sábado, 14 de fevereiro de 2009

A Enron e a máquina por trás de Quioto

“Um dos advogados da Enron (gigante americana do sector da electricidade, gás natural e comunicações que faliu fraudulentamente em finais de 2001), Christopher Horner, publicou recentemente um livro (Red Hot Lies) onde revela detalhes sórdidos sobre o assunto. Christopher foi contratado para director de relações com o governo. Tinha como missão pôr de pé um tratado internacional contra o aquecimento climático. Aos primeiros contactos com especialistas, começou a aperceber-se e fê-lo notar aos seus superiores, que um plano dessa natureza tinha um suporte científico muito débil, que esse plano já tinha despertado o interesse de outros grandes grupos financeiros, mineiros e petrolíferos e, que o negócio lhe parecia assemelhar-se muito com a “Lei Seca” dos anos 20 e com os chorudos lucros dos contrabandistas de álcool. Disseram-lhe que não foi contratado para emitir opinião mas para trabalhar na encomenda. A Enron era a proprietária e a operadora de uma rede de gasodutos e pretendia com este tratado eliminar a concorrência das empresas extractoras de carvão. Tudo se baseava num sistema de créditos e penalizações sobre as emissões anuais de dióxido de carbono. A Enron estaria no centro do comércio de direitos e certificados de emissão. Para isso recrutou, como primeiro consultor, James Hansen do GISS, da NASA. Tinha sido este astrónomo quem impulsionara a fobia do aquecimento global em 1988, com o seu discurso vago mas grandiloquente perante o congresso americano. Amiúde, Hansen repete declarações apocalípticas sobre o aquecimento global, principalmente depois de ter falsificado os valores obtidos pelos satélites, que nos últimos 10 anos indicaram um arrefecimento do planeta. O segundo recrutado foi Al Gore que deveria (como bom actor) encarregar-se de difundir o alarmismo. Os filantropos da Enron não olharam a meios para comprar a boa vontade de outros políticos e fazedores de opinião. Só em apoios a grupos ecologistas, para venderem a ideia, foram pagos, no final dos anos 90, cerca de 1,5 milhões de dólares. A invenção prometia chorudos dividendos. Confiante na sua estratégia, após a assinatura do Protocolo de Quioto, a Enron comprou à General Electric, a GE Wind, que era na altura a maior eólica do mundo e, conjuntamente com a BP-Amoco tornou-se proprietária das maiores centrais solares. Em 2000, a Enron (que empregava 21 mil pessoas) facturou 101 mil milhões de dólares. Mas o lobby do carvão e alguns senadores com importantes negócios deram-se conta da gigantesca marosca, tendo a Enron perdido o negócio dos certificados de emissão. Em 2001, envolta em monumentais dívidas, a Enron declarou-se falida, arrastando consigo a consultora Arthur Andersen, a empresa de auditoria que tinha ajudado a esconder as dívidas. Mas, uma ideia genial como a do negócio dos certificados de emissão de dióxido de carbono não podia morrer. Ela, além de permitir turismo pago com o dinheiro dos contribuintes, a alegados peritos (e a inúmeros políticos e homens de negócios) entre o Rio de Janeiro, Quioto, Buenos Aires, Bali, Poznan e o mais que futuramente se verá, permite sobretudo arrecadar enormes fortunas a uns quantos oportunistas, cujo único mérito (e há que o reconhecer) foi impor a políticos, banqueiros e, imagine-se professores, um arrazoado de colossais asneiras de que se rirão as futuras gerações. Esperemos que o arrefecimento que se tem feito sentir, permita aos nossos governantes canalizar o nosso dinheiro para algo mais útil que encher os bolsos a mercenários de certificados de aparente boa conduta.” [Tradução minha]
Pierre Lutgen, Doutorado em Química
Luxemburgo, 11 de Dezembro de 2008

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Conclusões do parecer de Garcia Pereira

Às 15:50, terminava em Lisboa a conferência de imprensa dada pelo advogado Garcia Pereira e por um grupo de professores que, no exercício do direito de expressão e de livre pensamento exibiram com distinção, pública lição de cidadania. A todos os que entenderem útil, não só nas questões relacionadas com a avaliação docente mas, de uma forma geral, enquanto expositor (por analogia) da forma inconstitucional e atabalhoada como o Ministério liderado por Maria de Lurdes Rodrigues tem produzido leis, regulamentos e despachos, deixo (via “A Educação do Meu Umbigo”) as conclusões do parecer hoje integralmente divulgado.
«1ª O normativo contendo o sistema de quotas para a avaliação dos professores estabelecido e constituído pelas disposições conjugadas do artigo 46º, nº 3 do ECD, aprovado pelo Decreto-Lei nº 15/2007, de 19/1 e do Decreto Regulamentar nº 2/2008, em particular o seu artigo 21º, nº 5, deve reputar-se de ferido de múltipla inconstitucionalidade material, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade, da transparência, da justiça e da imparcialidade (artigos 13º, 266º, nº 2 da Constituição).
2ª Sendo o regime de avaliação dos professores claramente matéria de reserva de lei (em sentido amplo), e aliás constante do próprio ECD, em todos os pontos em que um Decreto Regulamentar disponha de forma diversa do estatuído naquele, ou interprete ou integre alguma das suas normas, ou venha criar regime jurídico novo, ele padecerá de inquestionável e incontornável ilegalidade, por força do artigo 112º, nº 1 da CRP.
3ª O específico regime (de alteração do ECD) consagrado no Decreto-Lei nº 15/2007, havendo sido produzido pelo Governo no âmbito de matéria de reserva pelo menos relativa de competência da Assembleia da República, por força do artigo 165º, nº 1, alíneas b) e t), mas sem estar a coberto da competente autorização legislativa, tem de ter-se por organicamente inconstitucional.
4ª Não constando do Decreto-Lei nº 15/2007, bem como de todos os diplomas legislativos e regulamentares subsequentes, que contêm inequivocamente matéria de “legislação do trabalho” a que se refere o artigo 56º, nº 2, alínea a) da CRP, a referenciação exacta e concreta de como e quais as associações sindicais que terão sido prévia e efectivamente ouvidas, mas apenas a declaração “tabelar” de que “foram observados os procedimentos da Lei nº 23/98, de 26/5″, todos esses diplomas se têm de ter formalmente inconstitucionais.
5ª Ao consubstanciar uma substancial inovação que representa um verdadeiro e próprio retrocesso ou desvalorização categorial dos professores, afectando os valores da segurança jurídica e da tutela das expectativas legítimas, alterando-lhes de forma tão drástica quanto inesperável e inesperada “as regras do jogo” no decurso do mesmo, tratando desigualmente e em função de critérios em absoluto aleatórios e arbitrários (v.g. o mero desempenho de cargos apenas nos últimos sete anos) situações substancialmente iguais e afectando de forma desproporcionada, desadequada e desnecessária o princípio da liberdade de escolha da profissão e acesso à Função Pública e de nelas permanecer e progredir, o regime constante do ECD com a nova redacção conferida pelo citado Decreto-Lei nº 15/2007 padece, também, de múltipla inconstitucionalidade material, por violação dos artigos 2º, 18º, 47º e 266º, nº 2 da CRP.
6ª Como o está também a solução normativa consubstanciadora das elevadíssimas percentagens do cumprimento das actividades lectivas exigidas para a obtenção de “Excelente” (95% no artigo 46º, nº 5 do ECD de 2007 e …. 100% no artigo 21º, nº 5 do Decreto Regulamentar nº 2/2008), ao menos se interpretada e aplicada no sentido de que qualquer docente que não cumpra actividade lectiva numa situação de força maior, de exercício de um direito ou de cumprimento de um dever que não é legalmente equiparado a serviço efectivo nos termos do artigo 103º do ECD é considerado em situação de incumprimento da actividade lectiva e, logo, gravemente prejudicado ou mesmo de todo impossibilitado no acesso àquela classificação.
7ª Todos os pontos em que os Decretos Regulamentares – (v.g. Decreto Regulamentar nº 1-A/2009) quando por exemplo vem inovar ou alterar o ECD, ao estabelecer que a avaliação científico-pedagógica, imprescindível nos termos do ECD na avaliação de todos os docentes, seria afinal apenas exigível para um certo universo mais reduzido de professores, que a avaliação dos membros do Conselho Executivo depende exclusivamente do seu Presidente e que este seja avaliado apenas pelo Director Regional da Educação - se e quando venham inovar ou alterar o regime constante do acto legislativo - têm de se ter por manifestamente ilegais, por violação do mesmo ECD, estando vedado a este, pelo artigo 112º, nº 5 da C.R.P., autorizar tais “inovações” ou “alterações” por via regulamentar.
8ª O artigo 10º do Decreto-Lei nº 200/2007 está em frontal contradição com a letra e a “ratio” do ECD de 2007 visto que este considera que a atribuição da categoria de professor titular com as suas funções acrescidas (v.g. de avaliação de outros professores) se fundamenta num critério de maior experiência acumulada e aquele vem impor a consideração de apenas os últimos sete anos lectivos, desvalorizando todos os restantes.
9ª O facto de constituírem factor de classificação do docente - independentemente da sua suspensão nesta fase - as classificações por ele atribuídas aos alunos é susceptível de representar um óbvio e inaceitável conflito de interesses, gerador de constitucionalmente inaceitáveis dúvidas objectivas acerca da imparcialidade do docente.
10ª Face quer ao ECD (maxime, o seu artigo 44º), quer aos subsequentes Decretos Regulamentares (seja ao nº 2/2008, seja ao nº 1-A/2009), forçoso é concluir que em lugar algum do regime jurídico se estatui a obrigação de apresentação pelo docente dos referidos objectivos individuais ou a consequência jurídica de que a não apresentação impossibilite o decurso do processo de avaliação, constitua infracção disciplinar e inviabilize a contagem do tempo de serviço do professor.
11ª Sendo que todos os comandos em matéria de entrega pelos professores dos objectivos individuais decorrentes dos Decretos Regulamentares que vão contra ou para além do estabelecido no ECD (designadamente quando sejam interpretados e aplicados como significando estatuir a obrigatoriedade daquela entrega) serão manifestamente ilegais, e uma vez que num Estado de direito, o Estado e toda a Administração Pública devem actuar em estrita obediência à lei (maxime, a lei constitucional), as únicas conclusões que se impõem retirar é que não apenas por parte dos professores nenhuma obrigação existe, fixada por norma legal válida, da apresentação dos respectivos objectivos individuais, como nenhuma consequência pode advir do incumprimento ou desobediência de um comando ou ordem ilegal, designadamente de ordem disciplinar (procedimento por pretensa violação do dever de obediência) ou outra (perda de tempo de serviço).
12ª Tal obrigação não poderá também considerar-se validamente constituída se os respectivos pressupostos fácticos e temporais não estiverem reunidos, sendo assim igualmente ilegítima a tentativa de imposição de que a definição dos objectivos individuais ocorra não no período inicial do ciclo de avaliação mas mais de cinco meses depois, e o mesmo se dizendo quanto à fixação e divulgação dos “instrumentos de registo” e dos “instrumentos de medida” a que se reportam os artigos 6º e 8º do Decreto Regulamentar nº 2/2008.
13ª Rigorosamente a mesma conclusão se impõe, e até por maioria de razão, se na Escola ou Agrupamento de Escola de todo não existirem, não houverem sido estabelecidos ou não tiverem sido disponibilizados aqueles mesmos “instrumentos”.
14ª Por fim, todo o “regime simplificado” estabelecido pelo Decreto Regulamentar nº 11/2008, representando uma alteração por via de fonte inferior à Lei do regime do ECD (maxime do seu artigo 44º), tem de se ter por manifestamente ilegal, o mesmo se devendo dizer dos artigos 2º, 5º e 7º do Decreto Regulamentar nº 1-A/2009.»
Apache, Fevereiro de 2009

Hoje é o primeiro dia...

Hoje, às 14 horas, na sala Milão do Hotel Altis (Rua Castilho, nº 11), o advogado (especialista em Direito do Trabalho) Garcia Pereira e o professor Paulo Guinote (editor do blogue “A Educação do Meu Umbigo") vão dar uma conferência de imprensa para apresentação pública do parecer jurídico elaborado por Garcia Pereira. Desta apresentação resultará clara na opinião do autor (do parecer) a inconstitucionalidade formal e material do Decreto-Lei nº 15/2007, de 19 de Janeiro (Estatuto da Carreira Docente), por violação dos artigos: 2º, 13º e 266º da Constituição da República Portuguesa (CRP), no que se refere à confiança e segurança jurídica e, aos princípios da igualdade, da imparcialidade e da justiça; bem como a inconstitucionalidade dos Decretos Regulamentares: 2/2008, de 10 de Janeiro e, 1-A/2009, de 5 de Janeiro, por violação dos artigos 112º e 165º da CRP, por ofensa à hierarquia das fontes de direito e por violação de reserva relativa de lei.
Apache, Fevereiro de 2009

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Há coisas fantásticas, não há?

Armando António Martins Vara é, provavelmente, o homem maravilha de que todos os portugueses se deviam orgulhar. No entanto, talvez por mau feitio, quem sabe, cada vez que olho para o “fabuloso” currículo do dito cujo, em vez de inveja, sinto apenas vontade de rir. É que o surrealismo da carreira profissional e política do “artista” supera mesmo os surrealismos científicos da moda. Armando Vara nasceu na aldeia de Lagarelhos, freguesia de Vilar de Ossos, Concelho de Vinhais (distrito de Bragança) em 1954. O seu passado escolar permanece um mistério (pelo menos para os lisboetas). Sabe-se apenas que aos 14 anos conseguiu o seu primeiro emprego numa loja de roupas em Bragança e que logo após o 25 de Abril de 1974 (com apenas 20 anos) se inscreveu no PS. A partir daí, a ascensão profissional e política de Vara foi meteórica. Passados dois anos já era membro da Assembleia Municipal de Bragança e pouco tempo depois tornou-se Presidente da Federação Distrital do PS. É no meio desta intensa actividade política que consegue emprego no balcão da dependência da Caixa Geral de Depósitos (CGD) no Mogadouro. Em 1983 ruma a Lisboa. Na capital foi membro dos corpos sociais do Instituto Luso - Árabe de Cooperação e membro da Direcção do Instituto da Imprensa Democrática. Em Outubro de 1985 foi eleito deputado à Assembleia da República, na IV Legislatura, tendo renovado os mandatos na V, VI e VII (que terminou em Outubro de 1999). Pelo meio, em acumulação com as funções de deputado, ficou: uma sociedade com José Sócrates, Fátima Felgueiras e outros na Sovenco (Sociedade de Venda de Combustíveis); o cargo de Vereador da Câmara Municipal da Amadora; o lugar de membro da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa; também o de membro da Assembleia Parlamentar da UEO; o cargo de Presidente do Conselho de Administração da Fundação José Fontana e, o cargo de Secretário de Estado da Administração Interna do XIII Governo Constitucional (que exerceu entre 1995 e 1999). Em Outubro de 1999 é nomeado Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro e em Setembro de 2000, Ministro da Juventude e do Desporto (ambos no XIV Governo, liderado por António Guterres). Em 2001, depois de deixar o Governo, envolto na polémica em torno da Fundação para a Prevenção e Segurança, regressa à CGD para ser Director-Coordenador de Segurança. Em 2004 (muito provavelmente sem que tenha concluído o ensino secundário), seguramente sem qualquer grau académico nem frequência de curso superior na área da gestão, conclui uma Pós-Graduação em Gestão Empresarial, no ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, onde Maria de Lurdes Rodrigues se licenciou em Sociologia, sem ter igualmente concluído o ensino liceal). Em 2005 a Universidade Independente (a mesma onde José Sócrates concluiu por fax e a um domingo a Licenciatura em Engenharia Civil) atribui-lhe (misteriosamente) o diploma de Licenciatura em Relações Internacionais. Dias depois é nomeado Administrador da CGD, Presidente do Conselho de Administração da IMOCAIXA, Presidente do Conselho de Administração do SOGRUPO, Vogal do Conselho de Administração da CAIXA PARTICIPAÇÕES e Vogal do Conselho de Administração da CAIXATEC, cargos que acumula a partir de 2006 com o de Vogal do Conselho de Administração da Portugal Telecom. Deixou todas estas tarefas em Janeiro de 2008 para ingressar no Millennium BCP, onde exerce actualmente 8 cargos de liderança de topo. Querem um conselho, quando forem grandes, digam que são amigos do Almeida Santos e inscrevam-se no PS e na Maçonaria.
Apache, Fevereiro de 2009

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

"Está bem... façamos de conta"

“Façamos de conta que nada aconteceu no Freeport. Que não houve invulgaridades no processo de licenciamento e que despachos ministeriais a três dias do fim de um governo são coisa normal. Que não houve tios e primos a falar para sobrinhas e sobrinhos e a referir montantes de milhões (contos, libras, euros?). Façamos de conta que a Universidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo. Façamos de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês. Façamos de conta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral de que, pelo que sabe, no Freeport está tudo bem e é em termos quid juris irrepreensível. Façamos de conta que aceitamos o mestrado em Gestão com que na mesma entrevista Freitas do Amaral distinguiu o primeiro-ministro e façamos de conta que não é absurdo colocá-lo numa das "melhores posições no Mundo" para enfrentar a crise devido aos prodígios académicos que Freitas do Amaral lhe reconheceu. Façamos de conta que, como o afirma o professor Correia de Campos, tudo isto não passa de uma invenção dos ‘média’. Façamos de conta que o "Magalhães" é a sério e que nunca houve alunos/figurantes contratados para encenar acções de propaganda do Governo sobre a educação. Façamos de conta que a OCDE se pronunciou sobre a educação em Portugal considerando-a do melhor que há no Mundo. Façamos de conta que Jorge Coelho nunca disse que "quem se mete com o PS leva". Façamos de conta que Augusto Santos Silva nunca disse que do que gostava mesmo era de "malhar na Direita" (acho que Klaus Barbie disse o mesmo da Esquerda). Façamos de conta que o director do Sol não declarou que teve pressões e ameaças de represálias económicas se publicasse reportagens sobre o Freeport. Façamos de conta que o ministro da Presidência Pedro Silva Pereira não me telefonou a tentar saber por "onde é que eu ia começar" a entrevista que lhe fiz sobre o Freeport e não me voltou a telefonar pouco antes da entrevista a dizer que queria ser tratado por ministro e sem confianças de natureza pessoal. Façamos de conta que Edmundo Pedro não está preocupado com a "falta de liberdade". E Manuel Alegre também. Façamos de conta que não é infinitamente ridículo e perverso comparar o Caso Freeport ao Caso Dreyfus. Façamos de conta que não aconteceu nada com o professor Charrua e que não houve indagações da Polícia antes de manifestações legais de professores. Façamos de conta que é normal a sequência de entrevistas do Ministério Público e são normais e de boa prática democrática as declarações do procurador-geral da República. Façamos de conta que não há SIS. Façamos de conta que o presidente da República não chamou o PGR sobre o Freeport e quando disse que isto era assunto de Estado não queria dizer nada disso. Façamos de conta que esta democracia está a funcionar e votemos. Votemos, já que temos a valsa começada, e o nada há-de acabar-se como todas as coisas. Votemos Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos, Kabila ou o que quer que seja. Votemos por unanimidade porque de facto não interessa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos.”
Mário Crespo, no “Jornal de Notícias” de ontem, 9 de Fevereiro

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

"Uma campanha negra alegre"

"Às vezes um ministro engana-se e diz que está em Mafamude quando na realidade se encontra em Gulpilhares. A oposição não perdoa: manifesta indignação porque são duas freguesias de Vila Nova de Gaia absolutamente inconfundíveis, condena a ofensa sem nome que foi feita à boa gente de Gulpilhares (e, até certo ponto, também à de Mafamude), chama o ministro ao Parlamento para que justifique o lapso inaceitável, exige ao chefe de Governo que demita o ministro e ao Chefe de Estado que convoque eleições antecipadas com carácter de urgência. Agora, que recaem suspeitas graves sobre José Sócrates, o PSD veio dizer que tem toda a confiança institucional no senhor primeiro-ministro, Luís Nobre Guedes, do CDS, manifestou apoio e solidariedade e o resto da oposição não disse nada de especial. Quando rebentou o escândalo BPN, foi parecido. Era difícil distinguir a lista de envolvidos nos negócios pouco claros do banco de um conselho de ministros do Governo de Cavaco Silva. O sonho de qualquer militante do PS. E que disse o PS? Nada de especial. Parece evidente que a melhor maneira de promover a concórdia e a cooperação estratégica dos principais partidos é acusar os seus dirigentes de ilícitos graves. Os adversários políticos não perdoam a quem comete lapsos menores, mas dão a mão a quem é acusado de delitos graves. São feitios. A campanha negra, a existir, aparenta ser fruto de geração espontânea. Não há quem não repudie o ataque cobarde e ignóbil a José Sócrates, e andar simultaneamente a orquestrar e a repudiar o ataque seria especialmente cobarde e ignóbil. Mesmo para políticos. Em todo o caso, mais do que investigar o caso Freeport, eu gostaria que fosse investigada a campanha negra sobre o caso Freeport. Os conspiradores, se existem, devem ser detidos. E, depois, condecorados. Isto porque esta campanha negra, na eventualidade de ser real, é a iniciativa mais bem planeada, organizada e executada da política portuguesa. Portugal precisa de gente com este talento e esta capacidade de trabalho na vida política. São profissionais competentes na política, porque sabem escolher os factos mais delicados e a altura mais prejudicial para os revelar, são fortes na diplomacia e nos negócios estrangeiros, pela facilidade com que envolveram a polícia inglesa, e são rigorosos a ponto de desencantarem mails com mais de três anos quando eu tenho dificuldade em lembrar-me dos que recebi ontem. Menos dos que incluem fotografias de senhoras nuas. É possível que os autores da campanha negra sejam os melhores políticos portugueses das últimas cinco ou seis décadas."
Ricardo Araújo Pereira, na “Visão” do passado dia 5 de Fevereiro

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Václav Klaus - Palavras escaldantes sobre a gélida Davos

O jornalista americano, Jay Nordinger (editor da National Review) entrevistou em Davos, em pleno Fórum Económico Mundial, na tarde do passado dia 31 de Janeiro, Václav Klaus, o actual Presidente da República Checa, que detém neste primeiro semestre de 2009 a presidência da União Europeia.
Questionado sobre o encontro que mantera no dia anterior com Al Gore, o checo afirmou: “Al Gore chama negacionistas às pessoas que discordam dele. Ouvi-o a dizer isto, ontem mesmo, no Centro de Congressos. Ele sabe que eu sou, neste momento, o mais importante negacionista a nível mundial. Ainda assim, encontrou-se comigo durante duas horas e tivemos uma discussão normal e amigável. Eu sou um negacionista, mesmo não gostando da expressão. Penso que não há nenhum aquecimento global. Não vejo dados estatisticos que o suportem. Não acredito nas conclusões do IPCC. Em termos climáticos há teorias contaditórias e eu tenho pena que pessoas como Al Gore não estejam disponíveis para ouvir outras teorias. Contrariamente a outros, eu ouço o todos têm para dizer.” O jornalista aproveitou depois para fazer referência ao livro de Klaus “Blue Planet in Green Shackles” (Planeta Azul em Algemas Verdes), perguntando-lhe o que é que está mais em perigo, o clima ou a liberdade. Klaus foi peremptório: “A liberdade! A liberdade está em perigo, a sua a minha, a liberdade de publicar, até a de discordar.” O jornalista insiste: “Está-me a dizer que Al Gore está a pôr em causa a liberdade?” O presidente checo responde: “Certas formas de ambientalismo e o alarmismo em volta do aquecimento global estão a desafiar a nossa liberdade. Al Gore é um destacado líder desse movimento.” Seguidamente, questionado por Jay sobre a crise financeira, Klaus afirma: “Estou muito mais preocupado com as reformas resultantes da alegada crise, do que com a crise em si mesma. Esta crise vai ser usada pelos políticos para conter o crescimento económico dos pequenos países. Neste domínio, os políticos têm-se revelado, ultimamente muito activos e eu desconfio sempre dessa hiperactividade, que serve muito mais para ganhar votos e popularidade que para salvar o que quer que seja.”
Apache, Fevereiro de 2009

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Parecer jurídico

“A desenvoltura com que quase todos os nossos Governos Constitucionais se têm julgado habilitados a legislar por decreto-lei, muito para além do estritamente necessário, é uma prática inconstitucional e deve ser reprovada.”
Diogo Freitas do Amaral, em entrevista ao “Jornal de Negócios” de 2/2/2009)

sábado, 31 de janeiro de 2009

"Yes we cão"

“Apesar do silêncio ciumento que os meios de comunicação internacionais lançaram sobre o assunto, a notícia mais importante da actualidade não escapou aos nossos jornalistas: em princípio, existe a possibilidade de, se calhar, Obama vir a ter talvez um cão quiçá português. Há reportagens sobre criadores, entrevistas com veterinários, perfis de exemplares da raça. E é quase certo que se está a preparar uma investigação de fundo sobre a displasia da anca e carraças em geral. Que Obama teve a capacidade de mobilizar os americanos toda a gente sabia; que seria capaz de mobilizar os portugueses era mais difícil de prever. Aos americanos, prometeu livrá-los da pior crise de que há memória; a nós, disse que ia arranjar um cão. Para uns, houve oratória empolgante, patriotismo místico, um projecto histórico comum; para outros, tomem lá um bicho. Bicho esse que é nosso compatriota mas que, ainda assim, continua sendo um bicho. Não se pode dizer que sejamos um povo ao qual é difícil agradar. No entanto, a manobra, apesar de engenhosa, pode sair cara a Obama. É verdade que conquistou o povo português usando a estratégia com que os pais conquistam filhos de seis anos. Mas, uma vez adquirido o animal, o nosso herói deixará de ser Obama. Depois do Manchester de Cristiano Ronaldo e do Inter de Mourinho, também os Estados Unidos serão doravante designados como a América de Bobi. Continuará a haver cimeiras, mas os chefes de Estado reunir-se-ão na Casa Branca de Piloto. E os encontros decorrerão, de certeza, na Sala Oval de Pantufa. Qualquer vitória de Obama será também nossa, por via canina. Atrás de um grande homem há sempre um grande canídeo, como diz o ditado. A sorte de Obama é não ter tomado uma decisão definitiva sobre o bicho antes da cerimónia de investidura como novo Presidente. Se, por esta altura, o cão de origem portuguesa já fosse o animal de estimação da família Obama, boa parte dos nossos jornais exibiriam uma fotografia da tomada de posse e a legenda: «Preto jura a constituição sob o olhar do Bolinhas.» Bom, talvez não esteja a ser rigoroso. Para efeitos de comédia, distorci a tendência subtil dos jornais nacionais para celebrar tudo o que é português no estrangeiro. O mais provável é que a legenda dissesse «sob o olhar inteligente e meigo do Bolinhas». Ficaria triste, contudo, se o leitor concluísse daqui que alguma coisa me move contra o putativo cão português de Barack Obama. Nada disso. Será mais um a prestigiar o País no estrangeiro, a levar o nome de Portugal mais longe – e, tenho a certeza, com uma dignidade de que poucos se podem gabar. É certo que será mais um português a quem o Presidente americano dará ordens e ensinará a rebolar quando quiser. Nisso, o cão não se distinguirá especialmente de Durão Barroso. Mas, por uma vez, será o Presidente americano a andar atrás de um português para lhe limpar o cocó, em vez do contrário. Nisso, o cão distinguir-se-á bastante de Durão Barroso. Sim, tenho as maiores esperanças no bom desempenho do cachorro. Por mim, Cavaco pode começar a preparar uma comenda de pôr na coleira. Aqui para nós, sempre tem melhor destinatário do que muitas que ele tem atribuído.”
Ricardo Araújo Pereira, na revista “Visão” de 22 de Janeiro de 2009

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Do estudo independente da OCDE…

Ou, os homens e os ratos
No ‘site’ oficial do Partido Socialista, lia-se ontem (27 de Janeiro de 2008) em título: "Relatório da OCDE elogia política de Educação do Governo PS”. Hoje, no parlamento, o Primeiro-Ministro, José Sócrates afirmou: “Eu nunca disse que o relatório é da OCDE. É um estudo de peritos internacionais independentes”. Facto: Um dos “peritos internacionais independentes” que assina o “estudo” é Alexandre Ventura, professor de Ciências da Educação da Universidade de Aveiro, nomeado recentemente por Lurdes Rodrigues para presidir ao Conselho Científico para a Avaliação de Professores (CCAP), órgão criado pelo Ministério da Educação (ME) com a finalidade de simular credibilidade ao seu modelo de avaliação docente. Alexandre Ventura é, há muito, um ‘boy’ do PS que usou dados fornecidos pelo ME e entrevistas a outros ‘boys’, para escrever um relatório de credibilidade nula, onde nenhuma conclusão é fundamentada em qualquer relação de causa-efeito e onde as sugestões apresentadas mais não são que antecipações de medidas que o ME pretende implementar proximamente. O estudo independente da OCDE, não é um estudo, não é da OCDE e não é independente!
Apache, Janeiro de 2009

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Gurus da mediocridade

“Não é por haver algumas pessoas que se intitulam de cientistas da educação que a educação é uma ciência. Nunca foi. Não é. Nunca será. Em Portugal, nos últimos 30 anos, não houve uma verdadeira conversação em torno da educação, das políticas educativas e das pedagogias. Houve uma peça com muitos actores a repetirem o mesmo monólogo. Uma dúzia de gurus e, duas centenas de citadores e comentadores. O mal que esta falta de conversação fez à educação pública portuguesa não tem medida. O pior de tudo foi que as mil e uma propostas de reformas educativas apresentadas e nunca questionadas foram aceites pelos governantes como se de pura ciência se tratasse. Quanto mais citações dos gurus, maior a aparência de ciência essas propostas gozavam. E os quase trinta ministros da educação acreditaram que as propostas vindas da meia dúzia de gurus e citadas pelas duas centenas de comentadores eram pura ciência. E como bons positivistas acreditaram e caíram no logro de transformarem essas propostas em legislação para as escolas e em reformas curriculares. Em 30 anos, os políticos foram destruindo a qualidade da escola pública. Criaram uma enorme confusão. A escola pública tinha qualidade e os nossos diplomados ombreavam com os melhores do mundo. O único problema da escola pública era que não estava ao alcance de todos. Alguma qualidade que ainda persiste é devida ao bom senso, ao empenhamento e ao sacrifício dos professores. Felizmente, ainda há muitos professores que resistem às orientações tolas vindas do ministério da educação. Se assim não fosse, o desastre seria maior. Em Portugal, não há o hábito de discordar. Os gurus rodearam-se de uma aura de credibilidade inquestionável e têm sido protegidos por legiões de panegiristas. O compadrio, o nepotismo e a protecção dos que dizem bem de nós e nos adulam continuam a ser o timbre das elites portuguesas. É através da adulação e do compadrio que se sobe na vida.”
Ramiro Marques, no blogue “Profavaliação” de que é autor, Janeiro de 2009

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Taras e Manias

Ou, como os autores lhe chamaram, “Politicas de valorização do primeiro ciclo do ensino básico em Portugal”
Um relatório pago e editado pelo Ministério da Educação (ME), tornado hoje público, concluiu, com base em dados fornecidos pelo próprio ME, que todo o lixo por eles produzido nos últimos 4 anos é lixo de excelente qualidade. Que surpresa, não estava nada à espera. O Relatório baseia-se nos dados fornecidos pelo Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação do ME (GEPE) e em “reuniões” nas quais foram ouvidos 58 intervenientes no processo educativo, onde se incluíram 10 coordenadores de escola, sendo estes (da lista apresentada) os elementos entrevistados que mais próximo estão de uma sala de aula. Na página do ME, lê-se que o “estudo corresponde a uma avaliação intermédia, realizada durante a fase de implementação das reformas”, por uma equipa liderada por Peter Matthews (a qual inclui Alexandre Ventura, o oportunista que agora preside ao CCAP), de acordo com a metodologia usada pela OCDE. Destaca-se mais adiante que “as medidas desenvolvidas para a reorganização do 1.º ciclo já estão a produzir resultados”, conclusão que deixa clara a credibilidade do relatório. Medidas ainda em fase de implementação já produzem resultados mensuráveis, proporcionando “melhorias efectivas nos resultados educativos.” Melhor só na cochinchina. Acrescenta o ME que, apesar de serem cópias de “boas práticas de outros países (…) estão a atrair um crescente interesse a nível internacional.” Por outras palavras, já existia algo semelhante numa qualquer república das bananas, mas o facto de um país da União Europeia amochar perante o culto da parvoeira institucionalizada, está a transformar-nos num 'case study'.
Quanto aos principais resultados e às recomendações…
“A decisão de encerrar as escolas do 1.º ciclo de pequena dimensão é considerada positiva pelos autores do estudo, que consideram os benefícios de apostar em melhores instalações e enquadramento social em escolas maiores superiores às desvantagens associadas às viagens realizadas pelas crianças.” Os autores do relatório esqueceram-se de ter em conta inúmeros casos em que as crianças foram transferidas para escolas mais distantes da residência e com piores instalações.
“Os resultados no 1.º ciclo estão a melhorar e os alunos têm acesso a um currículo de mais qualidade.” Conclusão baseada nas ridículas provas de aferição que o ME tem levado a cabo no 1º Ciclo? Ou ainda melhor, conclusão sem fundamento?
“A alteração das regras de gestão das escolas, designadamente no que respeita à eleição do director, é encarada de forma positiva, na medida em que permite uma escolha baseada no mérito profissional dos candidatos.” Quando tínhamos um Presidente do Conselho Executivo eleito por toda a escola, o seu mérito profissional não era considerado, mas agora que temos um Director (na maioria dos casos, a mesma pessoa) eleito por 'meia dúzia' de iluminados, o seu mérito passou a ser valorizado.
“Apesar de reconhecer que a avaliação interna das escolas tem registado progressos significativos, o relatório recomenda a re-introdução [o erro de grafia é da responsabilidade do ME] da observação de aulas por parte dos inspectores.” Está tudo a decorrer optimamente, mas ainda seria melhor se, os inspectores, esses professores exemplares que há muitos anos trocaram as salas de aula pelos corredores da IGE, forem às escolas explicar como se deve dar uma aula. E finalmente, a tradicional cereja: “O relatório recomenda a eliminação da retenção no 1.º ciclo e a definição de critérios para «boas aulas».” Noto uma certa incongruência no discurso… Deixando de haver retenções, deduz-se (pelo tipo de raciocínio (sem ofensa) do ME) que todas as aulas são excelentes, pelo que o empenho na produção de receitas deve ser reencaminhado para outros níveis de ensino.
Apache, Janeiro de 2009

domingo, 25 de janeiro de 2009

"Não me mintas" – Rui Veloso

"Eu queria unir as pedras desavindas, escoras do meu mundo movediço. Aquelas duas pedras perfeitas e lindas das quais eu nasci forte e inteiriço. Eu queria ter amarra nesse cais para quando o mar ameaça a minha proa e queria vencer todos os vendavais que se erguem quando o diabo se assoa. Tu querias perceber os pássaros, voar como o Jardel sobre os centrais. Saber por que dão seda, os casulos… Mas isso já eram sonhos a mais. Conta-me os teus truques e fintas… Será que os Nike fazem voar? Diz-me o que sabes não me mintas, ao menos em ti posso confiar. Agora diz-me o que aprendeste de tanto saltar muros e fronteiras… Olha para mim e vê como cresceste com a força bruta das trepadeiras. Põe aqui a mão e sente o deserto tão cheio de culpas que não são minhas. E ainda que nada à volta bata certo, eu juro ganhar o jogo sem espinhas. Tu querias perceber os pássaros, voar como o Jardel sobre os centrais. Saber por que dão seda, os casulos… Mas isso já eram sonhos a mais."

[Blues Made in Portugal] Rui Veloso

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

"A crise está em crise" - Ricardo Araújo Pereira

"A todos os executivos que mantiveram Portugal em crise desde 1143 até hoje, muito obrigado.
Ou estou fortemente enganado (o que sucede, aliás, com uma frequência notável), ou a história de Portugal é decalcada da história de Pedro e o Lobo, com uma pequena alteração: em vez de Pedro e o Lobo, é Pedro e a Crise.
De acordo com os especialistas – e para surpresa de todos os leigos, completamente inconscientes de que tal cenário fosse possível – Portugal está mergulhado numa profunda crise. Ao que parece, 2009 vai ser mesmo complicado. O problema é que 2008 já foi bastante difícil. E, no final de 2006, o empresário Pedro Ferraz da Costa avisava no Diário de Notícias que 2007 não iria ser fácil. O que, evidentemente, se verificou, e nem era assim tão difícil de prever tendo em conta que, em 2006, analistas já detectavam que o País estava em crise. Em Setembro de 2005, Marques Mendes, então presidente do PSD, desafiou o primeiro-ministro para ir ao Parlamento debater a crise económica. Nada disto era surpreendente na medida em que, de acordo com o Relatório de Estabilidade Financeira do Banco de Portugal, entre 2004 e 2005, o nível de endividamento das famílias portuguesas aumentou de 78% para 84,2% do PIB. O grande problema de 2004 era um prolongamento da grave crise de 2003, ano em que a economia portuguesa regrediu 0,8% e a ministra das Finanças não teve outro remédio senão voltar a pedir contenção. Pior que 2003, só talvez 2002, que nos deixou, como herança, o maior défice orçamental da Europa, provavelmente em consequência da crise de 2001, na sequência dos ataques terroristas aos Estados Unidos. No entanto, segundo o professor Abel M. Mateus, a economia portuguesa já se encontrava em crise antes do 11 de Setembro. A verdade é que, tirando aqueles seis meses da década de 90 em que chegaram uns milhões valentes vindos da União Europeia, eu não me lembro de Portugal não estar em crise. Por isso, acredito que a crise do ano que vem seja violenta. Mas creio que, se uma crise quiser mesmo impressionar os portugueses, vai ter de trabalhar a sério. Um crescimento zero, para nós, é amendoins. Pequenas recessões comem os portugueses ao pequeno-almoço. 2009 só assusta esses maricas da Europa que têm andado a crescer acima dos 7 por cento. Quem nunca foi além dos 2%, não está preocupado. É tempo de reconhecer o mérito e agradecer a governos atrás de governos que fizeram tudo o que era possível para não habituar mal os portugueses. A todos os executivos que mantiveram Portugal em crise desde 1143 até hoje, muito obrigado. Agora, somos o povo da Europa que está mais bem preparado para fazer face às dificuldades."
Ricardo Araújo Pereira, na "Visão" de 11/12/2008

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A crise e os lucros (legais?) gerados pelo Protocolo de Quioto

Segundo o jornal espanhol “El País” (do passado dia 19 deste mês), em artigo assinado pelo jornalista Rafael Méndez, a alegada e tão propagandeada crise financeira está a ser aproveitada por várias indústrias para encerrarem portas e venderem os seus direitos de emissão de dióxido de carbono, encaixando assim somas avultadas de dinheiro. Em Abril passado (2008) o governo espanhol distribuiu a cerca de mil empresas industriais (na maioria cimenteiras, de ladrilhos e de papel) direitos (gratuitos) de emissão de 100 milhões de toneladas de CO2. Algumas dessas empresas, sobretudo fábricas de ladrilhos e de papel, aproveitando a subida da cotação do CO2 em bolsa (que chegou a atingir em Julho os 29 euros por tonelada) optaram, primeiro por reduzir a produção e depois por encerrar portas, vendendo os seus direitos de emissão. Com o aumento da oferta, o preço do dióxido de carbono foi caindo, cotando-se actualmente em cerca de 12 euros por tonelada. Tal não impediu, no entanto, a continuação dos encerramentos, com consequente aumento do desemprego, enquanto os lucros desta “manobra” se expandem, estimando-se já entre os 400 e os 500 milhões de euros.
Apache, Janeiro de 2009

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Perdeu os professores! Ganhará os homossexuais?

Segundo o “Diário de Notícias” do passado sábado, Sócrates propõe (ao que parece, numa moção ao congresso, escrita por António Costa) que o PS apresente no seu programa eleitoral para as próximas legislativas, a aprovação do casamento entre homossexuais. Politicamente, a jogada parece boa, enquanto os partidos de esquerda roubam votos ao PS pela insistência nas vergonhosas alterações impostas no domínio da educação, o PS rouba votos àqueles partidos, assediando a comunidade homossexual. No entanto, contrariamente ao que pensa o “menino de lata”, o que parece nem sempre é e mais esta machadada na moral cristã pode custar caro ao PS. Se assim não for, Maria de Lurdes Rodrigues ainda vai ter de reformular a sua célebre verborreia de Junho de 2006: “perdi os professores mas ganhei a opinião pública”, alterando-a para um mais rosado: perdi os professores mas ganhei os homossexuais. Será desta que António Costa vai abrir o Salão Nobre da Câmara de Lisboa aos “gays de Santo António”?
Apache, Janeiro de 2009

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

3º Aniversário

[O Último dos Moicanos completa hoje o terceiro aniversário. Vai daí, relembrando datas em que o tempo e a (des)inspiração o permitiam, retomo uma espécie de “escrita à deriva”.]
Por oposição (ou talvez não) às “cartas de amor”, aqui fica um…
Bilhetinho de “desamor”
Com um sorriso estendes-me o céu como tapete mas as tuas palavras são estrelas ninja com que me rasgas o peito… Acaricias-me a carne dilacerada, com o vento morno do teu olhar, mas cuidas-me as feridas com unguento de sal e cicuta… O amor que desesperadamente assassinas é o mesmo monstro que em mar de sôfregas lágrimas, adoras… O fosso de saudade que herculeamente cavas com a tua ausência é o campo de forças indómito que nos une… Lanças-me, anjo negro, o beijo mais apetecido, mas a paixão que semeámos é Fénix nas chamas do desejo renascida… Morra ela de nós, feda pútrida no mais fundo dos abismos, extinga-se no limiar da eternidade, se a cada sístole, o teu sangue não gritar o meu nome.
Apache, algures num passado não muito distante

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

“Português Técnico” por Margarida Moreira

A Directora Regional de Educação do Norte (DREN), a tal senhora que acha que contar piadas sobre o Primeiro-Ministro é um acto grave de indisciplina, mas apontar uma arma de plástico a um professor para exigir uma classificação melhor é uma brincadeira de mau gosto, tem-se revelado uma verdadeira pioneira na escrita de uma nova língua que muitos designam por “Português Técnico”, por analogia àquela estranha língua que Sócrates exibiu, no texto enviado por fax, que lhe permitiu concluir a cadeira de “Inglês Técnico” na Universidade Independente. O texto que a seguir transcrevo é parte de um ofício que Margarida Moreira enviou às escolas há cerca de dois meses, com indicações sobre os procedimentos para aquisição do “Magalhães”. "O pagamento dos Magalhães, nos casos em que a isso os pais sejam obrigados, estão a receber informação por sms devendo, em todas, constar a entidade 11023." Na semana passada, devido às más condições climatéricas, A senhora DREN viu-se novamente confrontada com a necessidade de envio de outro ofício e escreveu (entre outras pérolas) isto: “Os perigos de intempérie, inusitados em alguns concelhos, estão circunscritos, no momento, à segurança na estrada dos nossos alunos (gelo).” Entusiasmado com a leitura daqueles que serão (provavelmente) os mais belos nacos de prosa desta nova língua, questiono-me se haverá algum curso de novas oportunidades que o comum mortal possa frequentar para conseguir escrever assim? Ou será esta uma competência restrita de alguns iluminados?!
Apache, Janeiro de 2009

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

O Choque que parecia tecnológico afinal é térmico

Um testemunho na primeira pessoa
“Caros colegas, Como sabemos, dadas as condições físicas do edifício da nossa escola, esta (por muito que me custe dizer) é um barracão, ou um conjunto de barracões, de onde se salvam apenas umas quantas salas situadas no bloco/barracão central. Àqueles que, como eu, dão aulas nas oficinas e seus anexos aplica-se a expressão “o pessoal das barracas”. Até há poucos anos, as “barracas” eram espaços destinados sobretudo aos cursos de Artes, Mecânica e Electricidade, mas parece que agora calha a quase todos ter ali uma, duas ou mais horitas, seja em aula normal, apoio ou TOA. Desse pessoal faziam parte até há pouco tempo os colegas de Educação Física, que eram assim um misto de “pessoal das barracas” com “sem-abrigo”. Feitas as merecidas, embora bem tardias, obras nos ginásios, agora são apenas “sem-abrigo” a tempo parcial. Claro que deve haver aulas de Educação Física ao ar livre, mas por muito que o ar seja livre… a prática é feita no chão, e o chão dos pátios da nossa escola está vergonhoso e perigoso. No ano lectivo anterior, eu tinha 16 horas do meu horário numa das “barracas”, que é a Oficina de Artes Visuais; este ano “apenas” 11 horas. Nesse ano, cheguei a levar um termómetro para verificar a temperatura daquela oficina, enquanto uma colega levava outro para a Oficina de Mecânica. O meu, que verifiquei mais tarde ser pouco fiável, nunca desceu abaixo dos 12 graus; o dela chegou algumas vezes aos 9-10 graus. Temperaturas preocupantes, que faziam tremer o corpo e fazer doer músculos e articulações. Ora, acontece que na sexta-feira, 9 de Janeiro, decidi levar para aquelas oficinas um termómetro que tenho como fiável. Estive por ali entre as 9h e as 9h45m. Em ambas as salas registavam-se 6 graus. Para quem não sabe, 5-6 graus é a temperatura que está no interior dum frigorífico, na parte destinada aos legumes, iogurtes e ovos. Dali fui para a sala 7, gelado, como é de calcular, dar uma aula de Educação Visual a uma turma de 7º ano. A sala 7 é uma das mais frias do bloco/barracão central do edifício mas, como lá se registavam 13 graus, deu para sentir o corpo a aquecer, ou melhor, a descongelar. A seguir continuei na mesma sala mas com uma turma de 11º ano que, por acaso, vinha de 90 minutos passados na Oficina de Artes Visuais. Não vou registar as reacções e palavras de vários alunos, nem as propostas de insurreição vindas de alguns, opto apenas por referir que uma das alunas, pálida e a tremer, veio mostrar-me as mãos e disse: – Professor, olhe para as minhas mãos. Estive a trabalhar na OAV com luvas, e veja como estão. Não sinto estes dedos. Tinha os dedos mínimos brancos, sem sangue, por inteiro. Claro que aos alunos (duma turma com bom comportamento) apetecia tudo menos voltar a sentar-se. Andavam pela sala, mexiam-se e falavam como quem procura, de forma irracional, fazer qualquer coisa para “quebrar o gelo”. A vontade de se sentarem, mesmo numa sala com mais sete graus do que a anterior, não era nenhuma. Mas lá se sentaram e a aula acabou por decorrer normalmente, apesar do início tardio. Ultimamente, tem sido frequente dar aulas na OAV com boina ou gorro e cachecol. O mesmo fazem alunos e alunas, alguns também com luvas. Os dois aquecedores que estão na oficina produzem pouco mais calor do que um isqueiro. A 1m de distância, o ar que as ventoinhas empurram já chega frio. Às vezes acontece os alunos irem até ao pátio onde, por ventura, poderá estar mais um ou dois graus, sobretudo ao sol. Nós sabemos os para quês…, mas aí ficam duas perguntas nestes moldes: Para quê tantas caganças e vaidades dos nossos governantes com a distribuição dos Magalhães, se há tantas escolas e tantas salas de aula por onde passeiam e habitam ratos e baratas, onde chove, entra vento, cheira mal, faz frio ou calor impróprios para se ensinar e aprender com gosto e dignidade? Para quê tantas caganças e vaidades com o Magalhães, se falta aquecimento nas salas, se faltam vidros nas janelas, fechaduras nas portas, lâmpadas nos tectos, apagadores nos quadros e papel higiénico nas casas de banho? Apetece-me dizer “Vanitas vanitatum, et omnia vanitas”. “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade” é uma frase que, na Idade Média, aparecia escrita à entrada de misericórdias e de cemitérios. Por acaso, ou não, o pedaço de edifício mais antigo que subsiste de pé em Setúbal tem essa inscrição. Trata-se do Portal da Gafaria (hospital de leprosos) datado do séc. XIV. Será que é a sina de tantos de nós vivermos e trabalharmos (e morrermos) enleados nas teias de vaidades dos governantes e poderosos?”
António Moura Galrinho, Professor da Escola Secundária de Sebastião da Gama (Setúbal)

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Da entrega ou não dos Objectivos Individuais

Nos dois blogues mais frequentados, dedicados fundamentalmente a temas relacionados com a docência: “A educação do meu umbigo” do Paulo Guinote e “Profavaliação” do Ramiro Marques, tem-se debatido ultimamente a questão da obrigatoriedade ou não da entrega dos Objectivos Individuais (OI’s). Na minha opinião a polémica faz pouco sentido. Em nenhum diploma (dos vários produzidos pelo Ministério da Educação (ME)) se faz referência ao dever (ou à obrigatoriedade) de entrega dos OI’s, pelo que, dificilmente alguém considerará a sua não entrega como violação de um dever profissional, a menos que tal obrigatoriedade seja instituída, por escrito, pelo Presidente do Conselho Executivo (PCE) (ou Director) em Ordem de Serviço, devidamente numerada, datada e assinada, podendo assim, em caso de incumprimento, o PCE acusar o docente de violação dos deveres de zelo e de obediência. No entanto, não creio que a maioria dos PCE’s opte por este caminho. Esta atitude, no actual quadro legal, poderia conduzir a suspeição de usurpação de poderes (por tornar obrigatório algo que a lei não define como tal) e, violação dos procedimentos da avaliação de desempenho (por transgressão do disposto no nº1 do artigo 44º do Estatuto da Carreira Docente (Decreto-Lei nº 15/2007, de 19 de Janeiro, adiante designado ECD). Sendo assim, não vejo outra forma alternativa de os PCE’s cumprirem o Decreto Regulamentar nº 1-A/2009 (no que aos OI’s diz respeito) que não seja a simples comunicação aos docentes (na forma de informação) do calendário com os prazos de entrega dos OI’s e das fases do processo de avaliação. Os colegas que quiserem entregarão os OI’s e os restantes ignorarão a informação. Desta opção (repito) a lei não prevê consequências. Para que servem (no caso dos docentes) então os OI’s? A meu ver, para nada! Lurdes Rodrigues, uma socióloga do trabalho, quis transpor para as escolas um modelo de avaliação idêntico aos aplicados em algumas empresas, onde devido ao tipo de tarefas, o rendimento dos trabalhadores é facilmente quantificável. Não é o caso das tarefas docentes. Provavelmente, sabendo que este tipo de avaliação dificilmente seria aceite, quis mantê-la “parcialmente escondida”, no início da governação, quando em 2006 negociou o actual ECD com os sindicatos, evitando, desde logo, acesa polémica que pudesse sentenciá-la a um curto período de tutela. Só com a publicação do Decreto Regulamentar nº 2/2008 ficou clara a completa desadequação deste modelo à realidade educativa. Daí que a expressão “objectivos individuais” não apareça transcrita uma única vez em todo o texto do ECD. O acima citado nº 1 do artigo 44º deixa claras quais são as fases do processo de avaliação… “O processo de avaliação do desempenho compreende as seguintes fases: a) Preenchimento de uma ficha de avaliação pelo coordenador do departamento curricular ou do conselho de docentes respectivo; b) Preenchimento de uma ficha de avaliação pelo presidente do conselho executivo ou pelo director da escola ou agrupamento de escolas; c) Preenchimento pelo avaliado de uma ficha de auto-avaliação sobre os objectivos alcançados na sua prática profissional, na qual identificará a formação contínua realizada; d) Conferência e validação dos dados constantes da proposta de classificação, quando esta apresente as menções de Excelente, Muito bom e Insuficiente, pela comissão de coordenação da avaliação; e) Entrevista dos avaliadores com o avaliado para conhecimento da proposta de avaliação e apreciação do processo, em particular da ficha de auto-avaliação; f) Reunião conjunta dos avaliadores para atribuição da classificação final.” Os OI’s aparecem (pela primeira vez) referenciados no nº 1 do artigo 9º do DR 2/2008, onde se lê: “Os objectivos individuais são fixados, por acordo entre o avaliado e os avaliadores, através da apresentação de uma proposta do avaliado no início do período em avaliação (…)”. Ora, não fazendo eles parte das fases de avaliação, qual a utilidade da sua entrega no início do período em avaliação? Serão eles alvo de classificação? Uma vez mais encontramos a resposta no ECD. Atente-se no nº 3 do artigo 45º… “A classificação dos parâmetros definidos para a avaliação do desempenho deve atender a múltiplas fontes de dados através da recolha, durante o ano escolar, de todos os elementos relevantes de natureza informativa, designadamente: a) Relatórios certificativos de aproveitamento em acções de formação; b) Auto-avaliação; c) Observação de aulas; d) Análise de instrumentos de gestão curricular; e) Materiais pedagógicos desenvolvidos e utilizados; f) Instrumentos de avaliação pedagógica; g) Planificação das aulas e instrumentos de avaliação utilizados com os alunos.” Tal como referi no início, não há qualquer referência aos OI’s no ECD. Não encontro portanto qualquer obrigatoriedade nem sequer vantagem na sua entrega. A propósito desta e de outras “trapalhadas” do ME, relembro que os Decretos Regulamentares, que como o próprio nome sugere são regulamentos, não podem violar a legislação (leis e decretos-lei) que lhes é hierarquicamente superior. Recorde-se que constitui regra básica de resolução da conflitualidade entre diplomas, ‘lex superior derogat legi inferiori’ (lei superior afasta lei inferior).
Apache, Janeiro de 2009