes de professores e também por professores anónimos (Apache incluído), dois dos sindicatos associados na Fenprof, o SPGL e o SPN publicaram os resultados da votação do dia D, escola a escola. Antes de mais, convém destacar a coragem destes dois sindicatos em darem um pouco de transparência a este nebuloso processo. Numa análise dos resultados, convém perguntar onde foram parar os das escolas do 1º ciclo e jardins-de-infância? Na zona a que pertencem estes dois sindicatos, estas escolas são cerca de 7 400 e das listas constam cerca de 20. Será que se esqueceram de actualizar os nomes das básicas do 2º e 3º, ciclos, para agrupamentos e as votações são de todo o agrupamento e não da escola sede? Se assim for, o número de votantes é absolutamente ridículo. Caso contrário, o que é ridículo é o número de escolas com resultados tornados públicos. Vejamos os dois casos separadamente… O SPN lista cerca de 400 escolas, mas apenas 200 apresentam resultados. Porquê? A zona que o sindicato cobre tem mais de 4 600 escolas, nas quais leccionam mais de 53 mil docentes. A moção da Plataforma Sindical recolheu 6512 votos favoráveis. O SPGL exibe resultados de 213 escolas. Na zona que abrange, só as escolas com 3º ciclo e secundárias são 365. O número total de escolas desta zona ascende a mais de 3 600. A moção da Plataforma de Sindicatos recolheu 4708 votos favoráveis dos cerca de 47 mil docentes da região. Entretanto, a Fenprof, actualizou (no seu site) os resultados nacionais, reduzindo (de 80,8) para 77,2% o número de votos favoráveis à moção. Com base nos resultados tornados públicos pelos dois maiores sindicatos associados a esta federação, corrijo também a minha estimativa (anteriormente apresentada no “post” intitulado “tenham vergonha”). A moção da Plataforma terá (por extrapolação) obtido, a nível nacional, entre 14 e 18 mil votos favoráveis, de um universo de mais de mais de 145 mil docentes.
Apache, Abril de 2008

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Somos todos iguais, mas... (3)

O quadro contíguo evidencia o decréscimo das emissões, por parte dos E.U.A., dos seis principais poluentes atmosféricos. Contrariamente aos tão badalados mitos do “aquecimento global” e do “buraco do ozono” antropogénicos, a poluição tem (nos países mais pobres, que só nas últimas décadas do século XX despertaram para a Revolução Industrial) causado sérios problemas às populações. Parece no entanto que, à semelhança de tantos outros indicadores do nível de desenvolvimento, também no que se refere à poluição, somos todos iguais, mas alguns são mais iguais que outros. [Fonte: EPA (Agencia de Protecção Ambiental dos Estados Unidos)]
Apache, Abril de 2008

quinta-feira, 17 de abril de 2008

A pedrada no charco

O Professor comentava no “Público” de ontem (dia 16) os últimos desenvolvimentos da contenda que opõe os professores às políticas do Ministério da Educação. O texto, que subscrevo e transcrevo na íntegra, reza assim:
«Comecemos por uma questão semântica: entendimento e acordo são vocábulos sem diferenças, do ponto de vista da significação, que justifiquem o esforço da Plataforma Sindical para os distinguir. Vão a um bom dicionário. No contexto que "aproximou" sindicatos e ministério, são sinónimos. Mas se essa fosse a questão, então capitular dirimia o conflito. E não estou a ser irónico. Voltem a um bom dicionário.Posto isto, passemos ao que importa. Ministério e sindicatos acertaram, concertaram sob determinadas condições. No fim, os sindicatos cantaram vitória. Permitam-me que invoque alguns argumentos para desejar que os sindicatos não voltem a ter outra vitória como esta.A actuação política deste Governo e desta ministra produziu diplomas (estatuto de carreira, avaliação do desempenho, gestão das escolas e estatuto do aluno) que envergonham aquisições civilizacionais mínimas da nossa sociedade. A rede propagandística que montaram, procurou denegrir os professores por forma antes inimaginável. Cortar, vergar, fechar foram desígnios que os obcecaram. Reduziram salários e escravizaram com trabalho inútil. Burocratizaram criminosamente. Secaram o interior, fechando escolas aos milhares. Manipularam estatísticas. Abandalharam o ensino com a ânsia de diminuir o insucesso. Chamaram profissional a uma espécie de ensino cuja missão é reter na escola, a qualquer preço, os jovens que a abandonavam precocemente. Contrataram crianças para promover produtos inúteis. Aliciaram pais com a mistificação da escola a tempo inteiro (que sociedade é esta em que os pais não têm tempo para estar com os filhos? Em que crianças passam 39 horas por semana encerradas numa escola e se aponta como progresso reproduzir o esquema no secundário, mas elevando a fasquia para as 50 horas?). Foram desumanos com professores nas vascas da morte e usaram e deitaram fora milhares de professores doentes (depois de garantir no Parlamento que não o fariam). Promoveram a maior iniquidade de que guardo recordação com o deplorável concurso de titulares. Enganaram miseravelmente os jovens candidatos a professores e avacalharam as instituições de ensino superior com a prova de acesso à profissão. Perseguiram. Chamaram a polícia. Incitaram e premiaram a bufaria. Desrespeitaram impunemente a lei que eles próprios produziram. Driblaram as leis fundamentais do país. Com grande despudor político, passaram sem mossa por sucessivas condenações em tribunais. Fizeram da imposição norma e desrespeitaram continuadamente a negociação sindical. Reduziram a metade os gastos com a Educação, por referência ao PIB. No que era essencial, no que aumentaria a qualidade do ensino, não tocaram, a não ser, uma vez mais, para cortar e diminuir a exigência e castrar o que faz pensar e questionar.A questão que se põe é esta: por que razão, esta gente, que tanto mal tem feito ao país e à Escola, que odeia os professores, que espezinhou qualquer discussão ou concertação séria, que sempre permaneceu irredutível na sua arrogância de quero, posso e mando, de repente, decidiu "aproximar-se" dos sindicatos? A resposta é evidente: porque os 100.000 professores na rua, a 8 de Março, provocaram danos. Porque a campanha eleitoral começou a reparar os estragos para garantir mais quatro anos.O tempo e a oportunidade política da plataforma sindical aconselhavam uma firmeza que claudicou. Porque quem estava em posição de impor contemporizou. Porque de um dia para o outro se esqueceram as exigências da véspera. Porque quem demandou a lei em tribunal pactuou com uma farsa legal. Porque quem acusou de chantagem acabou a negociar com o chantagista. Porque quem teve nos braços uma unidade de professores nunca vista pensou pouco sobre os riscos de a pôr em causa.É verdade que os sindicatos ganharam uns trocos. Mas o lance não era para trocos. Era para devolução integral: da dignidade perdida.Aqui chegados, permitam-me a achega: pior que isto é não serem capazes de superar isto. E lembrem-se de Pirro, quando agradeceu a felicitação pela vitória: " Mais uma vitória como esta e estou perdido."» [Santana Castilho – Professor do Ensino Superior ]
Apache, Abril de 2008

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Tenham vergonha!

Comentando os documentos produzidos por dezenas de escolas, apelando à não assinatura, pela Plataforma Sindical, do Memorando de Entendimento com o Ministério da Educação, Mário Nogueira, dirigente da Fenprof afirmou: "Vozes de burro não chegam ao céu, por isso esperemos que não escoiceiem perto de nós." Convém lembrar o senhor sindicalista, que foi à plataforma que o ministério acenou com as cenouras!
Entretanto, no “site” da Fenprof foram publicados os alegados resultados (ainda provisórios) da votação, pelos professores, do Memorando de Entendimento. Terão votado favoravelmente 80,8% dos docentes, num universo de cerca de 50 mil, o que, a ser verdade, corresponde a cerca de 40 mil votos favoráveis. Ou seja, 105 mil docentes (mais de 72% da classe) não validaram o Memorando de Entendimento. Mais, como quem se baba publicamente por um punhado de cenouras não dá garantia de competência ao nível do cálculo elementar, exige-se a publicação dos resultados escola a escola.
Apache, Abril de 2008

O eco

Quinze de Abril era o dia do “Debate Nacional Sobre o Estado da Escola Pública”, de acordo como prospecto publicitário da “Plataforma Sindical dos Professores”. Digo, era, porque dado o golpe de teatro da madrugada do passado sábado, o que se discutiu, pelo menos aqui por estes lados, foi a aprovação ou não do “Memorando de Entendimento”, entre o Ministério da Educação e os sindicatos, na referida data. A posição das escolas foi assim comentada pela senhora ministra nestes termos: “No final da reunião [com a Comissão de Educação e Ciência], a ministra comentou ainda o «esmagador» apoio dado pelos professores consultados hoje ao entendimento alcançado entre Governo e sindicatos.” [Lusa] Por seu lado, o dirigente máximo da maior federação de sindicatos de professores, expressava assim a sua opinião: “Mário Nogueira, porta-voz da estrutura que reúne todos os sindicatos do sector, afirmou que «a esmagadora maioria das escolas aprovou de forma inequívoca» a moção que prevê a ratificação do entendimento estabelecido entre a plataforma e o Ministério da Educação (ME) no que diz respeito à avaliação de desempenho.” [Sol/Lusa] Este eco inesperado (ou talvez não) constitui para muitos professores uma poluição sonora quase insuportável. Com tanta coerência de discurso, penso que, desta vez, não haverá discrepância nos números. Assim, atrevo-me a lançar um desafio, ao ministério e/ou aos sindicatos: Os 145 122 docentes que leccionam nas escolas portuguesas têm o direito de saber quantos votaram favoravelmente a assinatura deste entendimento; tornem público esse número, ou tenham a dignidade de se calarem!
Apache, Abril de 2008

terça-feira, 15 de abril de 2008

"Aquecimento Global" ausente, em parte incerta

O gráfico acima, construído com dados fornecidos por satélite, mostra a variação das temperaturas na zona do globo compreendida entre as latitudes, 20º N e 20º S. O passado mês de Março foi o mês mais frio dos últimos 18 anos. A temperatura média daquela faixa (mais de 21% da superfície da Terra) ficou 0,5 ºC abaixo da média.
Apache, Abril de 2008

sábado, 12 de abril de 2008

Acordo? Entendimento? Com quem?

Na madrugada passada, após mais de sete horas de reunião (a terceira em quatro dias) o Ministério da Educação (ME) e a plataforma de sindicatos concordaram em que este ano, a avaliação dos docentes contratados se fizesse através do preenchimento da ficha de auto-avaliação proposta pelo ME, através da assiduidade e do cumprimento do serviço distribuído e participação em acções de formação. Ou seja, na prática, algo semelhante ao sistema de avaliação anterior, suspenso em Agosto de 2005 pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues. Mal a comunicação social deu nota do facto, sindicatos, governo e partidos políticos precipitaram-se num difuso jogo de palavras, falando uns em acordo e outros em entendimento, reivindicando vitórias e derrotas, como se, na essência, algo tivesse de facto mudado. A ministra cedeu na sua infinita teimosia e permite agora que os procedimentos de avaliação sejam iguais em todas as escolas. Grande cedência, o princípio da igualdade, a isso a obrigava. A única coisa que conseguiu, foi adiar para o próximo ano lectivo, uma multidão de processos de impugnação da avaliação nos tribunais administrativos. Quanto ao mais: Mantém-se a divisão da carreira em duas categorias (professor e professor titular); A recentemente declarada inconstitucionalidade do concurso para titulares está a caminho da gaveta do esquecimento; Não se vislumbra nenhuma vontade do ME em eliminar as várias ilegalidades contidas no Decreto Regulamentar que vai reger a avaliação do próximo ano; O (novo) Estatuto do Aluno não sofreu qualquer alteração; Também nada foi alterado na nova legislação sobre Necessidades Educativas Especiais; A Prova de Ingresso continua sem encontrar o caixote do lixo; E o Senhor Presidente da República acabou (ontem) de promulgar a novíssima legislação sobre gestão escolar que atropela a Lei de Bases do Sistema Educativo. Enquanto isso, sindicatos e tutela chegam a um acordo, perdão, a um entendimento sobre o diâmetro da malha da peneira com que pretendem tapar o sol. Não se incomodem, façam o favor de continuar com as palhaçadas, escusam é de contar com os professores.
Apache, Abril de 2008

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Carla Del Ponte puxa a ponta do novelo

A ex-procuradora do Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia, substituída no cargo, no início deste ano, pelo belga Serge Brammertz é agora a embaixadora Suíça na Argentina.
Apesar da menor visibilidade deste cargo, Carla não deixa o seu protagonismo por mãos alheias e (apesar de aconselhada pelo governo suíço, a não o fazer), prepara-se para publicar um livro autobiográfico, intitulado “The Hunt”, onde revela algumas das atrocidades praticadas pelos terroristas do Exército de Libertação do Kosovo, durante a guerra com os sérvios. Numa conferência de imprensa que gerou um enorme mau estar na cúpula política ocidental, a ex-procuradora anunciou que o livro revelaria provas do rapto de 300 sérvios, pelos guerrilheiros kosovares, no Verão de 1999, cujos órgãos foram vendidos pelos homens de Hashim Thaci (actual “Primeiro-Ministro” do Kosovo) a outros traficantes.
Finalmente, alguém com credibilidade internacional, começa a puxar a ponta do novelo…
Apache, Abril de 2008

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Entrevista a José Sócrates - Gato Fedorento

Vale sempre a pena rever um dos melhores momentos do “Gato Fedorento”… Ou será antes, a mais honesta entrevista dada pelo Primeiro-Ministro?

Apache, Abril de 2008

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Voltaram a não tomar as gotas…

O governo prepara um diploma que definirá as novas regras de trabalho na função pública. O documento prevê uma aproximação do regime de trabalho na função pública ao Código do Trabalho e deverá vigorar a partir do segundo semestre do ano, depois de concluídas as negociações com os sindicatos. As principais alterações propostas são: Perda do vínculo laboral. Apenas mantêm o actual vínculo de nomeação definitiva, os militares, as forças de investigação criminal e de segurança, e o pessoal diplomático; Passará a ser possível trabalhar até 50 horas semanais; Por acordo com o empregador, passará também a poder-se trabalhar durante seis horas consecutivas e a hora de almoço pode ser reduzida ou mesmo abolida.
Comentário: Não percebo como é que havendo trabalhadores a mais na função pública (mentira sistematicamente repetida por vários membros do governo e não só), se vem agora tentar aumentar o número de horas de trabalho dos funcionários.
Apache, Abril de 2008

domingo, 6 de abril de 2008

O "eduquês" e o "legislês"

«Para quem se interroga sobre o verdadeiro conceito de "eduquês", aqui está um belo paradigma. O "eduquês" é a linguagem do sistema, entendido este como um pacto entre elites dominantes de académicos que abominam ensinar, de políticos incompetentes e burocratas de serviço.
Os acontecimentos da Carolina Michaëlis, a dar fé à imprensa, chocaram também Cavaco Silva, que resolveu convocar o procurador-geral da República. Foi a última iniciativa de uma série que "judicializou" um acontecimento lamentável (a vários títulos, que não só o do comportamento da aluna e colegas), mas que é de natureza estritamente disciplinar e escolar. Pena foi que o Presidente da República não se tenha chocado mais cedo com tantas iniciativas que, por acção ou omissão, promoveu e que ajudaram a robustecer o sistema. Por todas, e como mero exemplo, lembro esse monumento ao "eduquês" (Lei nº 23/2006, de 23 de Junho), que promulgou sem pestanejar. Segundo tal diploma legal, e cito o que na altura escrevi, um grupo de jovens de seis anos de idade, seis, pode constituir-se em associação de estudantes. Se o fizer, tem direito a apoio financeiro, técnico, formativo e logístico por parte do Estado. Tem direito a tempo de antena no serviço público de rádio e de televisão. O Estado deverá remeter a esse grupo de jovens todos os projectos de actos legislativos que se refiram à definição, planeamento e financiamento do sistema educativo, à gestão das escolas, ao acesso ao ensino superior, à acção social escolar e aos planos de estudos, reestruturação e criação de novos agrupamentos e áreas curriculares ou disciplinas, para que eles emitam sobre o mesmo o seu parecer. Para além da audição obrigatória por parte do Estado, como referido, estes jovens de seis anos ainda têm o direito de ser consultados pelos órgãos de gestão das escolas que frequentem, quanto às seguintes matérias: projecto educativo da escola; regulamentos internos; planos de actividades e orçamento; projectos de combate ao insucesso escolar; avaliação; acção social escolar; organização de actividades de complemento curricular e do desporto escolar.»
Santana Castilho - Professor Universitário

sábado, 5 de abril de 2008

Ministra da Educação volta a mentir descaradamente

«A ministra da Educação garantiu hoje que "não há uma única escola" que tenha pedido a suspensão da avaliação dos professores, e acrescentou que o processo "corre com tranquilidade" em todos os estabelecimentos de ensino. "Não há uma única escola que tenha pedido a suspensão", afirmou Maria de Lurdes Rodrigues, à margem da inauguração das obras de remodelação e ampliação de uma escola do 1º ciclo na freguesia de Chafé, concelho de Viana do Castelo.» [Fonte: Lusa] Há apenas uma hipótese destas declarações não serem uma rotunda mentira. Essa hipótese é a senhora ministra desconhecer totalmente o que se passa nas escolas, isto é, não ler jornais, não ver televisão, não ler a correspondência que chega ao seu ministério, não receber informações dos seus assessores e ir para as reuniões com os Conselhos Executivos com tampões nos ouvidos. Como sou pouco crédulo na verificação simultânea de todos estes pressupostos, tenho de admitir que há uma ligeira probabilidade da senhora ter mentido uma vez mais. E para ilustrar a minha afirmação, no “Público” de hoje, lê-se… «Os professores da Escola Secundária da Gafanha da Nazaré, no concelho de Ílhavo, assumiram – numa moção que irá, agora, ser remetida ao governo – “inibir-se, durante o presente ano lectivo, de contribuir para a elaboração de quaisquer documentos que visem alcançar a execução de procedimentos no âmbito da avaliação” dos docentes. Esta tomada de posição vem juntar-se a outras 45 deliberações idênticas, devidamente formalizadas em documentos escritos, dados a conhecer à Fenprof» Poder-se-ia dar o caso de o “Público” ter inventado esta notícia só para aborrecer a senhora ministra, admito que algum jornalista se pudesse sentir tentado a fazê-lo. Só que tal seria desnecessário. Por mais que este se esforçasse, jamais conseguiria obter, nesse acto, sucesso idêntico ao da própria realidade. Uma vez mais, a título ilustrativo, deixo uma pequena parte do texto aprovado na Escola Secundária de São Pedro e tornado público recentemente… “(…) o Modelo de Avaliação do Desempenho estatuído no Decreto Regulamentar nº 2/2008 não assegura a justiça e o rigor de que os professores e as escolas são devedores, nem protege, necessariamente, a valorização dos melhores desempenhos, de que a pseudo-avaliação, que o Ministério da Educação arquitectou no primeiro Concurso de Acesso a Professor Titular, foi um exemplo paradigmático." [Segue-se uma longa e fundamentada exposição da decisão] "(…) As razões em que ancoramos a nossa decisão de suspensão da aplicação do novo Modelo de Avaliação do Desempenho, são, igualmente, extensivas à aplicação do mesmo aos professores contratados, pelo que defendemos que os professores a que se refere a Circular nº B080002111G sejam enquadrados, para efeito de avaliação, na legislação anterior à publicação do Decreto Regulamentar nº 2/2008. Enquanto as limitações, as arbitrariedades e as injustiças aqui expostas não forem corrigidas, os professores da Escola Secundária de S. Pedro, abaixo assinados, suspendem a sua participação em toda e qualquer iniciativa relacionada com a avaliação do desempenho à luz do novo Modelo de Avaliação do Desempenho.” Reafirmo assim, que, ou a senhora ministra mente compulsivamente, ou desconhece totalmente a realidade das escolas. Em qualquer dos casos, a demissão seria a única saída digna.
Apache, Abril de 2008

sexta-feira, 4 de abril de 2008

A alínea c), do número 5, do artigo 15º do Estatuto da Carreira Docente é inconstitucional!

No Acórdão nº 184/2008, do Tribunal Constitucional, datado de 12 de Março de 2008, lê-se, no capítulo “III – Decisão”, o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: (…) c) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no artigo, 15º nº 5, alínea c) do referido Decreto-Lei nº 15/2007, por violação do nº 2 do artigo 47º da Constituição.” Recordo o disposto no texto do Estatuto agora declarado inconstitucional, referente ao concurso para Professores Titulares. “Apenas podem ser opositores aos concursos referidos no nº 1 os docentes integrados na carreira que preencham, cumulativamente, os seguintes requisitos: (…) Não estejam na situação de dispensa total ou parcial da componente lectiva;” Que fará agora o Ministério da Educação? Anulará o concurso? Assobiará para o ar como tem feito com outros atropelos à lei? Deixo aqui o texto integral do Acórdão, destacando a excelência do discurso argumentativo do Meritíssimo Juiz Mário José de Araújo Torres, na sua declaração de voto de vencido, na questão das quotas para as classificações de “Muito Bom” e “Excelente”, em sentido contrário ao texto difuso e quase desprovido de conteúdo, que fundamenta a decisão maioritária.
Apache, Abril de 2008

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Do Estatuto do Aluno...

A propósito do novo Estatuto do Aluno (Lei nº 3/2008 de 18 de Janeiro), António Barreto escrevia assim, no “Público” do passado domingo… «Os direitos dos alunos, consagrados no respectivo estatuto, são os mais abrangentes e absurdos que se possa imaginar (…) A sua última versão entrou em vigor em finais de Janeiro, sendo uma correcção de outro diploma, da mesma natureza, de 2002. Trata-se de uma espécie de carta constitucional de direitos e deveres, a que não falta um regulamento disciplinar. Não se pode dizer que fecha a abóbada do edifício legal educativo, porque simplesmente tal edifício não existe. É mais um produto da enxurrada permanente de leis, normas e regras que se abate sobre as escolas e a sociedade. É um dos mais monstruosos documentos jamais produzidos pela administração pública portuguesa. (…)
Trata-se de um estatuto burocrático, processual e confuso. O regime de faltas, que decreta, é infernal. Ninguém, normalmente constituído, o pode perceber ou aplicar. Os alunos que ultrapassem o número de faltas permitido podem recuperar tudo com uma prova. As faltas justificadas podem passar a injustificadas e vice-versa. As decisões sobre as faltas dos alunos e o seu comportamento sobem e descem do professor ao director de turma, deste ao conselho de turma, destes à direcção da escola e eventualmente ao conselho pedagógico. As decisões disciplinares são longas, morosas e processualmente complicadas, podendo sempre ser alteradas pelos sistemas de recurso ou de vaivém entre instâncias escolares. Concebem-se duas espécies de medidas disciplinares, as "correctivas" e as "sancionatórias". Por vezes, as diferenças são imperceptíveis. Mas a sua aplicação, em respeito pelas normas processuais, torna inútil qualquer esforço. As medidas disciplinares são quase todas precedidas ou acompanhadas de processos complicados, verdadeiros dissuasores de todo o esforço disciplinar. As medidas disciplinares dependem de várias instâncias, do professor aos órgãos da turma, destes aos vários órgãos da escola e desta às direcções regionais. Os procedimentos disciplinares são relativos ao que tradicionalmente se designa por mau comportamento, perturbação de aula, agressão, roubo ou destruição de material, isto é, o dia-a-dia na escola. Mas a sua sanção é de tal modo complexa que deixará simplesmente de haver disciplina ou sanção. O estatuto cria um regime disciplinar em tudo semelhante ao que vigora, por exemplo, para a administração pública ou para as relações entre administração e cidadãos. Pior ainda, é criado um regime disciplinar e sancionatório decalcado sobre os sistemas e os processos judiciais. Os autores deste estatuto revelam uma total e absoluta ignorância do que se passa nas escolas, do que são as escolas. Oscilando entre a burocracia, a teoria integradora das ciências de educação, a ideia de que existe uma democracia na sala de aula e a convicção de que a disciplina é um mal, os legisladores do ministério (deste ministério e dos anteriores) produziram uma monstruosidade: senil na concepção burocrática, administrativa e judicial; adolescente na ideologia; infantil na ambição. O estatuto não é a causa dos males educativos, até porque nem sequer está em vigor na maior parte das escolas. Também não é por causa do estatuto que há, ou não há, pancadaria nas escolas. O estatuto é a consequência de uma longa caminhada e será, de futuro, o responsável imediato pela impossibilidade de administrar a disciplina nas escolas. O estatuto não retira a autoridade na escola (aos professores, aos directores, aos conselhos escolares). Não! Apenas confirma o facto de já não a terem e de assim perderem as veleidades de a voltar a ter. O processo educativo, essencialmente humano e pessoal, é transformado num processo "científico", "técnico", desumanizado, burocrático e administrativo que dissolve a autoridade e esbate as responsabilidades. Se for lido com atenção, este estatuto revela que a sua principal inspiração é a desconfiança dos professores. Quem fez este estatuto tinha uma única ideia na cabeça: é preciso defender os alunos dos professores que os podem agredir e oprimir. Mesmo que nada resolva, a sua revogação é um gesto de saúde mental pública.»
Apache, Abril de 2008