quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Mais um Tsunami

"Os governantes da mais sul-americana das repúblicas europeias não têm definitivamente vergonha. Desta vez, resolveram ressuscitar o cadáver de Goebbels para, mais uma vez, tentarem manipular as consciências de um povo que tomam por embrutecido. Mas tanto? É bem possível. Lembrem-se que falamos de pessoas que viram em manifestações públicas tão esmagadoras e reveladoras como foram as nossas, alegres piqueniques de gente parva e ociosa. Enganam-se. A política do «uma mentira mil vezes repetida é uma verdade», que fez a fama e o proveito do Ministro da Propaganda do regime de Hitler, a que, no dia de hoje, recorreram, ainda em nome do Socialismo, os medíocres e pouco imaginativos burocratas do Ministério da Educação, é apenas mais um pequeno acto suicida com pré-aviso. Chamaram gota de água ao tsunami que os vai afogar e não sabem que se dirigem para as ondas. A verdade é que com tanta reviravolta já nem sabem para onde vão. Estão tontos, coitados... Pelo meu lado nem preciso de argumentar. Quando se pretende descredibilizar a maior greve de sempre de um grupo profissional, afirmando que as escolas estão abertas e a funcionar, esquecendo-se sibilinamente de referir, que estão vazias, já não é apenas má-fé ou inépcia política. É o desnorte absoluto dos que se já sentem a prazo. Dos que sabem que a guia de despedimento vai a caminho assinada por todos os professores deste país. Coisa rara, esta foi sem dúvida a verdadeira reforma que este governo introduziu na classe: Uniu-os na defesa da escola pública e na luta por um estatuto que corresponda à importância que a sociedade atribui à função docente. Nem mais, nem menos. Que este vai ser um processo longo e desgastante já o sabíamos. Até porque o que está verdadeiramente em causa não é nem nunca foi a questão da avaliação. O modelo proposto pelo Ministério é tão desadequado e absurdo que se tornou numa anedota nacional. Já ninguém defende aquela que era a pérola do novo estatuto. A menina dos olhos dos nossos governantes. Por isso o deixaram cair a troco de nada. Nunca o conseguiriam impor e muito menos aplicar. Depois da vitória de hoje, é tempo de sermos claros. Porque todos sabemos que nesta luta o que importa são outras coisas. É a politica educativa, é o futuro da escola pública, é a tentativa de institucionalizar um sistema de castas numa carreira que sempre foi única, porque únicas e cooperativas são as funções que desempenhamos. São as quotas... é no fundo tudo aquilo que consideramos ser injusto, depreciativo e insultuoso. Podem confirmar que está tudo no Estatuto. Agora mais que nunca é preciso não desistir. Nem mesmo relaxar. A próxima luta será sempre a mais importante. Encarem-na como um bom e seguro investimento. Bem melhor que jogar na Bolsa..."
Nelson Costa, no blogue “Historiar N”

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Até o “Magalhães” aderiu!

Cumpriu-se hoje a mais participada greve de um sector profissional. Em protesto pelo modelo de avaliação que o Ministério da Educação (ME) quer impor, mas acima de tudo, contra as políticas implementadas nos últimos anos e que visam reduzir ainda mais a já fraca qualidade da escola pública, os professores concretizaram hoje a greve com maior percentagem de adesão da história da democracia portuguesa. Ao final da tarde, o senhor Secretário de Estado, Valter Lemos, anunciou os números do ministério, 61%, de adesão, em oposição aos 95% anunciados pela Plataforma de Sindicatos. Obviamente, à semelhança do que sempre acontecera, ninguém esperava que fosse desta que os números coincidissem, no entanto, os valores apresentados pelo ME não deixam de surpreender. Vejamos: se a adesão escola a escola variou entre os 70 e os 100%, para que Valter Lemos tenha chegado a uma média de 61% só há uma explicação: os portáteis “Magalhães” solidarizaram-se com a greve dos docentes e o senhor Secretário de Estado fez as contas de cabeça.
Apache, Dezembro de 2008

Importam-se de repetir?… (6)

Começou no passado dia 1 e decorrerá até ao próximo dia 14, em Poznan, na Polónia, mais uma cimeira da ONU sobre “Alterações Climáticas”. Logo no dia de abertura, entre muitos disparates proferidos pelos vários oradores, destacam-se três afirmações que poderiam espelhar a falta de honestidade e de moralidade de quem as proferiu, mas que provavelmente foram pronunciadas apenas com o intuito de nos fazer rir. Stephen Schneider - é professor de Ciências Biológicas na Universidade de Stanford e um dos principais autores dos relatórios do IPCC. “Temos que oferecer [à opinião pública] cenários assustadores, fazer simplificações, dramatizar os depoimentos e fazer a mínima referência possível a quaisquer dúvidas.” Aqui está alguém que deveria deixar as ciências e dedicar-se ao estudo da literatura, recomendo pós-graduações em tragédias e dramas gregos. Paul Watson - foi co-fundador da Greenpeace, de onde acabou por ser expulso, fundando depois a Sea Shepherd. “A verdade não importa, o que é importante é aquilo que as pessoas pensam ser a verdade.” Mais um a candidatar-se a assessor do Zé. Apesar da provecta idade, o rapazinho faz-se. Robert Eduard Turner (Ted Turner) - é um dos homens mais ricos dos Estados Unidos, ficou conhecido por ter fundado a CNN e posteriormente por ter sido casado com a actriz Jane Fonda. “Uma população total de 250 a 300 milhões de pessoas [no planeta], a que corresponde uma redução de 95% face à actual, seria o ideal.” Arnold cuida-te. Este é que é o Exterminador…
Apache, Dezembro de 2008

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

"Sócrates e a Liberdade" - António Barreto

“Em consequência da revolução de 1974, criou raízes entre nós a ideia de que qualquer forma de autoridade era fascista. Nem mais, nem menos. Um professor na escola exigia silêncio e cumprimento dos deveres? Fascista! Um engenheiro dava instruções precisas aos trabalhadores no estaleiro? Fascista! Um médico determinava procedimentos específicos no bloco operatório? Fascista! Até os pais que exerciam as suas funções educativas em casa eram tratados de fascistas.
Pode parecer caricatura, mas essas tontices tiveram uma vida longa e inspiraram decisões, legislação e comportamentos públicos. Durante anos, sob a designação de diálogo democrático, a hesitação e o adiamento foram sendo cultivados, enquanto a autoridade ia sendo posta em causa. Na escola, muito especialmente, a autoridade do professor foi quase totalmente destruída.
Em traço grosso, esta moda tinha como princípio a liberdade. Os denunciadores dos 'fascistas' faziam-no por causa da liberdade. Os demolidores da autoridade agiam em nome da liberdade. Sabemos que isso era aparência: muitos condenavam a autoridade dos outros, nunca a sua própria; ou defendiam a sua liberdade, jamais a dos outros. Mas enfim, a liberdade foi o santo e a senha da nova sociedade e das novas culturas. Como é costume com os excessos, toda a gente deixou de prestar atenção aos que, uma vez por outra, apareciam a defender a liberdade ou a denunciar formas abusivas de autoridade. A tal ponto que os candidatos a déspota começaram a sentir que era fácil atentar, aqui e ali, contra a liberdade: a capacidade de reacção da população estava no mais baixo.
Por isso sinto incómodo em vir discutir, em 2008, a questão da liberdade. Mas a verdade é que os últimos tempos têm revelado factos e tendências já mais do que simplesmente preocupantes. As causas desta evolução estão, umas, na vida internacional, outras na Europa, mas a maior parte residem no nosso país. Foram tomadas medidas e decisões que limitam injustificadamente a liberdade dos indivíduos. A expressão de opiniões e de crenças está hoje mais limitada do que há dez anos. A vigilância do Estado sobre os cidadãos é colossal e reforça-se. A acumulação, nas mãos do Estado, de informações sobre as pessoas e a vida privada cresce e organiza-se. O registo e o exame dos telefonemas, da correspondência e da navegação na Internet são legais e ilimitados. Por causa do fisco, do controlo pessoal e das despesas com a saúde, condiciona-se a vida de toda a população e tornam-se obrigatórios padrões de comportamento individual.
O catálogo é enorme. De fora, chegam ameaças sem conta e que reduzem efectivamente as liberdades e os direitos dos indivíduos. A Al Qaeda, por exemplo, acaba de condicionar a vida de parte do continente africano, de uma organização europeia, de milhares de desportistas e de centenas de milhares de adeptos. Por causa das regulações do tráfego aéreo, as viagens de avião transformaram-se em rituais de humilhação e desconforto atentatórios da dignidade humana. Da União Europeia chegam, todos os dias, centenas de páginas de novas regulações e directivas que, sob a capa das melhores intenções do mundo, interferem com a vida privada e limitam as liberdades. Também da Europa nos veio esta extraordinária conspiração dos governos com o fim de evitar os referendos nacionais ao novo tratado da União.
Mas nem é preciso ir lá fora. A vida portuguesa oferece exemplos todos os dias. A nova lei de controlo do tráfego telefónico permite escutar e guardar os dados técnicos (origem e destino) de todos os telefonemas durante pelo menos um ano. Os novos modelos de bilhete de identidade e de carta de condução, com acumulação de dados pessoais e registos históricos, são meios intrusivos. A videovigilância, sem limites de situações, de espaços e de tempo, é um claro abuso. A repressão e as represálias exercidas sobre funcionários são já publicamente conhecidas e geralmente temidas A politização dos serviços de informação e a sua dependência directa da Presidência do Conselho de Ministros revela as intenções e os apetites do Primeiro-ministro. A interdição de partidos com menos de 5.000 militantes inscritos e a necessidade de os partidos enviarem ao Estado a lista nominal dos seus membros é um acto de prepotência.
A pesada mão do governo agiu na Caixa Geral de Depósitos e no Banco Comercial Português com intuitos evidentes de submeter essas empresas e de, através delas, condicionar os capitalistas, obrigando-os a gestos amistosos. A retirada dos nomes dos santos de centenas de escolas (e quem sabe se também, depois, de instituições, cidades e localidades) é um acto ridículo de fundamentalismo intolerante. As interferências do governo nos serviçosde rádio e televisão, públicos ou privados, assim como na 'comunicação social' em geral, sucedem-se. A legislação sobre a segurança alimentar e a actuação da ASAE ultrapassaram todos os limites imagináveis da decência e do respeito pelas pessoas. A lei contra o tabaco está destituída de qualquer equilíbrio e reduz a liberdade.
Não sei se Sócrates é fascista. Não me parece, mas, sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu governo. O Primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas. Temos de reconhecer: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo...”
[Um texto com quase um ano, mas de uma actualidade irritante. O destaque é meu.]
António Barreto, no jornal "Público" de 6 de Janeiro de 2008

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Portugal sobe no ranking

Desiludam-se os que acham que na União Europeia (UE), Portugal ocupa sempre os últimos lugares comparativamente aos seus parceiros. Em 2008 ocupávamos o 4º lugar e com as alterações propostas pelo governo liderado por José Sócrates, no próximo ano alcançaremos a 3ª posição. Acredito que se confiarmos no personagem alcançaremos brevemente o primeiro lugar, neste e provavelmente noutros rankings. Agora, dava jeito acabar por aqui o texto e ficava o estimado leitor (sim, estou a admitir que alguém vai ler isto) satisfeito da vida. Lamento desiludi-lo logo em época natalícia, mas se acreditava nisso, é preferível focalizar a sua confiança no Pai Natal… O comparativo a que me refiro reporta-se à tributação de automóveis ligeiros, novos. Coma as alterações previstas no Orçamento de Estado para 2009, o governo agravará (em média) em 11% (segundo cálculos do Automóvel Clube de Portugal) o Imposto Sobre Veículos (ISV). Todos os outros países da união vão manter ou baixar idêntica tributação. Assim, Portugal subirá de 4º para 3º lugar, nos países da UE com maior tributação automóvel. Muitos países justificaram a manutenção ou o desagravamento do imposto sobre veículos novos, como um incentivo à renovação do parque visando a redução da sinistralidade e simultaneamente, um incentivo à indústria automóvel em particular e à economia em geral. Na UE há actualmente 9 países que não cobram o imposto sobre veículos, aplicando apenas o IVA. São eles: Alemanha, Inglaterra, Luxemburgo, República Checa, Bulgária, Eslováquia, Estónia, Letónia e Lituânia. Por comparação (por exemplo) com os nossos vizinhos espanhóis, os automobilistas portugueses, devido aos exorbitantes impostos, pagam muito mais pelos veículos e pelos combustíveis. Acresce à desigualdade, o facto de a rede viária espanhola ser de qualidade superior à nossa e gratuita na maioria do território. Acrescente-se ainda o facto de os salários, aq1ui ao lado, serem substancialmente mais elevados. Em 2009, por cada automóvel novo, de passageiros, 61% do que pagarmos entrará para os cofres do Estado. Uma fatia deste enorme bolo, de forma ilegal, pois continuar-se-á a cobrar IVA, não apenas sobre o preço do veículo, mas também sobre o ISV, no que constitui uma dupla tributação, pela qual a Dinamarca já foi condenada no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Não satisfeito com este parasitismo, o governo propõem-se ainda a reduzir o incentivo ao abate de veículos com mais de 10 anos, do qual passarão a beneficiar apenas os automobilistas que adquiram veículos novos que emitam menos de 140 grama de dióxido de carbono, por quilómetro. Tal medida fará com que muitos veículos antigos e bastante poluentes acabem vendidos a baixo preço a pessoas de parcos recursos económicos, em vez de serem abatidos. É que apenas 25% das mais de 3800 versões de ligeiros de passageiros à venda em Portugal apresentam emissões de CO2 tão baixas e, a maioria, são carros a gasóleo, portanto, com preços de venda mais elevados, que constituem mau investimento para a esmagadora maioria da população. Repito aqui a metáfora, é Sócrates quem marcha bem, o resto da Europa leva o passo trocado.
Apache, Dezembro de 2008

domingo, 30 de novembro de 2008

"Os professores" - Vasco Pulido Valente

“O que é um bom professor? Antes de responder, dois pontos. Primeiro, não há, ou só há por milagre, bons professores numa escola má. Segundo, não há bons professores, sem alunos bons: mais precisamente sem alunos com o interesse e a determinação de estudar. Uma boa escola implica uma cultura específica, um espírito colectivo, fins de uma cristalina clareza e o respeito geral da comunidade. Um amontoado de professores (por muito qualificados que sejam) e um amontoado de alunos, que se limitam a cumprir contrariadamente uma formalidade obrigatória, perante a indiferença da comunidade, não passam de um «ersatz» da verdadeira coisa. O sistema de ensino em Portugal é em grande parte um «ersatz», em que a “avaliação” de professores não faz qualquer espécie de sentido e vai inevitavelmente resvalar para a injustiça e o abuso.
Dito isto, um bom professor, como sabe qualquer pessoa educada (hoje uma raridade zoológica), é o professor capaz de transmitir a paixão de aprender. Não é o professor “popular” ou o que “explica bem”. E não é, com certeza, o professor “dinâmico” que “melhora as notas” e diminui as “taxas de abandono”, com que a sra. ministra sonha. A elevadíssima ambição de apresentar à “Europa” e ao governo “estatísticas” menos miseráveis nunca serviu de critério pedagógico. Mas basta olhar o modelo oficial das “provas” de “avaliação” para se perceber que serve agora de único critério pedagógico.
Manifestamente a sra. ministra decidiu pôr os professores a trabalhar para os números. Para os números dela.
Não vale a pena examinar a “avaliação” que se prepara. Da desordem disciplinar ao vexame de um “polícia” na aula; da vigilância dos “faltosos” (completamente inútil) a actividades extracurriculares (que ninguém pediu e de que ninguém gosta); da “meta” dos “resultados” (que nada significa e é falsificável) à obrigação grotesca de estabelecer, para cada “objectivo” burocrático, um “objectivo estratégico”, um “objectivo táctico” e um “objectivo operacional” — a insensatez não pára, E provavelmente não irá parar. A sra. ministra não é deste mundo. E ouve vozes.
Perante a balbúrdia e os protestos, que provocou, continua convencida da sua razão. Quanto ao governo e ao PS já descobriram o culpado — como de costume, o PC — e também querem “estatísticas” que não envergonhem a Pátria. O ensino não conta.”
Vasco Pulido Valente, no Público de 15/11

sábado, 29 de novembro de 2008

Da inutilidade...

Como já tinha referido aqui, o governo, em mais um acto burlesco, (a mais vincada das suas virtudes executivas) alterou a legislação referente à avaliação dos professores através de um artigo que incluiu (disfarçadamente) no interior (artigo 138º) do texto do Orçamento de Estado (OE) para 2009. Através da alteração, pretende o executivo, dispensar a publicação em Diário da República da delegação de competências dos avaliadores, contornando assim o disposto no Código do Procedimento Administrativo (CPA). É óbvio, que o governo não gosta do CPA. Já perdi a conta ao número de vezes que o Ministério da Educação (ME) publicou diplomas legais que o violam. Imagino o que se passará no conjunto dos ministérios. Mas o que é verdadeiramente hilariante neste acto, não é o desprezo pelas leis (esse será antes preocupante), mas o facto de ter sido usado o OE, para alterar um diploma que nada tem a ver com os assuntos abordados no OE (no caso, o número 6 do artigo 12º do Decreto Regulamentar nº 2/2008). Felizmente, quando aquelas cabecinhas pensaram em varrer o CPA para debaixo da carpete, o texto do OE estava ali à mão, caso contrário, a alteração citada corria o risco de aparecer legislada, num canto qualquer de um velho jornal desportivo, na lista de compras da funcionária que limpa o gabinete da senhora ministra, ou num pedaço de papel da toalha de mesa duma qualquer tasquinha para os lados da 5 de Outubro. Mas, não contentes com o ridículo, foram ainda mais longe. A maioria socialista na Assembleia da República poderia ter (facilmente) expurgado do CPA, o texto que tanto parecia incomodar os personagens do ME (no caso, o nº 2 do artigo 37º), mas isso seria lógico demais. Preferiram publicar em OE uma alteração ao citado decreto regulamentar, para que este pudesse dispensar a obrigatoriedade prevista no CPA. No entanto, o CPA não prevê (excepto na administração local) qualquer ressalva (passo a citar: “Os actos de delegação e subdelegação de poderes estão sujeitos a publicação no Diário da República”) pelo que o decreto passa a conter mais uma ilegalidade. Resumindo… O governo faz constar (salvo melhor opinião) ilegalmente em OE uma alteração a um decreto regulamentar, para que este passe a conter outra ilegalidade, violando diploma hierarquicamente superior. E como muitas vezes, a tradição ainda é o que era, este ‘bolo’ também tem direito a cereja. Justificando o risível artigo do OE, Augusto Santos Silva afirmou que havia necessidade de ultrapassar um “formalismo inútil”. Se se referia ao referenciado nº 2 do artigo 37º do CPA, será que só viram necessidade de o ultrapassar neste caso? Se se refere ao CPA no seu todo, então, Santos Silva acha que “a lei é para cumprir” (Lurdes Rodrigues dixit) quando nela não encontramos nenhum “formalismo inútil”?! Se assim for, eis mais um motivo para se exigir a suspensão desta avaliação docente, cujo modelo é mero formalismo inútil.
Apache, Novembro de 2008

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Prós e contras (professores versus ME)

Um debate bem mais interessante que o habitual, desta vez estavam presentes os dois lados do “conflito”, apesar de a balança pender (como convinha, que a tradição ainda é o que era) para o lado oficial. Um balanço telegráfico…
Armandina Soares, a Presidente do Conselho Executivo (PCE) de Vialonga e Inês de Castro, a PCE do Agrupamento do Monte de Caparica, julgam-se perseguidas por cento e muitos mil docentes… Calma meninas, quem vos persegue é tão só a vossa consciência!
Albino Almeida, o Super-Pai: “o processo [de avaliação] está parado.” Ups… Tiro no porta-aviões.
Fátima Campos Ferreira: “Sem quotas não há mérito.” A moderadora (loura) a fazer um striptease intelectual. Mandem os petizes para a cama…
Maria do Rosário Gama, a PCE da "melhor" escola pública, mostrou-se calma mas incisiva. Muito boa a metáfora do soldado, 140 mil professores marcham com um passo, o Ministério da Educação com outro e a ministra acha que tem o passo certo. Muito boa também, a afirmação de que a sua escola (primeira pública nos rankings) foi avaliada com “Bom” (uma nota a meio da escala) pela Inspecção Geral da Educação. Cada um que tire daí as ilações que entender.
Mário Nogueira esteve bem, na generalidade, mas deixou-se provocar pelo Secretário de Estado.
Maria do Céu Roldão era o papagaio de serviço. A senhora doutora em ciências ocultas, perdão, ciências da educação, era a ‘pedaboba’, quero dizer, pedagoga, de serviço. O seu currículo indesejável, lá estou eu outra vez, invejável, isso sim, fala por si. O que deveria ser suficiente para a manter calada, mas… Pelos livros que publicou e pelas aulas de doutoramento que leccionou na área do desenvolvimento curricular, é uma das principais responsáveis pelo estado lastimável a que isto chegou. A senhora não é deste mundo.
O Senhor Secretário de Estado… Who?... Sorry, i don’t speak Portuguese.
Apache, Novembro de 2008

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

"Será?" - Pedro Abrunhosa

"Será que ainda me resta tempo contigo,
ou já te levam balas de um qualquer inimigo.
Será que soube dar-te tudo o que querias,
ou deixei-me morrer lento, no lento morrer dos dias.
Será que fiz tudo o que podia fazer,
ou fui mais um cobarde, não quis ver sofrer.
Será que lá longe ainda o céu é azul,
ou já o negro cinzento confunde o Norte com o Sul.
Será que a tua pele ainda é macia,
ou é a mão que me treme, sem ardor nem magia.
Será que ainda te posso valer,
ou já a noite descobre a dor que encobre o prazer.
Será que é de febre este fogo,
este grito cruel que da lebre faz lobo.
Será que amanhã ainda existe para ti,
ou ao ver-te nos olhos te beijei e morri.
Será que lá fora os carros passam ainda,
ou estrelas caíram e qualquer sorte é bem-vinda.
Será que a cidade ainda está como dantes,
ou cantam fantasmas e bailam gigantes.
Será que o sol se põe do lado do mar,
ou a luz que me agarra é sombra de luar.
Será que as casas cantam?, e as pedras do chão?,
ou calou-se a montanha, rendeu-se o vulcão.
Será que sabes que hoje é domingo,
ou os dias não passam, são anjos caindo.
Será que me consegues ouvir,
ou é tempo que pedes, quando tentas sorrir.
Será que sabes que te trago na voz,
que o teu mundo é o meu mundo e foi feito por nós.
Será que te lembras da cor do olhar,
quando juntos, a noite, não quer acabar.
Será que sentes esta mão que te agarra,
que te prende com a força do mar contra a barra.
Será que consegues ouvir-me dizer,
que te amo, tanto quanto, noutro dia qualquer.
Eu sei que tu estarás sempre por mim,
não há noite sem dia, nem dia sem fim.
Eu sei que me queres, e me amas também
me desejas agora como nunca ninguém.
Não partas então, não me deixes sozinho…
Vou beijar o teu chão e chorar o caminho.
Será?…"
[Talvez o melhor poema de] Pedro Abrunhosa

domingo, 23 de novembro de 2008

Confiança e conforto

[No "Sol" de ontem]
Apache, Novembro de 2008

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Da eficácia do ovo…

No passado dia 16, na sequência dos incidentes de Fafe e de Lisboa, onde grupos de alunos lançaram ovos contra as viaturas onde se deslocavam, respectivamente a ministra da educação e, os seus secretários de estado, Maria de Lurdes Rodrigues assinou um despacho (sim, eu sei que era domingo) que alegadamente clarifica o Estatuto do Aluno (Lei nº 3/2008 de 18 de Janeiro), mais concretamente o seu artigo 22º. Digo alegadamente, porque são evidentes as contradições entre ambos, aliás o teor do despacho emanado do gabinete da senhora ministra (que ainda aguarda publicação em Diário da República) é uma espécie de 2 em 1, pois apesar do seu reduzido conteúdo colide, não só com o citado diploma mas também com o Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de Abril, senão vejamos:
[Cliquem na imagem para ampliar]
Que o disposto no artigo 22º da Lei nº 3/2008 não é moralmente aceitável, estamos (provavelmente) todos de acordo (desde que ela foi publicada que os professores alertaram para a necessidade de alteração desta lei), aliás, não estou seguro que ele não viole a Constituição da República, concretamente o número 1 do artigo 64º (“Todos têm direito à protecção da saúde (…)”), mas daí até a senhora ministra alterar (sob a capa da clarificação), por despacho, uma Lei oriunda da Assembleia da República sem que para isso tivesse obtido autorização legislativa parece-me, no mínimo, abusivo. E agora, quem é que vai explicar à senhora ministra que este despacho é um acto nulo? Se houver voluntário para a tarefa, agradeço que aproveite para explicar também que o ponto 2 do dito despacho clarificador (“A prova de recuperação a aplicar na sequência de faltas justificadas tem como objectivo exclusivamente diagnosticar as necessidades de apoio tendo em vista a recuperação de eventual défice das aprendizagens”) carece de um despacho a clarificá-lo, ou melhor, a corrigi-lo para português.
Apache, Novembro de 2008

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Terá obtido um “Regular” ou um “Insuficiente”?

O Financial Times considera o ministro português, Teixeira dos Santos, como o pior Ministro das Finanças da União Europeia, entre os 19 que avaliou.
Apache, Novembro de 2008

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

"Abismo" - Fernando Alves

Ainda a propósito da gigantesca manifestação de professores do passado dia 8, Fernando Alves, na sua crónica habitual na TSF (no dia 10), comentava assim as reacções do ministério:
“Talvez haja um abismo de discernimento entre a ministra e o seu secretário de estado, entre aquilo que obriga Maria de Lurdes Rodrigues a dizer que entende o que se passa na rua, mesmo se treslê a mensagem que a rua lhe envia, e o que dispensa Valter Lemos dessa atenção. Ou talvez não. Mas há outros abismos. Enquanto a ministra reage formalmente no Porto ao que ainda não acabou de ser dito na manifestação de Lisboa, aonde entretanto consegue chegar a tempo de explicar no telejornal que aquele não foi, não senhor, o seu pior dia, imagina-se o que dirá cada um daqueles a quem todos os dias o dia não chega, se perguntados sobre os piores dias de uma rotina feita de desgaste físico e emocional. Eis outro abismo: o abismo do método. É disso que eles falam. É isso que pedem. Outro método. Ela diz que entende, diz que escuta. Mas o que ela diz entender é que lhe pedem outro mundo que lhe exigem outra coisa. E se ela tentasse escutar o que eles dizem? Não a espuma das rimas e das cornetas que escorrem pelo jornal, mas o desespero que os desatina. O que os faz vir de longe, o que os deprime, o que os atordoa. Ao contrário do secretário de estado para quem esta manifestação é mais uma que não entende, que não consegue perceber, ela diz que entende mas não cede. E que o que ali vai na rua é a chantagem com os que não vieram. Mas se ali estão quase todos?! Mesmo muitos que nunca vieram. Eis outro abismo que ela cava: não já entre si e eles, mas entre si e nós todos, ao dizer-nos que entrega a educação, afinal, a indigentes e a chantagistas facilmente manipuláveis. Por “cliques” sindicais, ou, como alvitrou o primeiro-ministro por um lamentável oportunismo político da oposição. Talvez Sócrates devesse reflectir em avisos vindos do seu próprio partido como aquele de Manuel Alegre: é que a maior parte dos que desceram a rua terão votado PS. E Alegre mostrou outro ângulo do abismo. A reacção ministerial revela pouca cultura democrática quando fala desta manifestação como uma intimidação.Este é afinal o mais perigoso dos abismos: o da degradação da cultura democrática. Mas se aquele não foi o seu pior dia, fica para Maria de Lurdes Rodrigues em aberto, a possibilidade de perceber que vale a pena ouvir os argumentos dos que a interpelam. Aqueles que ela diz entender. Já a resposta de Valter Lemos, aquele seco - ”é mais uma!”, quando lhe perguntaram o que pensava da manifestação, revela um desprezo e uma insensibilidade que está mesmo a pedir uma séria avaliação. Porque, à parte a discussão sobre o que é ou não é razoável, ela é afinal uma resposta indecente.”
Apache, Novembro de 2008

domingo, 16 de novembro de 2008

“O castelo de Kafka” - Fernando Sobral

“Acreditava-se que o Ministério da Educação tinha sido criado para ajudar as escolas a cumprir a sua função: ensinar os alunos. Com os anos o Ministério da Educação tornou-se num castelo de Kafka: um labirinto burocrático onde até o Minotauro se perderia. O Ministério da Educação tornou-se um monstro cuja única função é hoje tornar impossível o ensino. Pela batuta impulsiva e agreste de Maria de Lurdes Rodrigues, tornou-se no bastião da burocracia. Entrincheirados neles, génios incompreendidos que há anos não sabem o que é dar aulas, tornaram os professores em burocratas e os alunos em cobaias. O resultado está à vista e a manifestação de mais de 100 mil professores é apenas o sinal visível do desvario ministerial reinante. A ministra não fala de ensino: discorre nervosamente sobre questões laborais, não fala da qualidade das aulas, divaga sobre estatísticas. (…)”
Fernando Sobral, no "Jornal de Negócios"

sábado, 15 de novembro de 2008

Se duvidas houvesse…

Apenas uma semana depois da mega manifestação de professores organizada pelos sindicatos e a que aderiram os movimentos independentes, os docentes voltaram hoje a escrever mais uma página na história da luta pela democracia. Pouco antes das 16 horas acomodavam-se em frente ao Palácio de São Bento as primeiras centenas de pessoas, simultaneamente a retaguarda da manifestação abandonava o Largo do Rato, enquanto uma mole compacta de professores apinhava (de parede a parede) a Rua de São Bento. A PSP, desta vez autorizada pelo gabinete de Sócrates a pronunciar-se (contrariamente ao que sucedera no passado sábado), estimou (talvez com medo de ser de novo mandada calar) em 7 mil, os manifestantes. Já antes, a TSF falava de algumas centenas e a SIC experimentava reacções anunciado “cerca de mil”. Os números serviam perfeitamente os intentos de nos arrancar sorrisos sob o luminoso e afável sol de Novembro. Sem bandeiras ou logística de sindicatos ou organizações partidárias, um cortejo de cidadãos orgulhosos da profissão e do seu dever cívico, juntaram-se uma vez mais, alguns (provavelmente) com razoável sacrifício pessoal e familiar, para uma vez mais dizerem BASTA, a tanta estupidez em forma de diploma legal. Pelas 17:30, após o discurso improvisado dos principais dirigentes dos movimentos de professores em defesa de uma escola pública de qualidade, os manifestantes entoavam o hino nacional e sob a penumbra que anunciava a noite, na voz de cada um ecoava uma auto-promessa: o autismo, a megalomania e a acefalia de certos cadáveres políticos encontrará nos professores a devida resistência.
Apache, Novembro de 2008

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Memorando…

Na passada quinta-feira, em declarações aos jornalistas a propósito da decisão de centenas de escolas suspenderem a aplicação do modelo de avaliação docente proposto pelo ministério, Lurdes Rodrigues afirmou: “Não tem sentido achar que é democrático fazer votações de braço no ar para decidir se há ou não avaliação.” Interessante. Leia-se então o disposto no número 1 do artigo 24º do Código do Procedimento Administrativo: “Salvo disposição legal em contrário, as deliberações são tomadas por votação nominal (…)”.
Ora, como não existe disposição legal em contrário, lanço o desafio à senhora ministra, de publicar um despacho onde obrigue a que a suspensão da avaliação do desempenho docente seja aprovada por voto secreto. Teremos todo o gosto em cumpri-lo. Insistia a senhora ministra: “Não me passa pela cabeça que a lei não seja cumprida.” Vejamos então o número 5 do artigo 21º do Decreto Regulamentar nº 2/2008, de 10 de Janeiro (referente à avaliação docente): “A atribuição da menção qualitativa de Excelente fica, em qualquer caso, dependente do cumprimento de 100 % do serviço lectivo distribuído em cada um dos anos escolares a que se reporta o período em avaliação.” Atente-se agora no artigo 63º do decreto-lei nº 100/99, de 31 de Março: “1 – Consideram-se justificadas as faltas motivadas pelo cumprimento de obrigações legais ou por imposição de autoridade judicial, policial ou militar. 2 – As faltas previstas no número anterior não importam a perda de quaisquer direitos e regalias.” Este é apenas um exemplo, mas são mais de uma dezena as contradições entre os diplomas que produziu e outros que ainda vigoram. Portanto, quanto a cumprimento de leis... Acredito, no entanto, que tal não lhe passa pela cabeça. Acredite que não quero saber por onde lhe passa!

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Posição do Sindicato de Inspectores da Educação face ao desespero da tutela

Em declarações à agência “Lusa”, proferidas, hoje, o presidente do Sindicato dos Inspectores da Educação e do Ensino (SIEE), José Calçada, referiu-se assim ao modelo de avaliação que o Ministério da Educação quer impor: “Não tenho a menor dúvida de que o processo deve ser suspenso. Não estou sequer a emitir juízos de valor sobre a qualidade ou falta de qualidade do modelo, mas apenas a dizer que ele não é exequível. No que respeita aos inspectores, é absolutamente inexequível.” Recorde-se que na passada terça-feira, na sequência de declarações infelizes do senhor Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Jorge Miguel de Melo Viana Pedreira), o SIEE dirigiu-lhe, através do seu presidente a carta aberta que segue: “Senhor Secretário de Estado Não pode deixar de nos preocupar – enquanto inspectores da carreira técnica superior de inspecção da educação – a notícia inserta na página 9 do "Público" de hoje, 11 de Novembro, com o título "Governo não avança para já com processos disciplinares a quem recusar avaliação" – a serem autênticas as declarações que a agência "Lusa" lhe atribui, Senhor Secretário de Estado, e que o jornal transcreve. "O ministério da Educação não fará nada para aplicar esses processos [disciplinares] neste momento", terá dito o Senhor. Mesmo que tenha dito apenas isto, é óbvio que o Senhor Secretário de Estado já disse demais. Ao dizê-lo, faz recair sobre os docentes, ao mesmo tempo, uma ameaça e uma chantagem – e infecta com um acriterioso critério de oportunidade um eventual desencadeamento da acção disciplinar. Como se lhes dissesse: «"neste momento" ainda não vos posso apanhar, mas não esperam pela demora...». Por que é que "neste momento" o Ministério não fará nada?... Porque entende que "neste momento" a acção não é oportuna. E pode a tutela reger-se, nesta matéria, por critérios de oportunidade?... A resposta é: sim, pode. E quais são eles? Bem, as coisas aqui complicam-se, porque a resposta fica eivada de uma fortíssima carga subjectiva, uma vez que, nesta matéria, não estão taxativamente definidos limites que impeçam um elevado grau de discricionariedade. Digamos que, no essencial, mais do que por condicionantes legais, são as condicionantes éticas que devem filtrar a oportunidade do recurso a critérios de oportunidade. E é neste domínio que devem ser apreciadas as suas declarações, Senhor Secretário de Estado. Mesmo na hipótese de comportamentos de docentes poderem configurar infracção dolosa da lei – nada impede que, por critérios de oportunidade ou outros, se decida não agir disciplinarmente sobre eles, agora ou em qualquer altura. A própria lei consagra essa possibilidade. Mas para tal os critérios têm de ser transparentes e publicitáveis, sob pena de – no caso ora em apreço – a oportunidade servir de biombo ao oportunismo e a discricionariedade servir para esconder a arbitrariedade. Em rigor, não estando nós dentro da sua cabeça, não sabemos por que é que o Senhor Secretário de Estado entende que este não é “o momento”, mas algo nos diz que este seu juízo de valor se relaciona com o facto de no passado dia 8 terem estado na rua 120.000 professores em protesto contra o Ministério da Educação…Por outro lado, quando e se “o momento” surgir, quem vai fazer o quê? Vão os Senhores Presidentes dos Conselhos Executivos, ou os Senhores Directores Regionais da Educação, ou a Senhora Ministra da Educação, instaurar processos disciplinares às centenas ou aos milhares?... Vamos nós, os Inspectores da Inspecção-Geral da Educação, instruir processos disciplinares às centenas ou aos milhares?... Isto é: vamos tentar resolver(!) pela via da acção disciplinar problemas que possuem a sua raiz claramente fora dela – correndo o risco de instrumentalizar e governamentalizar a Inspecção, sem honra nem glória para nenhuma das partes implicadas e, no limite, com prejuízos para todas elas? Não se pode pedir aos Inspectores da Inspecção-Geral da Educação que retirem do lume as castanhas que outros lá colocaram. Basta de alimentar fantasmas que Professores e Inspectores, e mesmo algumas tutelas, há muito lutam para que desapareçam, particularmente desde o 25 de Abril de 1974! O Senhor Secretário de Estado provavelmente desconhece – e para que o conhecesse bastava que lesse Camões – que uma lei não é justa porque é lei, mas porque é justa, e que o que há de mais permanente na lei é a sua permanente mudança, e que mesmo esta já não muda como “soía”, e que, se assim não fosse, o Código do saudoso Hamurabi continuaria em vigor; o Senhor Secretário de Estado, se alguma vez o soube, esqueceu tudo o que leu do sempre presente Henry David Thoreau e da sua “desobediência civil” O que há de doloroso em tudo isto – e ainda mais num Ministério da Educação – é que, no fundo, estamos confrontados com um problema de cultura, ou de falta dela. Perante isto, os critérios de oportunidade, ou as suas declarações, Senhor Secretário de Estado, ou a potencial instrumentalização e governamentalização da Inspecção – tornam-se, a prazo, questões irrelevantes. Mas temos também a obrigação de, no imediato, sabermos lidar com a circunstância, e de compreendermos a gravidade que ela assume. Não questionando a legitimidade dos governos no quadro do Estado de direito democrático, a verdade é que, exactamente por esse quadro, as Inspecções da Educação são inspecções do Estado e não do governo, e não podem deixar de funcionar sob o registo de autonomia legalmente consagrado. Citando aquele que foi o primeiro Inspector-Geral (da então Inspecção-Geral do Ensino), “a Inspecção, isto é, cada Inspector, está condenada/o a ser a consciência crítica do sistema”. Entre nós, Inspectores de todas as inspecções da educação, costumamos dizer que, não raramente, andamos “de mal com os homens por amor d’el-rei e de mal com el-rei por amor dos homens”. Uma exigência, Senhor Secretário de Estado: os Inspectores da educação querem ser parte da solução, não querem ser parte do problema. O Senhor Secretário de Estado e o Ministério da Educação – o que é que querem?...”
Apache, Novembro de 2008

Qual era a alternativa?

Alberto João Jardim publicou uma Portaria, (no caso a nº 165-A/2008, de 7 de Outubro) na II Série do jornal oficial da região onde se estipula que, passo a citar: "Para todos os efeitos de avaliação do desempenho dos docentes contratados, de transição ao 6º escalão e progressão na carreira dos docentes do quadro, o tempo de serviço prestado nos anos escolares 2007/08 e 2008/09, considera-se classificado com a menção qualitativa de Bom”. Facto consumado, surgiram desde logo uma série de opiniões (algumas vindas das habituais ”virgens ofendidas”, outras de pessoas cuja opinião prezo) insurgindo-se contra a medida. O jornal “Público” explica (e bem) que o Estatuto da Carreira Docente da região foi aprovado a 25 de Fevereiro de 2008 e que até ao momento ainda não foi publicada a correspondente regulação. Recordo que no continente, entre a publicação do Estatuto e a publicação do Decreto Regulamentar decorreu um ano. Ora, na ausência de regulamentação, duas soluções eram possíveis: ou se congelava a avaliação, tal como fez a dona Lurdes no continente, onde recordo, os professores não são avaliados desde Agosto de 2005 (à excepção dos contratados, avaliados pelo “simplex” do ano passado); ou se atribuía uma classificação administrativa que só poderia ser igual para todos. A primeira destas hipóteses prejudicava seriamente os docentes que leccionando este ano na Madeira, queiram concorrer em Fevereiro próximo, para leccionar no ano lectivo 2009/2010 no continente. De acordo com o que tinha sido divulgado até ontem, pela equipa de Lurdes Rodrigues, pura e simplesmente não o podiam fazer, por não terem sido avaliados. Como no continente, a menor das menções considerada positiva é o Bom, a única opção que me parece lógica é a segunda.
Apache, Novembro de 2009

terça-feira, 11 de novembro de 2008

“A razão dos professores e o autismo da ministra” - José Manuel Fernandes

“Não houve muitas notícias na imprensa, na rádio ou na televisão. Até há poucos dias houve mesmo quem duvidasse que os professores realizassem uma nova manifestação. Ou vaticinava-se que esta, a realizar-se, não fosse mais do que um desses desfiles sindicais que o país se habituou a ver para os lados do Ministério da Educação. De repente...
De repente, os professores repetiram ontem um protesto que conseguiu ser maior do que o de Março. Os próprios sindicatos devem ter ficado surpreendidos. Mais: os sindicatos parecem, neste momento, ultrapassados pelos acontecimentos.
Na última semana o PÚBLICO foi recolhendo sinais de que a mobilização para o protesto podia ser enorme, e por isso escrevemos ontem, na capa, «Mobilização total». Hoje sentimos que se está para além desse ponto: a ruptura entre os professores e esta equipa ministerial é total. Uma ruptura como provavelmente nunca aconteceu e que é transversal: manifestaram-se professores de direita e professores de esquerda; recém-chegados à profissão e veteranos; sindicalizados e não sindicalizados; principiantes e professores titulares, professores avaliadores, presidentes de conselhos executivos.Não é possível explicar esta mobilização recorrendo a argumentos como «os professores não querem ser avaliados», «é tudo obra dos sindicatos» ou «não passa de uma reacção corporativa». Mesmo que isso tenha vindo a ser repetido por ministros, Secretários de Estado e porta-vozes, a verdade é que o número de professores que se mobilizou, o número de professores que pediu a reforma antecipada com prejuízo financeiro, as notícias que chegam de todo o país de que o processo está a descarrilar, seriam suficientes para que qualquer equipa ministerial tivesse, ao menos, a humildade de escutar, de tentar perceber por que motivo estão todos - e se não são todos, são quase todos - contra este processo de avaliação do desempenho.
No entanto, o que se está a passar era previsível. Antes da manifestação de Março escrevemos neste espaço que, depois de termos apoiado a Ministra da Educação em muitas medidas impopulares, defendendo há muito a necessidade de avaliar o desempenho das escolas e dos professores, o processo que o ministério estava a montar era kafkiano e iria produzir os efeitos contrários aos desejados. Para chegar a essa conclusão não andámos a ler os comunicados dos sindicatos - tratámos antes de ler a legislação que estava a chegar às escolas. E o ponto central da crítica: imposta de cima para baixo, desrespeitando a autonomia e, sobretudo, a especificidade de cada escola.
Este tipo de visão napoleónica da escola começou a desmoronar-se rapidamente. Basta referir, por exemplo, que o famoso Conselho Científico para a Avaliação dos Professores já vai no seu segundo presidente (o primeiro demitiu-se, e não foi a única baixa registada) e, se acreditarmos no que ontem estava no seu site na Internet, teve a última reunião em Julho, isto é, há quatro meses. Nem entre os mais responsáveis pelo sistema este consegue suscitar confiança.
Mas o pior está a passar-se nas escolas, e nas escolas com os alunos e a qualidade de ensino. O ano lectivo passado, depois do protesto de Março que levou o ministério a suspender o processo, os professores regressaram às escolas e, melhor ou pior, fizeram o que estava ao seu alcance para estarem à altura das exigências da sua profissão.
Só que este ano lectivo a máquina burocrática do ministério regressou com as suas instruções, circulares e ameaças. Os resultados têm sido dramáticos não apenas para a vida dos professores, mas para o normal funcionamento das escolas. Sexta-feira a presidente do conselho executivo da escola pública que, regularmente, fica em primeiro lugar nos rankings disse, em entrevista ao PÚBLICO, como estas normas estão a destruir a sua escola. Ontem relatámos um dia na vida de uma professora avaliadora que trabalha numa escola difícil da Grande Lisboa. Se no ministério alguém lesse jornais, não teria tido de esperar pela manifestação de ontem para perceber até onde vai o mal-estar. Mas deve haver outras prioridades para os lados da 5 de Outubro.
Seriamente ninguém pode ser contra a avaliação de desempenho como condição para a progressão profissional. Mas é intolerável que, dando sinais de crescente teimosia, tente impor um modelo que não funciona, está mal pensado e ainda pior concebido.
E se alguém quisesse realmente avaliar o desempenho dos docentes e das escolas há muito que teria feito algumas coisas simples, todas elas eficazes para promover a qualidade das escolas. Uma delas seria fornecer indicadores sistemáticos e uniformes sobre a evolução dos alunos, o que exigiria provas nacionais realizadas com seriedade. Outra dar mais autonomia às escolas e criar mais mecanismos de interacção com as comunidades locais. Outra ainda ter aprovado um estatuto da carreira docente mais flexível e que permitisse às escolas fazerem ofertas de emprego diferenciadas aos docentes que quisessem motivar para os seus projectos educativos. E, por fim, permitir que as famílias tivessem mais liberdade na escolha das escolas públicas e também das privadas. É possível que muitas dessas medidas tivessem também a oposição de muitos professores, mas dar-lhes-iam melhores oportunidades, tornariam o sistema mais transparente e responsabilizariam mais as famílias. Este sistema está a provocar o efeito contrário e, quando esta ministra passar, pois não é eterna, quem mais terá perdido serão os que menos meios têm para compensar o que as escolas públicas, cercadas e desmotivadas, cada vez lhes dão menos. A isto chama-se promover a injustiça social."
José Manuel Fernandes, no jornal “Público” de que é Director, 9/11/2008

domingo, 9 de novembro de 2008

O dia seguinte…

Realizou-se ontem mais uma mega manifestação nacional de professores. No passado dia 8 de Março, cerca de 100 mil professores haviam desfilado entre a Praça Marquês do Pombal e o Terreiro do Paço, em protesto contra as políticas de destruição da escola pública implementadas pelo ministério liderado por Maria de Lurdes Rodrigues. Ontem, a história repetiu-se. O percurso escolhido foi o mesmo, mas os cerca de 120 mil manifestantes (número apontado pela plataforma de sindicatos), aproximadamente 82% dos docentes em exercício efectivo, percorreram-no em sentido inverso. Durante estes últimos dias, evitei, propositadamente, comentar em público a posição assumida nos últimos meses (depois de 8 de Março) pela plataforma de sindicatos, para evitar o lugar-comum de que quem critica os sindicatos cultiva divisionismos e favorece a acção da ministra. Parece-me, por isso, o momento certo para fazer um ponto de situação. No dia 8 de Março, a esmagadora maioria dos docentes manifestou-se contra a política educativa deste governo, plasmada nos muitos diplomas legais publicados, e que na sua generalidade são completamente desajustados da realidade das escolas, confusos (ou mesmo contraditórios), injustos e ineficazes. Destes, destacam-se os referentes à avaliação docente que impõem um (novo) modelo complexo, excessivamente burocrático, altamente subjectivo, manifestamente injusto e pontualmente ilegal (por atropelos ao Código do Procedimento Administrativo, violação de direitos constitucionalmente protegidos, além de transferirem para os docentes responsabilidades que lhes não pertencem individualmente). Alguns dias depois, ministério e dirigentes sindicais (que não é justo tomarmos as cúpulas pelo todo) assinaram um memorando de entendimento, à revelia de mais de 100 mil professores (que o não validaram), no qual se comprometiam a aplicar este modelo no presente ano lectivo. Às primeiras iniciativas conducentes à implementação deste modelo nas escolas, repito, à revelia da esmagadora maioria da classe, os sindicatos responderam com o silêncio. Já no final de Setembro e início de Outubro, dado voz ao crescente clima de instabilidade e crispação que se vive actualmente nas escolas, movimentos independentes de professores (entretanto constituídos) organizam acções locais de contestação às sistemáticas investidas do ME contra os professores. Começa então a ganhar forma uma nova manifestação nacional, que acaba por ser agendada para 15 de Novembro. Despertos da letargia em que haviam mergulhado, as cúpulas sindicais apressam-se a marcar outra manifestação nacional para 8 de Novembro, à qual acabam por aderir (após pedidos de destacados colegas) os movimentos independentes, na esperança de que assim se pudessem unir de novo, professores e cúpulas sindicais, permitindo mais uma manifestação com participação histórica que pudesse levar a tutela a rever as suas políticas. Pura ilusão. Os autistas do ministério não cederam a 8 de Março e não cedem agora. Vivem na fantasia de que tudo lhes é permitido, por mais aberrante e irracional que seja. Acham-se os iluminados, capazes de impor o paradigma empresarial a sectores onde o produto final são seres humanos e não parafusos ou latas de tinta. Acham que uma reforma se implementa à revelia da esmagadora maioria dos que por ela são afectados. Os autistas que dirigem os sindicatos acham-se pastores a conduzir um rebanho de carneiros, tentando sobrepor os interesses partidários aos interesses da escola. Pensam que lideram a contestação como e quando lhes apetece. A sua visão bipolar coloca de um lado o ME e do outro os seus interesses político-partidários, sendo os professores meras pedras de arremesso nas intifadas eleitorais. Em vez de, na qualidade de professores se juntarem à manifestação convocada pelos movimentos independentes (marginais ao entendimento), quiseram demonstrar uma liderança que já poucos lhe reconhecem, marcando uma outra manifestação, moralmente muito discutível, uma vez que não haviam denunciado o memorando de entendimento, tentando assim, quase desesperadamente, esvaziar a capacidade organizativa independente, dos professores. E porque o seu autismo, mais não parece permitir, colaram-se ontem à resistência que grassa pelas escolas, a qual quase nada fizeram para implementar e, marcaram uma greve de um dia para daqui a mais de dois meses. Sinceramente, muito pouco para tanto palavreado debitado no Terreiro do Paço e no Marquês do Pombal. Acho que alguém ainda não percebeu que com manifestações de rua e greves de um dia pode bem a dona Maria de Lurdes. Tenho tentado acreditar que os dirigentes sindicais querem ser parte da solução e não parte do problema, mas confesso que começa a ser difícil encontrar na acção dos mesmos, justificação para tal. Depois da unicidade mostrada ontem, passar dois meses a assobiar para o lado e fazer uma greve de um dia na segunda quinzena de Janeiro, só pode fazer rir dona Lurdes e “sus muchachos”. Claro que as manifestações de rua são necessárias, por um lado, porque demonstram à opinião pública a indignação e vontade de dar a cara pela luta, depois porque servem para unir em torno de idênticos ideais, os que nelas participam. Mas contra gentinha como os actuais inquilinos da 5 de Outubro, iniciativas deste tipo não bastam. Que fazer então? Deixo uma série de possíveis medidas de resistência, que me parecem exequíveis e não beliscam os normativos legais. Destaco em primeiro lugar, a necessidade de fazer circular abaixo-assinados, no maior número de escolas possível, requerendo ao Conselho Pedagógico a suspensão da avaliação, evocando entre outros factores que julguem convenientes, os atropelos ao CPA, nomeadamente a publicação em DR das delegações de competências e as incompatibilidades. Nas escolas onde tal não seja possível, pedir aos coordenadores, ao conselho pedagógico e ao conselho executivo, por escrito, todos os esclarecimentos que julguem necessários. Nas escolas onde já estejam na fase de entrega dos objectivos individuais, não se comprometam com percentagens de sucesso nem de abandono escolar, deixem que sejam os avaliadores a forçarem esses objectivos, ficando em acta que eles não são vossos, foram-vos impostos pelo avaliador. Não marquem as datas de assistência a aulas, o avaliador que escolha as que quer ver e quando ele entrar (se o fizer) interrompam o que tinham planeado e distribuam uma ficha formativa pelos alunos que demore toda a aula a ser realizada, ou se tiverem um televisor e um vídeo ou projector disponível, um filme sobre a matéria que estão a leccionar ou já leccionada, que preencha igualmente toda a aula. [Não esqueçam que isto implica trazerem sempre um exemplar da ficha (fotocopiado) para cada aluno e um Plano de Aula que têm de entregar ao coordenador, (obviamente simples) que prevê a aplicação da ficha ou do filme, nesse dia]. Quanto à actuação de Lurdes Rodrigues e Pinto de Sousa, recordo uma vez mais as palavras de Eça em “O Conde de Abranhos”: “Este governo não cairá porque não é um edifício, sairá com benzina porque é uma nódoa.”
Apache, Novembro de 2008