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segunda-feira, 1 de março de 2010

Obrigadinho, Zé!

Num encontro com professores socialistas, o Primeiro-Ministro, José Sócrates, citado pelo jornal "Público" garantiu que “não há sucesso económico sem melhor educação.Esqueceu-se de definir o que entende por “sucesso económico” e por “educação”, assim, é impossível o contraditório e, falando sem nada se dizer vai-se passando por douto. Tecendo elogios à actual Ministra da Educação, enfatizou “o êxito político notável das negociações que conduziu com os sindicatos do sector para duas reformas essenciais. Subentende-se idêntico elogio aos sindicatos do sector, que conduziram com a ministra negociações para duas reformas essenciais. Essenciais, para eles (sindicatos, ministra e consequentemente Governo) porque os professores foram, uma vez mais, ignorados (para ser politicamente correcto). Em relação à avaliação dos docentes e ao estatuto da carreira disse que as “reformas começaram por ser controversas mas já estão interiorizadas e consensualizadas.” Interiorizadas foram-no, seguramente, como comprovam as (ainda na memória) manifestações de 100 e 120 mil docentes. Quanto ao “consenso” é uma expressão que está muito na moda aplicar, sempre que uma determinada ideia é alvo de forte e fundamentada contestação e não há argumentos válidos para a defender. Obrigadinho pelo reconhecimento, Zé!
Apache, Março de 2010

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Ainda o acordo de (falta de) princípios…

"O acordo a que o Governo chegou com alguns sindicatos deu lugar a um coro de regozijo pela “pacificação das escolas”. Assim falaram governantes, alguns parlamentares, jornalistas, colunistas e sindicalistas. E se tirassem uma semana sabática e fossem às escolas? Veriam a revolta e a estupefacção dos que, respondendo aos apelos dos sindicatos, não entregaram objectivos individuais, não pediram aulas assistidas nem se candidataram às menções de “muito bom” e “excelente” e por isso ficaram para trás. Veriam discórdia a cada canto, desconfiança crescente, raiva pelas injustiças não sanadas e pelo oportunismo premiado, cansaço acumulado, competição malsã nascente, desilusão e desmotivação generalizadas. Chamam a isto pacificação? Quem ignore os antecedentes do conflito entre os professores e o Governo e leia o acordo conclui que as razões da discórdia se circunscreviam a carreira e salários. E não circunscreviam. Os professores reclamaram contra a degradação do ensino e defenderam a autoridade, a dignidade e a independência intelectual indispensáveis ao exercício sério da sua profissão. Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues instilaram na sociedade uma inveja social contra os professores. Este acordo oferece argumentos a quem queira, maliciosamente, fomentá-la. Nos extremos das 14 horas de clausura na 5 de Outubro estão dois textos. Um, de partida, anteriormente rejeitado; outro, de chegada, agora celebrado. Li e comparei os dois. Para lá das loas, os factos são estes: ao bom jeito dos burocratas de serviço, foi o preâmbulo o pedaço mais alterado; clarificou-se, a meu ver de forma redundante, que a educação especial fica inclusa nas cláusulas do acordo; os sindicatos subscreveram o atestado de menoridade às instituições de ensino superior, que a prova de ingresso titula, a troco de meia dúzia de indigentes dispensas; a conseguida eleição de três membros para a Comissão de Coordenação da Avaliação (de entre um grupo que o director nomeia), a promessa de que o ministério promoverá acções de formação concretas (que despreza miseravelmente o direito daqueles que prefeririam acções de formação abstractas) e a nomeação de um representante da direcção regional respectiva para apreciar eventuais recursos de classificação (estou mesmo a ver como o Senhor se vai empenhar na defesa do súbdito) emprestam algum humor ao conservadorismo da coisa; a possibilidade de renúncia a tarefas, por parte dos possuidores de especialização funcional, e a alusão à tendencial formação especializada do relator serviram para disfarçar que mais de três quartos das contrapropostas da Fenprof não foram aceites e para encher a coluna das mudanças, num cenário de quase tudo ficar na mesma (o toque erudito do acordo é-lhe conferido pelo espírito de Falconeri, que lhe subjaz); e o resto é uma complicada teia contabilística de índices, vagas e quotas, que parte significativa dos professores irá descobrindo com esgares amarelos (o cromatismo clássico não se aplica à complexidade desta caldeirada rosa, laranja e vermelha). A iniquidade, a mediocridade técnica, a burocracia insustentável e a consequente inaplicabilidade de um modelo de classificação do desempenho (é de classificação e não de avaliação que se trata) foram publicamente patentes ao longo de três anos de conflito. Estipula o acordo, já apodado como o mais importante dos últimos 20 anos, pasme-se, mudanças substanciais? Não! Mas o mais pernicioso está agora aceite. Cairá essa excrescência artificial que dividia em duas uma carreira que, pela sua própria natureza, só pode ser única. Mas foram ampliados os estrangulamentos que dela derivavam. A prova de ingresso, classificada sempre (antes e após o acordo, volte-se a pasmar) como algo sem sentido, foi igualmente aceite, repito. E as quotas, que ontem impediam categoricamente qualquer entendimento, foram engolidas sem indigestão. Os professores mais ousados, os que mais se expuseram pessoalmente para defender o que todos reclamavam, foram abandonados, feridos, no campo de batalha. A sua generosidade e o seu exemplo determinantes foram irrelevantes no cotejo com o pragmatismo, que não conhece moral nem ética. Os ciclos de dois anos e as mesmíssimas dimensões da classificação garantem a eternização de uma burocracia impraticável. Um terço dos professores jamais chegará ao topo (não invoquem probabilidades teóricas; por elas eu também posso ganhar o Nobel da paz). A progressão é agora claramente mais lenta que em 2006 e nenhuma simulação teórica o disfarça. A política e o sindicalismo ajoelharam perante o altar do comércio dos interesses pequenos e imediatos. É deprimente como saldo! O Governo reconheceu, no texto do acordo, que o estatuto e a avaliação em análise desqualificaram a escola pública, são entraves ao cumprimento da missão da escola e remetem para segundo plano o trabalho com os alunos (se lerem com atenção, verão que está lá). Não é espantoso que, dito isto, os acordantes prossigam no mesmo caminho? Ou ensandeceram? Mais coisa, menos coisa, dos resultados até agora conhecidos, teremos 700 professores “excelentes”, 18.000 “muito bons”, 78.000 “bons” e “300” regulares. Foi por isto que se destruiu a harmonia nas escolas e se vilipendiaram os professores?"
Santana Castilho, professor do ensino superior, no “Público” de hoje

domingo, 10 de janeiro de 2010

Comunicado conjunto dos movimentos de professores: APEDE, MUP e PROMOVA

O “Acordo de Princípios para a Revisão do Estatuto da Carreira Docente e do Modelo de Avaliação dos Professores dos Ensinos Básicos e Secundário e dos Educadores de Infância” agora assinado entre o ministério da Educação e algumas estruturas sindicais, entre as quais a Fenprof e a FNE, que, entre outros efeitos deletérios, também serviu para desfazer uma importante unidade sindical na luta contra as políticas educativas erradas dos governos de Sócrates, não passa de um novo “memorando de entendimento” que colide, quer com uma parte substantiva das reivindicações que os professores afirmaram, escola a escola e nas ruas, forçando a agenda sindical e resistindo à prepotência e às medidas absurdas da anterior equipa ministerial, quer com o essencial daquilo que os sindicatos afirmaram e defenderam nestes dois últimos anos. Genericamente considerado, o acordo traduz a validação, por parte dos sindicatos, de quase todos os pilares que sustentavam as medidas que Maria de Lurdes Rodrigues procurou impor e que os professores rejeitam incondicionalmente e que os sindicatos reputavam de inaceitáveis. Referimo-nos, em concreto, ao seguinte: - manutenção da prova de ingresso na carreira, apesar de os professores contratados e entretanto avaliados serem dispensados da mesma; - manutenção de um sistema de quotas aplicado ao ensino, num momento em que a sua rejeição é transversal a todos os partidos da oposição, maioritários no Parlamento; - manutenção, quase intacta, do modelo de avaliação de Maria de Lurdes Rodrigues, massivamente recusado pelos professores. São de vária ordem as razões que nos levam a rejeitar um acordo que em nada beneficia os professores e que demonstram a imprudência com que alguns sindicatos tratam a representação dos docentes e a facilidade com que abdicam das suas reivindicações nucleares (das 31 exigências da Fenprof para assinar o acordo, a esmagadora maioria não foi acolhida): 1) a transição para a nova estrutura da carreira docente é penalizadora para os professores, uma vez que a sua grande maioria regride no seu posicionamento e demorará muito mais tempo a atingir o topo da carreira; 2) o tempo de serviço de dois anos e meio extorquido aos professores não foi reposto; 3) não foi abolida a prova de ingresso para quem quer leccionar pela primeira vez, depois de uma certificação universitária e do respectivo estágio com orientações pedagógicas e científicas; 4) prevalece o sistema de quotas e a contingentação administrativa de vagas, por meras razões economicistas (quando o Estado esbanja dinheiro em futilidades, em Bancos e em escritórios de advogados) que nada têm a ver com reconhecimento do mérito, condenando a maioria dos professores a uma permanência de sete anos em alguns escalões; 5) em termos de estrutura da carreira docente, substituiu-se um filtro no acesso a professor titular por dois estrangulamentos no acesso aos 5º e 7º escalões; 6) o modelo de avaliação de Maria de Lurdes Rodrigues é viabilizado quase intocado, com uma porta escancarada para a sua versão “complex” e que, estamos certos, a maioria dos professores irá transpor, candidatando-se às menções de “muito bom” e de “excelente” (num ciclo avaliativo de dois anos estaremos a falar de cerca 120 mil professores que vão requerer meio milhão de aulas assistidas, o que é uma barbaridade que paralisará as escolas); 7) na sequência do número anterior, os princípios agora aprovados no quadro do modelo de avaliação, mantêm todos os dispositivos que fomentaram, nas escolas, a competitividade doentia, a barafunda e a burocracia, nomeadamente os ciclos de dois anos com avaliação em permanência de todos, a decisão individual de definir objectivos individuais e de requerer aulas assistidas, a proliferação e o entrecruzar de Comissões de Avaliação e Relatores ou, ainda, as dimensões de avaliação consideradas e o contributo em aberto de cada docente para as mesmas, abrindo caminho às disputas de tralha, papelada e projectos folclóricos. A confluência de tudo isto arruinará o ambiente e a cooperação nas escolas e dificultará o investimento dos professores na sua função de ensinar, passando cada um a estar mais focado na sua própria avaliação; 8 ) aceitam-se, e reforçam-se, as consequências decorrentes do 1º ciclo de avaliação em termos de progressão, validando-se uma avaliação que os sindicatos qualificaram de “farsa” e de “faz de conta”, além de que os docentes foram incentivados pelos sindicatos a não entregarem os objectivos individuais e a não viabilizarem o modelo integral através da candidatura ao “muito bom” ou ao “excelente”, sendo agora retaliados por essa ousadia, nomeadamente os professores dos 4º e 6º escalões que não estariam sujeitos ao sistema de vagas para os 5º e 7º escalões, assim como os do 10º escalão que se vêem, hoje, impedidos de aceder ao 11º escalão; 9) as implicações anti-democráticas que o novo modelo de gestão terá na constituição da Comissão de Coordenação de Avaliação, promovendo o aparecimento dos apaniguados do(a) director(a), retirará transparência, imparcialidade e seriedade ao processo de avaliação. Permitimo-nos afirmar, sem qualquer ambiguidade e com toda a frontalidade, que não podemos deixar de lamentar a imagem enganadora que os sindicatos passaram para a opinião pública, ao fazerem da discussão do estatuto da carreira docente e do modelo de avaliação, uma mera questão de quotas e contingentes de vagas, que em nada condizem com a postura que a classe docente sempre manteve ao longo destes anos de luta, onde as suas reivindicações foram sempre além das questões salariais, preocupando-se, isso sim, com questões de exigência, seriedade, transparência, justiça e qualidade da escola pública, onde se integrava, sobretudo, a exigência de acabar com o modelo de avaliação em vigor, algo que os sindicatos desrespeitaram em absoluto. Um capital de contestação e de concomitante força negocial foi completamente decapitado e desperdiçado por representantes que demonstraram não estar à altura do respeito que lhes deviam ter merecido a mobilização e os imensos sacrifícios de que os professores deram provas ao longo destes quatro anos. Os Movimentos Independentes de Professores admitem desencadear, em breve, a construção de uma grande Convergência de Contestação às medidas que os professores continuam a rejeitar neste acordo (e pela defesa de outras que ficaram ausentes), procurando reunir na mesma os sindicatos que não assinaram o acordo, os professores que se destacaram na blogosfera e núcleos de professores, organizados escola a escola. Contem connosco, porque isto não pode ficar assim!

sábado, 9 de janeiro de 2010

O casamento gay… Perdão, o acordo de princípios…

O Ministério da Educação e os principais sindicatos de professores assinaram na madrugada passada, ao fim de catorze horas de reunião (sim, leram bem, 14 horas; e querem-nos convencer que não estão loucos) um acordo de 12 páginas a que deram o nome pomposo de “Acordo de princípios”. Esclareço já hipotéticos leitores que pensam que vou escrever um longo texto, que não será assim. Há aquele velho ditado que diz que, quanto mais se mexe em resíduos sólidos orgânicos mais estes libertam hidrocarbonetos aromáticos voláteis de odor intenso, portanto não remexerei muito. Apenas alguns tópicos, breves: O actual Estatuto da Carreira Docente vedava o acesso aos 3 escalões mais altos da carreira a dois terços dos docentes, por via de quotas administrativas. O acordo agora assinado prevê duas restrições à progressão, uma limita a 50% dos candidatos avaliados com a classificação de “bom”, após completarem o tempo de serviço necessário, bem como a respectiva formação, a passagem, em cada ano, do 4º para o 5º escalão, a outra, limita a 33% dos candidatos que preencham idênticos requisitos, a passagem do 6º para o 7º escalão. Isto, até 2013, a partir daí logo se verá, talvez valha tudo, incluindo arrancar olhos; Na segunda metade de 2002, com oito anos de serviço, avaliados com a menção de “satisfaz” (a equivalente ao actual “bom”) atingi o então 5º escalão de uma carreira com 10 (faltando-me 18 anos (se todos fossem avaliados com “satisfaz” para atingir o topo da carreira, o que aconteceria ao fim de 26 anos), hoje, passados quase 7 anos e meio (avaliados com “satisfaz” e “bom”) estou (e ao que parece, por via deste acordo assim deveria permanecer) no segundo escalão de uma carreira que continua com 10 escalões (mantendo o mesmo índice de vencimento que em 2002) e na perspectiva de, se obter sempre “bom” na avaliação de desempenho, realizar as formações necessárias, e ter muita sorte com as vagas, poder atingir o topo da carreira daqui a 26 anos (ou seja, com mais de 41 de serviço). Se as coisas não correrem muito bem no que respeita a vagas, mesmo que sempre classificado com “bom”, o topo da carreira poderá ter de esperar até aos 47 ou 48 anos de serviço; Entretanto, por via do novo acordo, a avaliação de desempenho vai ficar mais ou menos como até aqui, o professor enfia umas tretas quaisquer num dossier (perdão, portefólio), ou então compra um no mercado negro, realiza umas acções de formação em “eduquês” ou “magalhanês”, entrega um relatório crítico a dizer que fez isto aquilo e mais aqueloutro e que é excelente, um colega eventualmente tão competente como ele, ou talvez não, vai assistir a duas aulas por ano e larga uns “bitaites” mal amanhados sobre elas e já está. Uma avaliação que distingue o mérito e premeia os excelentes (5% determinados pelos iluminados) e os muito bons (25%), em detrimento dessa corja de inúteis que são apenas bons, aos quais o Governo (e pelos vistos) os sindicatos recusarão sempre um ordenado digno e equivalente aos dos outros licenciados empregados pelo Estado. É preciso poupar dinheiro para enterrar no BPN, no BPP, no TGV, no novo aeroporto em muitas auto-estradas novas e no mais que as taras de cada ilustre rosa, laranja, azul ou vermelho assim determinar, em vez de andar a gastá-lo nesse inúteis preguiçosos e bem pagos que constituem a classe docente (não dirigente sindical). Basicamente, o que tínhamos, em termos de progressão na carreira e avaliação era muito mau, mas não faz mal, finalmente os nossos governantes, uma vez mais com a conivência dos nossos representantes acordaram algo pior. É todo um mundo novo que desfila perante os nossos olhos e ouvidos incrédulos. O que se conclui duma análise detalhada deste demencial “acordo de princípios” é que Governo e sindicatos subscritores concordam em mandar para o lixo os mais elementares princípios de um estado de direito democrático, tais como os da justiça, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé da administração, etc. Mas como eu disse que não remexia muito, antes que feda demais, vou ficar por aqui. Oito de Janeiro fica para a história como o dia em que os gays acordaram um casamento de princípios.
Apache, Janeiro de 2009

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Diz que é uma espécie de “negociação”

"Amanhã terá lugar uma derradeira ronda de reuniões para que Ministério da Educação e sindicatos cheguem a acordo sobre as alterações ao estatuto da carreira docente e à avaliação do desempenho, que dele emana. Será mais uma tentativa falhada, num processo condenado desde o início. Assim previ e afirmei, em sucessivos artigos deste jornal, porque conheço os actores e o sistema. Retomo uma pergunta que então formulei: que sentido faria conceder qualquer benefício de dúvida a uma ministra que acabara de afirmar publicamente dar o seu inteiro apoio às políticas educativas seguidas por Sócrates e que as mesmas seriam para prosseguir e aprofundar? Recordo o que então afirmei sobre Isabel Alçada: que não tinha identidade política; que melosa e sorridente, fora recrutada para desempenhar o papel de mero “factotum” de políticas alheias. Calados os arautos do optimismo e do pragmatismo, que mostra a realidade? Que o que se propõe aos professores agora é pior do que tinham: em vez de um estrangulamento, oferecem-lhe três; estreitaram ainda mais a fresta por onde se pode chegar ao topo da carreira; e branquearam o cortejo de barbaridades que caracteriza o chamado primeiro ciclo de avaliação. O fim da avaliação do desempenho numa organização cooperativa, como deve ser qualquer escola, é a melhoria do desempenho. Neste recente processo, o secretário de Estado Alexandre Ventura confessou publicamente que eram económicas as questões condicionantes e impostas pelo Ministério das Finanças. Apenas poderão ter ficado surpreendidos os distraídos, já que Sócrates procurou, desde o primeiro momento, construir uma escola de pouco custo e a “tempo inteiro”, que funcione como uma empresa, sujeita a fortes relações hierárquicas (daí os professores titulares e os directores), com professores proletarizados sujeitos a mecanismos burocráticos de controlo, sem autonomia intelectual e pedagógica, com horários dilatados e salários reduzidos (para tal contribui a abundância de oferta face ao fecho de escolas, a reclassificação de jovens com necessidades educativas especiais, a entrada no mercado das tradicionais empresas intermediárias - novas oportunidades, inglês e outras actividades não curriculares – e a desregulação dos concursos nacionais de colocação). Esta política, errada, reconhece-se noutras áreas cruciais da governação e tem gerado desemprego, penúria económica, desmembramento da coesão social da nação, aumento das desigualdades entre pobres e ricos (patente, entre outros indicadores incontornáveis, na escandalosa diminuição da parcela do produto interno bruto que remunera o trabalho, enquanto não deixa de crescer a que remunera o capital) e corrupção galopante. O presidente da República fez, a propósito da tradicional mensagem de fim de ano, um diagnóstico que facilmente será acompanhado pelos portugueses esclarecidos. Mas a medida que propõe, asséptica como é costume, poderá ser desastrosa, se vier a ser entendida pela oposição como necessidade de cedência à teimosia de Sócrates, incapaz de governar em minoria. Se as políticas deram maus resultados e estão erradas, é preciso mudá-las. Essa foi a missão que os eleitores outorgaram à Assembleia da República nas últimas eleições. É por isso que a Assembleia da República terá que retomar em mãos a questão da avaliação dos professores, da qual não deveria ter abdicado, como é agora patente. Chamemos-lhe Isabel. Tem 14 anos e meio de profissão. Congelamento também contabilizado, garante-me esta professora que as alterações legislativas lhe roubaram 6 anos e meio de serviço. É duro, sobretudo se somado à perspectiva de ficar «ad eternum» retida no mesmo índice, ainda que a avaliação do desempenho a classifique com “bom”. Quando discutimos economia, admito que a relatividade dos fenómenos torna irrelevante, num contexto, aquilo que é enorme noutro. Mas não podemos ignorar que para o cidadão anónimo as referências dominantes são as suas próprias dificuldades. É por nisso que a Isabel do nosso exemplo não aceita que, depois de lhe roubarem 6 anos e meio de serviço, lhe venham agora dizer que o país só se salva se ela marcar passo no mesmo escalão por tempo indeterminado, quem sabe se para o resto da carreira. Porque ao lado vê o vórtice de 1400 milhões do BPN, que ela própria irá pagar. Porque não entende as mãos largas que dispensaram de concurso transparente os milhões gastos em ajustes directos. Porque sendo contra a oportunidade do TGV, tem cultura suficiente para perceber como a vida dos filhos e dos netos sairá prejudicada pelos caprichos megalómanos dos mesmos que lhe dizem que o congelamento é o seu fado. Porque teima que são imorais os lucros indecentes dos bancos só pagarem 13 por cento de IRC. Porque não lhe parece razoável pagar uma gasolina e uma electricidade das mais caras da Europa, quando os respectivos monopólios continuam com lucros de escândalo. E como se isso não bastasse, ela, Isabel congelada e roubada, ainda paga a uma entidade reguladora que autoriza o aumento da tarifa eléctrica em ano de inflação nula. É por isso que a Isabel desta crónica olha agora para a Assembleia da República. É por isso que a Isabel desta crónica acompanha o diagnóstico mas não aprova o prognóstico do Presidente da República."
Santana Castilho, no “Público” de ontem

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Dos tempos… e da Ordem

Um texto brilhante de José Luís Sarmento, autor do blogue “As minhas leituras”, cuja abrangência vai muito além, em minha opinião, da necessidade de criação de uma Ordem dos Professores.
“O Estado tem o monopólio da coacção. Todos, ou quase todos, lho reconhecemos. Não decorre daqui que tenha o monopólio da legitimidade, como é frequente ver afirmado na blogosfera, nos «media» e nas declarações dos políticos. Nenhum dos grandes pensadores da Democracia reconhece ao Estado este monopólio, nem ele está consagrado na Constituição da República Portuguesa (ou, que eu saiba, em qualquer Constituição de qualquer país democrático). Vital Moreira sabe isto melhor que ninguém. Quando afirmou, a propósito da luta dos professores, que o Governo é que define o bem comum, traiu a probidade intelectual e académica a que estava obrigado em troca da migalha de poder político de que agora desfruta no Parlamento Europeu. Não é preciso um grande esforço da imaginação para dar exemplo de legitimidades que não cabem ao Estado. Desde logo, a que decorre da realidade dos factos. Quando a Assembleia legislativa do Texas votou a proposta de atribuir a «pi» o valor de 3,0 (foi derrotada), não estava a exercer um poder legítimo, pese embora o sufrágio que a elegeu: a vontade expressa das maiorias eleitorais nunca é um cheque em branco, confere antes um mandato que tem o seu conteúdo e os seus limites. Legítima, sim, seria a acção de um matemático texano que continuasse, a despeito da lei e ainda que sozinho, a procurar mais casas decimais para o valor de "pi"; ou a de um engenheiro texano que definisse este valor até à casa decimal correspondente ao grau de exactidão exigida pelo trabalho que tivesse entre mãos. A Assembleia Legislativa podia achar necessário para o bem comum facilitar deste modo o ensino da geometria nas escolas; mas o engenheiro sabe que a construção correcta duma escada em caracol também está no âmbito do interesse geral. Este conflito de legitimidades é o tema principal de «Nineteen Eighty-Four». A personagem principal pensa que tem o direito de acreditar que dois mais dois são quatro; o Estado reivindica para si o direito de fazer os seus súbditos acreditar - e exige-lhes que sejam sinceros nesta crença - que dois mais dois são três, ou cinco, ou seja o que for que mais lhe convenha de momento. Na vida real, nenhum Estado, dispense ele ou não as formalidades do processo democrático, tem esta legitimidade. Tanto Winston Smith como o engenheiro acima postulado têm razão, mesmo que a afirmem contra todos os outros. Outra legitimidade que não pertence ao Estado é a que decorre dos direitos de associação e de expressão. Se os cidadãos se associam, ou se pronunciam sobre as políticas dos governos, é para produzir efeitos na comunidade - ou seja, para exercer um poder que todos os Estados democráticos reconhecem explicitamente, nas suas Constituições, como legítimo. A atitude dum governante que diz implicitamente aos governados "falem para aí à vontade, manifestem-se no número que quiserem, mas não esperem que alguém os ouça" é uma subversão da Constituição e uma perversão da Democracia. Há, também, as várias legitimidades profissionais. Tem que as haver: um médico, um engenheiro, um professor exercem actividades que se repercutem directamente na vida e no bem-estar dos seus concidadãos. Ou seja, têm poder; e o que legitima este poder é a autoridade que lhes advém do saber. Este poder confere-lhes responsabilidades específicas que exigem uma medida correspondente de legitimidade, e esta não lhes pode ser conferida pelos protocolos da democracia formal. O sufrágio eleitoral, que é o mais importante destes protocolos, não tem a virtude mágica de tornar os eleitos especialistas em tudo. Os eleitores podem conferir aos políticos um mandato que lhes permita determinar o que é uma boa prática clínica ou pedagógica, mas não lhes podem conferir o conhecimento especializado necessário a que esta definição seja técnica e cientificamente correcta e redunde efectivamente na realização do maior bem do maior número. Em matérias para as quais sejam relevantes conhecimentos especializados, a decisão não se fundamenta apenas na legitimidade política «stricto sensu», mas também na convergência desta com legitimidades doutra ordem (ainda que a legitimidade política deva prevalecer; mas uma legitimidade política que não reconheça outras legitimidades depressa deixa de prevalecer e acaba por se auto-destruir). É esta convergência que tem estado em causa no discurso político e mediático da última década. A confusão, propositada ou não, entre estado democrático e sociedade democrática é a base da qual se parte para o ataque às "corporações", apresentadas repetidamente à opinião pública como grémios de privilegiados, obsessivamente focados na protecção dos seus interesses particulares em detrimento do bem comum e teimosamente opostos ao progresso e à mudança. Este discurso provém sobretudo da classe política e das agremiações patronais, que são também corporações, mas que, por qualquer razão que nunca é explicada, não têm esse nome nem declaram outros interesses que não sejam os do cidadão comum. Esta dicotomia entre as corporações diabólicas, por um lado, e por outro as corporações angélicas releva, como é evidente, do mais puro populismo. Todas as corporações defendem, legitimamente, os interesses dos seus membros; mas por outro lado todas elas têm a sua visão do bem comum e as suas propostas sobre a melhor maneira de o prosseguir. O interesse próprio da corporação dos políticos está em obter para os seus membros o monopólio da legitimidade; o interesse próprio da corporação patronal está em obter o máximo de poder político. Em ambos os casos a estratégia passa necessariamente por uma guerra a todas as instituições da sociedade civil que não estejam dependentes da elite política e empresarial e não defendam os seus interesses. Entre as corporações angélicas a que não se dá o nome de corporações, há que referir uma terceira: a dos economistas, ou melhor, a dos economistas duma certa tendência, que são quase os únicos que têm acesso aos «mass media» e aos corredores do poder. O seu papel na guerra do Estado contra a Sociedade parece ser convencer-nos de que a verdadeira prosperidade consiste em ganharmos cada vez menos trabalhando cada vez mais; que a verdadeira igualdade está na desigualdade extrema; e que a elite dominante não é uma elite, mas sim parte um grupo, ligeiramente mais bem-sucedido, de gente igualzinha a nós. É assim que vemos a elite da política e dos negócios a usar um discurso anti-elitista como justificação moral da sua guerra contra a sociedade. A verdadeira elite não são eles, por mais que vivam no luxo e no consumo conspícuo: são todos aqueles cujo trabalho, cujo estudo e cujo esforço visaram outros fins - pessoais e sociais - que não os da estrita e imediata utilidade económica, e que, apesar desta inadmissível heterodoxia, ousam exigem ver reconhecido e recompensado o mérito atinente ao seu trabalho, estudo e esforço. Deste anti-elitismo populista - Thomas Frank, no seu livro «One Market Under God», chama-lhe "populismo de mercado" - o salto é muito curto para o anti-intelectualismo, um anti-intelectualismo tanto mais eficaz quanto tem raízes profundas na mentalidade portuguesa, que respeita muito pouco a autoridade de quem sabe mas se inclina até tocar com a testa no chão perante o domínio de quem manda. É este o caldo de cultura em que se têm desenvolvido as nossas políticas educativas nos últimos trinta anos. Os resultados estão à vista de todos e prejudicam todos. É por isso que o País - leia-se, a sociedade civil portuguesa - tem absoluta necessidade duma Ordem dos Professores, que em termos de utilidade pública tem uma importância só equiparável à Ordem dos Médicos. É claro que uma Ordem dos Professores defenderá - legitimamente, diga-se já - o interesse dos professores em verem melhorado o seu estatuto social e profissional. Mas defenderá também o interesse das escolas, que é dar o mundo a compreender às novas gerações e não imbecilizá-las, como o poder político as quer obrigar a fazer. E será uma arma a acrescentar às outras de que a sociedade civil já dispõe para limitar o poder totalitário da plutocracia que a oprime.”
Apache, Janeiro de 2010

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

"A falta de classe"

“Perdoem hoje o estilo. A prosa sairá desarticulada, quais dardos soltos. Este artigo é, conscientemente, feito de frases curtas. Cada leitor, se quiser, desenvolverá as que escolher. Meu objectivo? Manter a sanidade mental. Escorar a coluna vertebral. Resistir. Este artigo é também uma reconfirmação de alistamento na ala dos que não trocam os princípios de uma luta pelo pragmatismo de um lance. Porque amo a verdade e a dignidade profissional como os recém-chegados ao mundo amam o bater do coração das mães. Porque não esqueço os que nenhum lance poderá já compensar. Porque com a partida prematura deles perderam-se pedaços da Escola que defendo. Porque pensar em todos é a melhor forma de pensar em cada um. A avaliação do desempenho é algo distinto da classificação do desempenho. A avaliação do desempenho visa melhorar o desempenho. A classificação do desempenho visa seriar os profissionais. Burocratas que morreram aos 30 mas só serão enterrados aos 70 tornaram maior uma coisa menor. Quiseram reduzir realidades díspares à unicidade de fichas imbecis. Tiveram a veleidade Kafkiana de particularizar em 150.000 interpretações individuais os objectivos de uma organização comum a todos. Convenceram a populaça que se mede o intangível da mesma forma que se pesam caras de bacalhau. Chefiou-os uma ministra carrancuda, que teve o mérito de unir a classe. Chefia-os agora uma ministra sorridente, que já se pode orgulhar de dividir a classe. Porque, afinal, custa, mas não há classe. Há jogos! De cintura. De bastidores. De vários interesses. Parlamentares, sindicalistas, carreiristas e pragmatistas ajudaram à Babel. Da sua verve jorra a água morna de Laudicéia, a que dá vómitos. Alçada derreteu o implacável Mário Nogueira que, em socorro da inexperiência da ministra, veio, magnânime, desculpar-lhe as gafes. E, cristãmente, entendeu agora, de jeito caridoso, que não seja suspenso o primeiro ciclo avaliativo. Esqueceu duas coisas: o que reclamou antes e que ciclos avaliativos são falácias de anterior ministra. Ciclos avaliativos, Simplex I, Simplex II e o último expediente (no caso, um comunicado à imprensa, pasme-se) para dizer às escolas que não prossigam com o que a lei estabelece são curiosos comandos administrativos. Uma lei má, iníqua, de resultados pedagogicamente criminosos, devia ter morrido às mãos do parlamento. Por imperativo da decência, por precaução dos lesados, por imposição das promessas de todos. Quanto à remoção das mágoas, meu caro Mário Nogueira, absolutamente de acordo. Depois de responsabilizar os que magoaram. Depois de perguntar aos magoados se perdoam. Por mim, cuja lei foi sempre estar contra leis injustas, a simples caridade cristã não remove mágoas. Não sei perdoar assim, certamente por falta de céu. Agora, porque sou amigo de Platão mas mais amigo da verdade, duas linhas para Aguiar Branco. Gostei de o ouvir dizer, a meu lado e a seu convite, que a avaliação do desempenho era para suspender. Mas não justifique a capitulação com a semântica. Poupe-me à semântica, porque a semântica não o salva. Enterra-o. Suspender é interromper algo, temporária ou definitivamente. É proibir algo durante algum tempo ou indefinidamente. Substituir é colocar algo em lugar de. Não só não tinha como não terá seja o que for, em 30 dias, para colocar em lugar de. Sabe disso. Bem diferente, semanticamente. Mas ainda mais importante nos resultados. O Bloco Central reanimou-se nas catacumbas e o PS agradeceu ao PSD o salvar da face. Mas os professores voltaram a afastar-se do PSD, apesar do arrependimento patético de Pedro Duarte. E, assim, o PSD falha a vida! Um olhar aos despojos. Reverbera-se a falta de capacidade de muitos avaliadores para avaliar, mas homologam-se os “Muito Bom” e “Excelente”, que significam mais 1 ou 2 pontos em concurso. Os direitos mal adquiridos de alguns valeram mais que os direitos bem adquiridos de muitos (como resolverão, a propósito, os direitos adquiridos dos “titulares” que, dizem, vão extinguir?). Porque toca a todos, muitos “titulares” que não tinham vagas de “titulares” em escolas que preferiam, foram ultrapassados em concurso por outros de menor graduação profissional, que agora lá estão, em almejados lugares de quadro. Ao mérito, há muito cilindrado, junta-se uma palhaçada final, em nome do pragmatismo. Muitos dos que foram calcados recordam agora que negociar é ceder. Mas esquecem que os princípios e a dignidade são inegociáveis, sendo isso que está em jogo. Um modelo de avaliação iníquo, tecnicamente execrável e humanamente desprezível, que não lhes foi aplicado ao longo de um processo, é agora aceite, em nome do pragmatismo, para não humilhar, uma vez, quem os humilhou anos seguidos. Sócrates, que se disse animal feroz, vai despindo a pele. Mas não nos esqueçamos da resposta de um dos sete sábios da Grécia, quando interrogado sobre o mais perigoso dos animais ferozes. Respondeu assim: dos bravos, o tirano. Dos mansos, o adulador. Vão seguir-se meses de negociações sobre o estatuto. O défice, que levou à divisão da carreira e às quotas, agravou-se. Se a desilusão for do tamanho da ilusão, tranquilizem-se porque a FENPROF ficará de fora, como convém, e a FNE poderá assinar um acordo com o Ministério da Educação, como não seria a primeira vez. Voltaremos então ao princípio. O que é importante continuará à espera. Mas guardaremos boas recordações de duas marchas nunca vistas.”
Santana Castilho, no “Público” de hoje

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Uma aventura no Ministério da Educação

Depois de na passada quinta-feira termos ficado a saber que a nova Ministra da Educação é a coordenadora do Plano Nacional de Leitura, Maria Isabel Girão de Melo Veiga Vilar, conhecida como co-autora da colecção infantil “Uma Aventura”, pelo pseudónimo literário de Isabel Alçada, foram hoje tornados públicos os nomes dos dois secretários de estado que completam a equipa. A saber: José Alexandre da Rocha Ventura Silva (que Maria de Lurdes Rodrigues havia colocado à frente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores, órgão que criou para lhe validar os devaneios avaliadores, também conhecido pelos seus estudos independentes, “parecidos” com os da OCDE) e João José Trocado da Mata (“ex-criado” de dona Lurdes no ISCTE, actual Director-Geral do Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação e Coordenador do Plano Tecnológico da Educação). Por comparação aos anteriores inquilinos da “5 de Outubro”, o ministério fica a ganhar na embalagem, sobretudo na qualidade dos fatos e dos perfumes e na linguagem melosa, mas quanto ao conteúdo, espera-se o mesmo cinismo, a mesma hipocrisia, a mesma falta de conhecimento do terreno, a total ausência de ideias válidas. Particularmente no que respeita à líder da equipa, não só, não cultivo grandes ilusões, como, na generalidade, subscrevo o que Santana Castilho (bem ao seu estilo) escreveu no Público de ontem.
“Aqui me têm como sou, dizendo aos que têm a generosidade de me ler o que me vai na alma. Não sou hipócrita nem cultivo falsos respeitos. Se vejo claro o que aí vem, por que insípida postura me iria escudar em convenientes benefícios de dúvida? Qual benefício para quem afirmou, com sorriso de leste a oeste, à espera dos aplausos da plateia, dar o seu “inteiro apoio à política educativa que tem vindo a ser seguida” e considerar “que é importante a prossecução e aprofundamento do trabalho que tem vindo a ser realizado”? Esta é a segunda referência escrita que faço à actual ministra da Educação. A anterior já me valeu 3 mimos: inconveniente, radical e extremista. Assim seja. Sou inconveniente para os dissimulados e radical para os que se especializaram em protelar. Aceito o extremismo. Mas mais extremistas que eu são os que atacaram extremamente os professores, a escola pública e o ensino sério. E esses vão continuar, enquanto não se lhes responder de forma extremamente resoluta. De Isabel Alçada conheciam-se meia centena de livros de fantasias para crianças. Mas nenhuma ideia expressa sobre Educação, para adulto ler. Hoje já temos 3 discursos políticos, bem recentes, e um quadro de comunicação não verbal, que só escapa aos incautos. Tudo visto, são discursos que revelaram uma organização de ideias confrangedora, recheados dos clichés repetidos ad nauseam durante os últimos 4 anos, medíocres do ponto de vista da semântica e da construção frásica, onde os erros de concordância surpreendem. Ficou-lhe mal elogiar tanto o seu Plano Nacional de Leitura. Esse e o da Matemática. Os planos nacionais são expedientes a que se recorre quando as primeiras instâncias falham e não se sabe corrigir o que está mal. Custam muito dinheiro, jogado em cima do que já existe para obter os mesmos resultados. No caso da leitura, o plano sucedeu a anos a menosprezar o ensino do Português, a substituir os clássicos por panfletos de cordel e a tornar a gramática para crianças numa charada de linguistas. No que toca à Matemática, entregou-se a concepção e a execução do plano aos que tinham sido apontados como responsáveis pela situação que o mesmo se propunha corrigir. Sem mais! Esta é a sinopse do verdadeiro contexto de elogios ocos. Ficou-lhe mal dizer que o Magalhães e o plano tecnológico nos tinham colocado na primeira linha do desenvolvimento. São tiques de deslumbramento terceiro-mundista, sem credibilidade, que minam o desejável recato de qualquer começo. Ficou-lhe mal a alusão encomiástica às novas oportunidades e ao ensino profissional. Os professores sabem que, descontadas poucas situações de funcionamento sério, uma e outra iniciativa são farsas e manipulações grosseiras das pessoas e das instituições. Ficou-lhe muito mal a protecção que deu à clausura das crianças na escola, de sol a sol, e a cobertura que não regateou à moderna escravização administrativa dos docentes. Foi-lhe desfavorável a versão, inverosímil, segundo a qual o convite e a aceitação surgiram momentos após a sua declaração pública em contrário e escassas horas antes do anúncio oficial. Aceitaram os que acreditam no Pai Natal. Numa palavra, fez o suficiente para que nenhum professor prudente acredite nela. Para início e em tão pouco tempo, pior seria difícil. Não espanta que Isabel Alçada seja ministra sem anteriormente ter sentido necessidade de dizer o que pensa do sistema educativo. Sócrates pensará por ela. Lurdes Rodrigues já pensou por ela. Aliás, no fim da cerimónia de remodelação governamental, a agora ex-ministra foi profética quando sublinhou, repetidas vezes, com o cinismo que a caracteriza, a sua muita confiança no novo governo. Os mais atentos sabem que tem razão, porque Isabel Alçada não tem identidade política. Melosa e sorridente, foi alistada para continuar a contar histórias, agora aos professores. Da política tratará Sócrates, Silva Pereira, Santos Silva e Francisco Assis. Fala-se muito no poder da Assembleia da República para corrigir os erros de política educativa da anterior legislatura. Mas desvaloriza-se, nessa fé, a circunstância de Sócrates não os reconhecer. Desvaloriza-se, nessa compreensível ânsia de sacudir um jugo de 4 anos, que uma coisa é a cavalgada fácil do descontentamento generalizado, para colher votos, outra é entender a importância estratégica da Educação. Como tal, a realidade mostra que os partidos, todos os partidos, a ignoram. Imediatamente após ter sido indigitado primeiro-ministro, Sócrates assumiu, para espanto dos sensatos, que tanto lhe dava uma coligação com o PSD, como com o PCP, CDS ou BE. Revelou assim, sem delongas, a ideologia do PS que lidera e a manhosice que porá na navegação táctica que se segue. Na peugada, aliás, recordo-o para os de memória curta, de Soares e Guterres: o primeiro meteu rapidamente o socialismo na gaveta, para governar com o CDS; o segundo trocou sem rebuços a coerência política por umas fatias de queijo Limiano. Com este pano de fundo, espera-nos uma aventura de curvas à direita e contra-curvas à esquerda. No primeiro cruzamento, podemos ser surpreendidos por um paradoxo: para suspender tacticamente um modelo de avaliação do desempenho que já não existe, reforçaremos estrategicamente um poder que se instala sob a nossa ingenuidade. Não me entendem? Estejam atentos aos próximos capítulos!”
Apache, Outubro de 2009

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Dúvida “inatacável”

“O princípio de que a avaliação de desempenho tem que existir é inatacável.” Valter Lemos, Secretário de Estado da Educação, ao jornal albicastrense “Reconquista” Dúvida: O sistema educativo finlandês é bom, porque os alunos têm boas notas nos testes internacionais [nos PISA de 2006, a Finlândia ocupou o 1.º lugar a Ciências e o 2.º a Matemática e a Leitura, ficando, no conjunto dos testes, no 1.º lugar], ou mau porque não existe nenhum modelo formal de avaliação de professores?
Apache, Setembro de 2009

domingo, 30 de agosto de 2009

Maria de Lurdes Rodrigues, a ministra da barbárie

“O mandato de Maria de Lurdes Rodrigues no ministério da educação teve a característica, aparentemente paradoxal, de ser simultaneamente de continuidade e de ruptura. Esta é mais fácil de descrever do que aquela, uma vez que consistiu basicamente em duas políticas, ambas com raízes extrínsecas à educação e visando fins políticos fora desta área. A primeira destas políticas - a demonização dos professores - serviu sobretudo o projecto político pessoal de José Sócrates. Tratava-se de arranjar um inimigo interno para congregar a população em torno de um líder supostamente forte (refira-se, a talhe de foice, que expressões como «população» e «opinião pública», relevantes da geografia, da sociologia, da comunicação e do marketing político, calham melhor ao estilo deste governo que a palavra «cidadãos», relevante da política na sua vertente nobre). A segunda política de aparente ruptura foi, por um lado, uma política de «o que parece é», e por outro, uma política de favorecimento económico e político a diversas clientelas. Refiro-me às chamadas reformas, tecnológicas ou administrativas, que não tiveram nem estão a ter outro efeito que não seja dar dinheiro a ganhar aos parceiros do «Centrão» no regime de «crony capitalism» que se está a consolidar no nosso país. Vejam-se, a título de exemplo, as manigâncias com o Magalhães e as adjudicações referentes à requalificação do parque escolar - negócios de muitos milhões a que só alguns eleitos têm acesso. Noutra vertente, a política, o novo modelo de gestão veio satisfazer os apetites de caciques locais, de quem se espera agora, como contrapartida, um maior empenho político no enraizamento do PSD e do PS por via da multiplicação de comissariados políticos. De tudo isto, só a melhoria das condições de conforto nas escolas se poderá traduzir num melhor ensino, mas mesmo assim muito menos do que aconteceria se os projectos de engenharia e arquitectura tivessem sido distribuídos a mais empresas e mais pequenas, de um modo mais transparente, e obedecendo a cadernos de encargos na elaboração dos quais tivessem participado os profissionais no terreno, que são quem melhor sabe o que faz falta. Mas a melhoria do ensino nunca fez parte dos objectivos destas políticas; e mesmo a melhoria da «educação» foi, quando muito, um objectivo subsidiário. Se as reformas e as rupturas tiveram origens e perseguiram objectivos exteriores ao sistema educativo, as políticas de continuidade nasceram dentro do sistema e tiveram como objectivo agir sobre ele. Maria de Lurdes Rodrigues nunca rompeu com o gigantismo do seu Ministério, nunca afrontou os interesses duma burocracia que tem que produzir sempre mais leis e regulamentos, sem cuidar da sua qualidade, utilidade, coerência ou racionalidade, para manter os empregos (nos escalões mais baixos da hierarquia) ou o poder (nos escalões mais altos). Manteve, sem quaisquer modificações, uma política de manuais escolares que não serve os alunos, os pais ou os professores, mas se enquadra perfeitamente nos interesses dos editores e livreiros. Promoveu e reforçou as correntes pedagogistas mais convenientes ao interesse das Escolas Superiores de Educação (ESSE’s) privadas. Na sua complacência criminosa com o gigantismo burocrático, com o delírio pedagógico e com o incivismo que grassa nas escolas, Maria de Lurdes Rodrigues não se distinguiu substancialmente de muitos dos seus antecessores. A diferença decisiva está em que estes, embora criados no caldo de cultura das ESE's e do sociologismo, tinham ligações culturais e conceptuais ao exterior deste mundo, ligações estas que lhes permitiam reconhecer pelo menos a existência de algo para além dele. Maria de Lurdes Rodrigues, pelo contrário, só existe neste pequeno mundo e não acredita que haja alguma coisa fora dele. E, não conhecendo outro mundo, também não conhece o seu. Nunca afrontaria a «Nomenklatura» tecnoburocrática do seu ministério porque nem sequer se dá conta da sua existência - tal como um peixe não se dá conta da água. Por isso foi capaz de assinar um Estatuto da Carreira Docente em que as palavras «ensino» e «ensinar» não aparecem uma única vez - nem sequer na parte em que são enumeradas as vinte e nove tarefas e competências dos professores. O que deixa Maria de Lurdes Rodrigues para o futuro? Que dirá dela a História? Dirá, provavelmente, que introduziu mais irracionalidade num sistema que já era irracional. Que se propôs recompensar os bons professores e penalizar os maus, mas impôs para isso uma ferramenta que tem precisamente o efeito oposto. De futuro, se se mantiver o sistema de avaliação e de carreiras que inventou (ou foi copiar ao Chile), os professores beneficiados serão os mais burocratas, os mais carreiristas, os mais chico-espertos, os mais ignorantes, e sobretudo os mais integrados nas redes locais e nacionais de tráfico de influências. Dirá a História, provavelmente, que foi ela quem abriu aos bárbaros as portas da cidade, entregando nas mãos dos «Isaltinos» e dos «Ferreira Torres» uma das últimas instituições públicas portuguesas que ainda estavam relativamente imunes ao caciquismo e à corrupção. Se a civilização é, como se diz, uma corrida entre a escola e a barbárie, Maria de Lurdes Rodrigues será a ministra que pôs peias e freios à escola. Não foi ministra da educação, foi ministra da barbárie.”
José Luiz Sarmento (professor), do blogue “As Minhas Leituras

sábado, 8 de agosto de 2009

Lei da “valorização da sexualidade”…

A Lei nº 60/2009, de 6 de Agosto, “estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar.” Futuramente, aquando da regulamentação da dita (tarefa que deverá competir ao Governo, no prazo de 60 dias) saberemos se esta “aplicação da educação sexual em meio escolar” será uma aplicação prática, com direito a grelha de registo de observações, ou uma aplicação teórica, com direito a testes e (eventualmente) a exame nacional. No artigo 2º da citada lei, pode ler-se: “Constituem finalidades da educação sexual: a) A valorização da sexualidade e afectividade entre as pessoas no desenvolvimento individual, respeitando o pluralismo das concepções existentes na sociedade portuguesa;” “Valorizar a sexualidade”? Haverá lugar à atribuição de uma classificação? E médias nacionais? “Pluralismo de concepções”? Preciso de formação… “b) O desenvolvimento de competências nos jovens…” Hum… Para testar e “valorizar” “competências” tem (mesmo) de haver avaliação prática. “c) A melhoria dos relacionamentos afectivo-sexuais dos jovens;” Só entre os jovens? Protesto. Isto é descriminação com base na idade. “(…) h) A promoção da igualdade entre os sexos;” “Igualdade entre os sexos”? Não quereriam dizer, igualdade entre pessoas de sexo diferente? Não? Retiro o protesto anterior e a necessidade de formação. Fica só para os “jovens” e não se fala mais nisso.
O legislador prossegue depois, grafando em letra de lei mais alguns fetiches, como: o “projecto de educação sexual da turma” (artigo 7º); a criação em cada escola, da “equipa interdisciplinar da educação sexual” com o respectivo “professor-coordenador” (artigo 8º); culminando com a pérola do número 1 do artigo 11º, onde se institui o dever de estudantes e encarregados de educação terem um papel activo na concretização das finalidades da lei.
E pronto, para já é isto. Para um sexo mais educado e mais valorizado, com competências mais desenvolvidas, é favor aguardar a publicação da regulamentação da lei supra.
Apache, Agosto de 2009

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Espelho meu, espelho meu… Há alguém mais mentiroso do que eu?

Como é do domínio público, o Primeiro-Ministro reuniu na passada segunda-feira (27 de Julho), por volta das 17:30, na cantina da LX Factory (em Lisboa) com 20 escritores de blogues. Quem quisesse participar, inscrevia-se previamente e esperava pela selecção, que, como é óbvio, escolheria maioritariamente gente próxima do Partido Socialista [como exemplo os blogues: “Jugular”, onde escreve a namorada do senhor José Sousa; “Simplex” blogue de apoio à campanha socialista, “País Relativo”, etc.] e meia dúzia de críticos moderados (com uma ou outra excepção), para dar a tradicional ideia de pluralidade, à “coisa”. Dos vários assuntos abordados, o vídeo abaixo, da autoria do professor Maurício Brito [publicado no blogue “A Educação do Meu Umbigo” (de Paulo Guinote)], destaca a pergunta do participante Tiago Moreira Ramalho, do blogue “O Afilhado”, sobre o número de professores avaliados em 2008, apresentado pela Secretaria de Estado da Administração Pública; assunto abordado por mim, no ‘post’ anterior. Atente-se, nas afirmações do senhor José Sousa: “Eu não tenho a certeza deste número, mas se não for este é parecido.” Refere-se aos 160 174 funcionários do Ministério da Educação, alegadamente avaliados em 2008 (86,5% do total), quando, na melhor das hipóteses, foram avaliados 48 571 (27,74% do total). “Estes números estão fresquinhos.” Como os números apresentados se referem a 2008, deduzo que tenham sido conservados no gelo. “Esta avaliação é a primeira vez que se faz. É a primeira, não tem antecedente histórico.” Falha grave de memória. A avaliação de professores foi suspensa por este Governo, em finais de Agosto de 2005, aquando do congelamento da progressão na carreira. Antes, a avaliação docente decorria desde 1998, ao abrigo do Decreto Regulamentar nº 11/98, de 15 de Maio, que substituiu o anterior diploma que regia a dita avaliação, o Decreto Regulamentar nº 14/92, de 4 de Julho. Destaco também o facto de, aos 2 minutos e 24 segundos (do vídeo), quando o senhor Sousa se apresentava algo atrapalhado, o participante, Hugo Santos Mendes [que curiosamente não consta da lista de participantes previamente fornecida, que escreve nos já citados blogues: “Simplex” e “País Relativo”], assessor da senhora Ministra da Educação, se levantar do lugar e segredar algo ao Primeiro-Ministro. A partir desse momento mágico, o senhor Sousa numa volta de 180º face ao que havia dito, afirma: “Eu não sei responder a esses números. Não sei de que é que está a falar.” Mais comentários, para quê?

Apache, Julho de 2009

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Sai um Plano de Apoio a Matemática…

A “Lusa” fez circular ao início da tarde de hoje, uma notícia (não assinada) que revela bem o tipo de jornalismo acrítico e subserviente aos interesses políticos, tão em voga na comunicação social portuguesa. Lê-se, na notícia veicula pela “Lusa, entretanto difundida por vários órgãos de comunicação social, que segundo um relatório da Comissão Europeia, divulgado hoje, “os professores portugueses em final da carreira são os mais bem pagos da União Europeia atendendo ao nível de vida do país”. Acrescentando: “se o salário bruto de um professor português no início da sua carreira é de 97,3 por cento do PIB per capita (indicador do nível de vida de um país), essa percentagem aumenta para 282,5 por cento no final dos seus anos de trabalho, de longe o valor mais elevado dos países analisados.”
Ponto 1 – Quem escreve a notícia, ou é muito distraído, ou não sabe que o Produto Interno Bruto (PIB) de um país não é um “indicador do nível de vida”, mas um dos vários indicadores sobre os quais é possível teorizar sobre o estado da economia. A título de exemplo, nas Bermudas, cujo PIB per capita é superior a 70 mil dólares (o 4º maior do mundo) mais de 3 vezes o português e 50% acima do norte-americano, cerca de 20% da população vive abaixo do limiar da pobreza, tal qual em Portugal.
Ponto 2 – Os números divulgados, referentes a Portugal, estão errados. Claro que o erro, provavelmente não é do autor da notícia mas sim dos autores do relatório. No entanto, tratando-se de números públicos, facilmente verificáveis através da internet (por exemplo), só a avidez pelo sensacionalismo pode justificar a falta de contraditório ao arrazoado debitado de Bruxelas.
Ponto 3 – Não é referido na notícia, se os valores apresentados são líquidos ou brutos e isso altera significativamente as possíveis conclusões dos leitores.
Ponto 4 – A comparação de vencimentos entre as várias profissões, num mesmo país, ou em função do custo de vida, entre países, faz bem mais sentido que a comparação destes com o PIB. Tal comparação torna-se, em muitos casos, ridícula. Atente-se, a título de exemplo, ao PIB per capita de Lisboa, cerca de 36 mil euros, e ao de Viana do Castelo, cerca de 10 400 €. Fará sentido, um professor de Lisboa, com idênticas habilitações e idêntico tempo de serviço, ganhar três vezes e meia mais que um docente em Viana do Castelo?
É por demais evidente, que se quer fazer passar a ideia, anteriormente repetida ‘ad nauseum’ pelos dirigentes do Ministério da Educação que os professores portugueses são bastante bem pagos, por comparação com os seus congéneres da União Europeia. Tal não corresponde à verdade. A generalidade dos professores portugueses aufere salários líquidos bem abaixo da média europeia, nem outra coisa seria de esperar, pois o mesmo acontece com a generalidade das profissões. Apenas no topo da carreira, os vencimentos ultrapassam ligeiramente a média europeia, no entanto, esse topo de carreira é atingido, na generalidade, com mais anos de serviço.
Em jeito de correcção aos valores apresentados na notícia (e alegadamente no relatório de Bruxelas) deixo os números de 2008 (neste ano, o PIB nacional per capita foi de 15 641,65 € - Fonte INE):
Vencimentos ilíquidos:
Escalão mais baixo (contratados) – índice 89 – 786,52 €/mês – 11 011,28 €/ano – 70,4% do PIB
Escalão mais alto – índice 340 – 3 004,68 €/mês – 42 065,52 €/ano – 268,9% do PIB
Vencimentos líquidos:
Mais baixo (solteiro s/ filhos) – 648,88 €/mês – 9 084,32 €/ano – 58,1% do PIB
Mais alto (casado 4 ou + filhos) – 2 208,44 €/mês – 30 918,16 €/ano – 197,7% do PIB
Alguém quer comparar com outras profissões de formação académica superior, em Portugal ou noutro país da União Europeia?
Apache, Julho de 2009

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Dona Flor e seus dois maridos

A propósito das críticas tecidas por António Barreto, no “Público” de ontem, às políticas educativas seguidas pela cúpula dirigente do respectivo ministério, o professor Manuel Brás, do blogue “Amêijoa Fresca” resume assim, a acção da tutela:
"À lenta deriva inicial, segue-se o rápido afundamento, da política demencial regulamento atrás de regulamento. A ideia de facilidade é democrática e igualitária, é esta a moralidade de uma política segmentária! Com base na autoridade do mais puro despotismo, tamanha é a imbecilidade deste ignóbil autismo! As oportunidades perdidas desta bandeira educativa, pois as pessoas foram iludidas pela propaganda governativa. Esta triste realidade, com milhões desperdiçados, é feita de futilidade e de diplomas amassados! Sem retorno tangível para o resto da sociedade, esta política fungível dilacera até à saciedade! Mais que esfarrapada, o ridículo simplista, a justificação empapada da educação socialista. Tamanha é a coragem desta ridícula postura, a educação é uma miragem com esta falta de cultura! Os despojos educativos desta política miserável, são ademais elucidativos da podridão deplorável." [Manuel Brás]
Apache, Julho de 2009

domingo, 7 de junho de 2009

O novo paradigma da educação

[ Cliquem na imagem para ampliar]
Apache, Junho de 2009

segunda-feira, 25 de maio de 2009

O manual dos aberrantes

António Barreto, a propósito do “Manual de Aplicadores” que o Ministério da Educação (ME) decidiu editar, há alguns anos, destinado a ser lido nas salas de aula aquando da realização das provas de aferição do 4º e 6º ano de escolaridade, aproveita para fazer um balanço deste último ano de Lurdes Rodrigues à frente do ME, escrevendo assim no “Público” de ontem: «A publicação, pelo Ministério da Educação, do “Manual de Aplicadores” não passou despercebida. Vários comentadores se referiram já a essa tão insigne peça de gestão escolar e de fino sentido pedagógico. Trata-se de um compêndio de regras que os professores devem aplicar nas salas onde se desenrolam as provas de aferição de Português e Matemática. Mais preciso e pormenorizado do que o manual de instruções de uma máquina de lavar a roupa. Mais rígidos do que o regimento de disciplina militar, estes manuais não são novidade. Podem consultar-se os dos últimos quatro anos. São essencialmente iguais e revelam a mesma paranóia controladora: a pretensão de regulamentar minuciosamente o que se diz e faz na sala durante as provas. Alguns exemplos denotam a qualidade deste manual: “Não procure decorar as instruções ou interpretá-las, mas antes lê-las exactamente como lhe são apresentadas ao longo deste Manual”. “Continue a leitura em voz alta: Passo agora a ler os cuidados a terem ao longo da prova. (...) Estou a ser claro(a)? Querem fazer alguma pergunta?”. “Leia em voz alta: Agora vou distribuir as provas. Deixem as provas com as capas para baixo, até que eu diga que as voltem”. “Leia em voz alta: A primeira parte da prova termina quando encontrarem uma página a dizer PÁRA AQUI! Quando chegarem a esta página, não podem voltar a folha; durante a segunda parte, não podem responder a perguntas a que não responderam na primeira parte. Querem perguntar alguma coisa? Fui claro(a)?”. Além destas preciosas recomendações, há dezenas de observações repetidas sobre os apara-lápis, as canetas, o papel de rascunho, as janelas e as portas da sala. Tal como um GPS (“Saia na saída”), o Manual do Aplicador não esquece de recomendar ao professor que leia em voz alta: “Escrevam o vosso nome no espaço dedicado ao nome”. Finalmente: “Mande sair os alunos, lendo em voz alta: Podem sair. Obrigado(a) pela vossa colaboração”! A leitura destes manuais não deixa espaço para muitas conclusões. Talvez só duas. A primeira: os professores são atrasados mentais e incompetentes. Por isso deve o esclarecido ministério prever todos os passos, escrever o guião do que se diz, reduzir a zero quaisquer iniciativas dos professores, normalizar os procedimentos e evitar que profissionais tão incapazes tenham ideias. A segunda: a linha geral do ministério, a sua política e a sua estratégia estão inteiras e explícitas nestes manuais. Trata os professores como se fossem imaturos e aldrabões. Pretende reduzi-los a agentes automáticos. Não admite a autonomia. Abomina a iniciativa e a responsabilidade. Cria um clima de suspeição. Obriga os professores a comportarem-se como “robots”. A ser verdadeira a primeira hipótese, não se percebe por que razão aquelas pessoas são professores. Deveriam exercer outras profissões. Mesmo com cinco, dez ou vinte anos de experiência, estes professores são pessoas de baixa moral, de reduzidas capacidades intelectuais e de nula aptidão profissional. O ministério, que os contratou, é responsável por uma selecção desastrada. Não tem desculpa. Se a segunda for verdade, o ministério revela a sua real natureza. Tem uma concepção centralizadora e dirigista da educação e da sociedade. Entende sem hesitação gerir directamente milhares de escolas. Considera os professores imbecis e simulados. Pretende que os professores sejam funcionários obedientes e destituídos de personalidade. Está disposto a tudo para estabelecer uma norma burocrática, mais ou menos “taylorista”, mais ou menos militarizada, que dite os comportamentos dos docentes. O ano lectivo chega ao fim. Ouvem gritos e suspiros. Do lado, do ministério, festeja-se a “vitória”. Parece que, segundo Walter Lemos, 75 por cento dos professores cumpriram as directivas sobre a avaliação. Outras fontes oficiais dizem que foram 57. Ainda pelas bandas da 5 de Outubro, comemora-se o grande “êxito”: as notas em Matemática e Português nunca foram tão boas. Do lado dos professores, celebra-se também a “vitória”. Nunca se viram manifestações tão grandes. Nunca a mobilização dos professores foi tão impressionante como este ano. Cá fora, na vida e na sociedade, perguntamo-nos: “vitória” de quem? Sobre quê? Contra quem? Esta ideia de que a educação está em guerra e há lugar para vitórias entristece e desmoraliza. Chegou-se a um ponto em que já quase não interessa saber quem tem razão. Todos têm uma parte e todos têm falta de alguma. A situação criada é a de um desastre ecológico. Serão precisos anos ou décadas para reparar os estragos. Só uma nova geração poderá sentir-se em paz consigo, com os outros e com as escolas. Olhemos para as imagens na televisão e nos jornais. Visitemos algumas escolas. Ouçamos os professores. Conversemos com os pais. Falemos com os estudantes. Toda a gente está cansada. A ministra e os dirigentes do ministério também. Os responsáveis governamentais já só têm uma ideia em mente: persistir, mesmo que seja no erro, e esperar sofridamente pelas eleições. Os professores procuram soluções para a desmoralização. Uns pedem a reforma ou tentam mudar de profissão. Outros solicitam transferência para novas escolas, na esperança de que uma mudança qualquer engane a angústia. Há muitos professores para quem o início de um dia de aulas é um momento de pura ansiedade. Foram milhares de horas perdidas em reuniões. Quilómetros de caminho para as manifestações. Dias passados a preencher formulários absurdos. Foram semanas ocupadas a ler directivas e despachos redigidos por déspotas loucos. Pais inquietos, mas sem meios de intervenção, lêem todos os dias notícias sobre as escolas transformadas em terrenos de batalha. Há alunos que ameaçam ou agridem os professores. E há docentes que batem em alunos. Como existem estudantes que gravam ou fotografam as aulas para poderem denunciar o que lá se passa. O ministério fez tudo o que podia para virar a opinião pública contra os professores. Os administradores regionais de educação não distinguem as suas funções das dos informadores. As autarquias deixaram de se preocupar com as escolas dos seus munícipes porque são impotentes: não sabem e não têm meios. Todos estão exaustos. Todos sentem que o ano foi em grande parte perdido. Pior: todos sabem que a escola está, hoje, pior do que há um ano.» Quanto às orientações emanadas deste “Manual de Aplicadores”, são tão ridículas que penso que a maioria dos colegas do 1º e do 2º ciclo que vigiaram provas de aferição tiveram o bom senso de o não ler. As instruções (formais) necessárias à realização das provas poderiam (e deveriam) ter sido dadas de modo semelhante às instruções de exame, evitando que os professores fizessem, em frente dos alunos, figuras de atrasados mentais. Ademais, a ter-se por obrigatória a leitura (em voz alta) do manual que não contém orientações programáticas nem curriculares, tal constitui negação do direito (dos docentes) plasmado na alínea c) do nº 2 do artigo 5º e, no nº 1 do artigo 35º do Estatuto da Carreira Docente, no que à participação no processo educativo diz respeito. Ora tal interpretação (ofensiva de direitos legalmente protegidos) não pode ter-se por verdadeira, pois, tal como sabemos, “a lei é para cumprir”. (Lurdes Rodrigues dixit). Quanto à actuação da Senhora Ministra nestes últimos dias, mais não foi que a continuação da sua acção anterior. Maria de Lurdes Rodrigues tem o dom de destruir tudo à sua passagem, não que o que houvesse antes fosse algo de bom, porque Ana Benavente (enquanto Secretária de Estado) e David Justino (o anterior ministro) já haviam promovido verdadeiros ataques cirúrgicos à qualidade do sistema de ensino, mas esta senhora ficará na história não como mera réplica mas como onda principal do terramoto que nos últimos anos se tem abatido sobre as faculdades da escola pública.
Apache, Maio de 2009

domingo, 24 de maio de 2009

Do episódio de Espinho…

Tenho assistido com alguma incredulidade aos comentários que muitos professores têm feito, sobre a notícia que abriu há dias o “Jornal da Noite” da SIC. Falo da célebre gravação de parte de uma aula da disciplina de História, por duas alunas de uma turma do 7º ano de escolaridade (do Agrupamento de Escolas Sá Couto, em Espinho), instigadas pelas respectivas mães. É habitual neste tipo de assuntos, que a opinião pública, ávida de romances de cordel, tome partido da acusação, principalmente (como aparentemente parecia ser o caso) quando adolescentes são confrontados com uma conversa sobre sexo, numa aula de História. A tendência para o julgamento imediato, sem possibilidade de defesa dos acusados é o predilecto dos indivíduos de baixa formação. Mas (pasme-se) neste caso, chegou de onde menos se esperava, de muitos outros professores... Pergunto se as “virgens ofendidas” com o discurso (excessivamente irritado e por vezes grosseiro da docente), o estão pelo facto de a professora ter falado de sexo após ostensiva provocação dos alunos, ou pelo facto de conservadoramente ter criticado a promiscuidade sexual de alguns alunos da turma e a falta de educação que (pelo menos) uma encarregada de educação lhe havia mostrado? Será que, se em vez de criticar as práticas das alunas, a professora tivesse distribuído preservativos e pílulas do dia seguinte, numa antecipação aos ditames da professorinha (chefe) da “5 de Outubro” a SIC abriria com essa notícia o seu “Jornal da Noite” e as “virgens” calariam a ofensa?
Alguns (alegados) factos com comentários telegráficos: A professora condenou algumas práticas sexuais das alunas - Devia tê-lo feito em particular (com as alunas em causa) evitando expor a toda a turma, informações privilegiadas sobre a intimidade de algumas; A professora exagerou no volume de voz - Estava tão irritada com a insistência dos alunos no tema (sexo) que nem se apercebeu que o silêncio deles (absolutamente invulgar numa aula de 7º ano, ainda para mais numa turma mal comportada) denunciava algo premeditado; A professora falou de orgias - Referia-se aos Romanos (nomeadamente durante a governação de Nero), tema enquadrado no programa do 7º ano, de História; A professora lembra aos alunos que é ela quem corrige os testes - Constatação de um facto que descontextualizado como está (devido aos constantes cortes (feitos pela SIC) à sequência da gravação) é susceptível de poder ser interpretada como uma ameaça de penalização aos alunos; A Presidente do Conselho Executivo (PCE) instaurou Processo Disciplinar à docente - Atitude adequada ao apuramento da verdade dos factos; A PCE ou a Directora Regional de Educação do Norte (as notícias são contraditórias) suspendeu a professora - De acordo com o disposto no actual Estatuto Disciplinar (Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro), parece-me uma atitude excessivamente precipitada, no entanto, desconhecendo a fundamentação do acto (que se encontra em segredo de justiça) fica o benefício da dúvida; As alunas (menores de idade) gravaram a aula sem autorização (sequer conhecimento) da professora - Sem prejuízo de outros factos que lhes possam ser imputados, incumpriram os deveres previstos nas alíneas e), g), i), o) e q) do artigo 15º do Estatuto do Aluno (Lei nº 3/2008, de 18 de Janeiro) e provavelmente mais alguns previstos no Regulamento Interno do Agrupamento; As mães das alunas, não só instigaram a gravação e (ao que parece) ajudaram a preparar as interrogações à professora, como a enviaram à SIC - (A provar-se) Instigaram e fizeram a apologia do crime previsto no artigo 199º do Código Penal, cometendo assim os crimes previstos nos artigos 297º e 298º do mesmo.
Não querendo alongar-me nos comentários até que se conclua o processo disciplinar em curso, deixo apenas mais uma questão: Em que escola (de que país) leccionam os colegas que criticaram (e por vezes ofenderam grosseira) cega e descontextualizadamente (muitos sem ouvirem a manipulada gravação), em vários blogues de professores, o comportamento da professora sem, com proporcional indignação, condenarem a atitude reprovável das alunas e, mais ainda, dos respectivos encarregados de educação?
Apache, Maio de 2009

quarta-feira, 13 de maio de 2009

O Ministério da Certificação

Em jeito de balanço à actuação da pior ministra da educação, simultânea ao mais vil governo de Portugal, Santana Castilho, com a frontalidade que o caracteriza, escreve assim a Maria de Lurdes Rodrigues…
Carta aberta à Ministra da Educação
"Senhora ministra:
Dentro de poucos meses partirá para um exílio dourado. Obviamente que partirá, seja qual for o resultado das eleições. É tempo de lhe dizer, com frontalidade, e antes que o ruído da campanha apague o meu grito de revolta, como a considero responsável por quatro anos de Educação queimada. Este qualificativo metafórico ganhará realismo à medida que aqui for invocando os falhanços mais censuráveis, alguns apenas, dos muitos que fazem de si, politicamente, uma predadora do futuro da escola pública. Se se sentir injustiçada, tenha a coragem de marcar o contraditório, cara a cara, onde e quando quiser, perante professores, alunos, pais e demais cidadãos votantes. Por uma vez, sairia do ciclo propagandístico em que sempre se moveu.
A senhora ministra falhou estrondosamente com o sistema de avaliação do desempenho dos professores, a vertente mais mediática da enormidade a que chamou estatuto de carreira. A sua intenção não foi, nunca, como lhe competia, dignificar o exercício de uma profissão estratégica para o desenvolvimento do país. A senhora anda há um ano a confundir classificação do desempenho com avaliação do desempenho e demonstrou ignorar o que de mais sério existe na produção teórica sobre a matéria. Permitiu e alimentou mentiras inomináveis sobre o problema. O saldo é claro e incontestável: da própria aberração técnica que os seus especialistas pariram nada resta. Terá os professores classificados com bom, pelo menos, exactamente o que criticava quando começou a sua cruzada, ridiculamente fundamentalista. A que preço? Coisa difícil de quantificar. Mas os cacos são visíveis e vão demorar anos a reunir: o maior êxodo de todos os tempos de profissionais altamente qualificados; a maior fraude de que há memória quando machadou com critérios de vergonha carreiras de uma vida; o retorno à filosofia de que o trabalho é obrigação de escravos. Não tem vergonha desta coroa? Não tem vergonha de vexar uma classe com a obrigação de entregar objectivos individuais no fim do ano, como se ele estivesse a começar? Acha sério mascarar de rigor a farsa que promoveu?
A senhora ministra falhou quando fez aprovar um modelo de gestão de escolas, castrador e centralizador. Não repito o que então aqui escrevi. Ainda os directores estão a chegar aos postos de obediência e já os factos me dão razão. Invoco o caso do Agrupamento de Santo Onofre, onde gestores competentes e legalmente providos foram vergonhosamente substituídos; lembro-lhe a história canalha de Fafe, prenúncio caricato de onde nos levará a municipalização e a entrega da gestão aos arrivistas partidários; confronto-a com o silêncio cúmplice sobre a suspensão arbitrária de um professor em Tavira, porque o filho do autarca se magoou numa actividade escolar, sem qualquer culpa do docente. Dá-se conta que não tem qualquer autoridade moral para falar de autonomia das escolas?
A senhora ministra falhou quando promoveu a escola que não ensina. Mostre ao país, a senhora que tanto ama as estatísticas, quanto tempo se leva hoje para fazer, de uma só tirada, os 7.º, 8.º e 9.º anos e, depois, os 10.º, 11.º e 12.º. E sustente, perante quem conhece, a pantomina que se desenvolveu à volta do politicamente correcto conceito de escola inclusiva, para lá manter, a qualquer preço, em ridículas formações pseudoprofissionais, os que antes sujavam as estatísticas que a senhora oportunistamente branqueou. Ouse vir discutir publicamente a demagogia de prolongar até aos 18 anos a obrigatoriedade de frequentar a escola, no contexto do país real e quando estamos ainda tão longe de cumprir o actual período compulsivo, duas décadas volvidas sobre o respectivo anúncio. Do mesmo passo, esclareça (ainda que aqui a responsabilidade seja partilhada) que diferenças existem entre o anterior exame ‘ad hoc’ e o pós-moderno "mais de 23", para entrar na universidade. Compreendo, portanto, que no pastel kafkiano a que chamou estatuto de carreira não se encontre o vocábulo ensinar. Lá nisso, reconheço, foi coerente. Só lhe faltou mudar o nome à casa onde pontifica. Devia chamar-se agora, com propriedade, Ministério da Certificação e das Novas Oportunidades. Não tem remorsos?
A senhora ministra falhou rotundamente quando promoveu um estatuto do aluno que não ajuda a lidar com a indisciplina generalizada; quando deu aos alunos o sinal de que podem passar sem pôr os pés nas aulas e, pasme-se, manifestou a vontade de proibir as reprovações, segundo a senhora, coisa retrógrada. A senhora ministra falhou quando defendeu uma sociedade onde os pais não têm tempo para estar com os filhos. A senhora ministra falhou quando permitiu, repetidas vezes, que crianças fossem usadas em actividades de mera propaganda política. A senhora ministra falhou quando encomendou e pagou a peso de ouro trabalhos que não foram executados, para além de serem de utilidade mais que duvidosa. Voltou a falhar quando deslocou para os tribunais o local de interlocução com os seus parceiros sociais, consciente de que o Direito nem sempre tem que ver com a Justiça. Falhou também quando baniu clássicos da nossa literatura e permitiu a redução da Filosofia. Falhou ainda quando manipulou estatisticamente os resultados escolares e exibiu os que não se verificaram. Falhou igualmente quando votou ao abandono crianças deficientes e professores nas vascas da morte. Falhou, por fim, quando se deixou implicar no logro do falso relatório da OCDE e no deslumbramento saloio do Magalhães.
Por tudo isto e muito mais que aqui não cabe, a senhora é, em minha opinião, uma ministra falhada. Parte sem que eu por si nutra qualquer espécie de respeito político ou intelectual. Santana Castilho, Professor do ensino superior" [no “Público” de hoje.]
Apache, Maio de 2009

terça-feira, 21 de abril de 2009

Prostituição (intelectual) de luxo

“É conferida permissão genérica de condução de viaturas oficiais afectas à Secretaria-Geral do Ministério da Educação ao presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores, Prof. Doutor José Alexandre da Rocha Ventura Silva” [nº 1 do Despacho 9809/2009, de 9 de Abril]. “É atribuído ao presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores, Prof. Doutor José Alexandre da Rocha Ventura Silva, um subsídio mensal de residência no montante de € 941,25 (…)” [nº 1 do Despacho 9810/2009, de 9 de Abril]. Alexandre Ventura, além destas mordomias, aufere o vencimento correspondente a professor auxiliar na Universidade de Aveiro (a tempo parcial), que acumula com o de presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores (CCAP) (cargo com igual remuneração que o de Director-Geral), além de assinar relatórios mais que duvidosos validadores das políticas do ME, como este a que me referi a 27 e a 29 de Janeiro passado. O CCAP reuniu 7 vezes desde a sua constituição, pelo que o seu presidente se desloca a Lisboa (no âmbito destas funções), em média, não mais que uma vez por mês. O “artista” (segundo o “Correio da Manhã”) já em 2007 havia acumulado com a docência, funções de Subdirector-Geral da Educação e várias participações em eventos relacionados com a presidência portuguesa da União Europeia.
Apache, Abril de 2009

domingo, 19 de abril de 2009

Em Peso da Régua, a novela continua

Em texto que publiquei a 28 de Fevereiro de 2009-04-19 contei (de forma resumida) as peripécias que até àquela data haviam envolvido as eleições para o órgão de gestão da Escola Secundária Doutor João de Araújo Correia, em Peso da Régua. Entretanto houve novos desenvolvimentos e a novela parece longe do fim. No passado dia 27 de Março foi finalmente cumprida a sentença do Supremo Tribunal Administrativo, com a realização (ainda ao abrigo do (agora já revogado) Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio) das eleições para o Conselho Executivo (CE) daquele estabelecimento de ensino. A lista que havia desencadeado a contestação foi a mais votada mas ficou longe da maioria absoluta dos votos entrados nas urnas, condição necessária, de acordo com nº 2 do artigo 20º do supra citado diploma, para ser considerada eleita. Assim, em cumprimento do prescrito no nº 3 do mesmo artigo, realizou-se nova eleição a 27 de Março, tendo a mesma lista saído vencedora. A 31 de Março, tomaram (finalmente) posse os elementos eleitos. No entanto, já antes, a 18 de Março, o Conselho Geral Transitório (órgão entretanto eleito ao abrigo do novo diploma de gestão escolar (Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de Abril)) havia publicado em Diário da República (DR) o Aviso (5720/2009) de Abertura do concurso para recrutamento do director. Na passada sexta-feira (18 de Abril) o Conselho Geral Transitório (CGT) fez publicar em DR mais dois avisos: um (8366-A/2009) que declarava sem efeito o anterior e outro, (8366-B/2009) que reabre a partir da próxima segunda-feira (20 de Abril) procedimento que visa o recrutamento do director que substituirá o CE eleito há apenas três semanas. Com este acto, o CGT violou o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 61º e, no nº 2 do artigo 63º, ambos, do Decreto-Lei nº 75/2008. Respondendo a mais este atropelo ao legalmente instituído, o CE interpôs (no mesmo dia) no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, uma Providência Cautelar que visa suspender a eficácia do acto do CGT.