“O cartaz do PS é uma reprodução da bandeira nacional, mas com senhoras verdes à esquerda, senhoras vermelhas à direita, e José Sócrates no lugar da esfera armilar. É possível que as senhoras verdes estejam verdes de fome, e as senhoras vermelhas estejam vermelhas de irritação por estarem desempregadas. Mas tanto as senhoras verdes como as senhoras vermelhas olham para o primeiro-ministro com benevolência, o que leva a acreditar que se trata de uma fotomontagem. Na testa de uma das senhoras vermelhas está o slogan: "Avançar Portugal". Uma agramaticalidade que pode ser mais um efeito da insatisfação social: tendo em conta o estado a que chegou a relação entre o Governo e os professores, é natural que não tenha havido ninguém a avisar o PS de que "Avançar Portugal" não é das frases mais escorreitas que já foram escritas no nosso idioma.
Em contraponto, os cartazes do PSD apresentam desde logo uma vantagem cromática: são os únicos que incluem uma senhora que não está verde nem vermelha. Manuela Ferreira Leite aparece com a sua cor natural ao lado de frases que o PSD recolheu junto daquela entidade a que antigamente se chamava "povo" e a que hoje se chama "pessoas". Antes das frases, para que não haja dúvidas sobre a sua autoria, diz: "Ouvimos os Portugueses", assim mesmo, com maiúscula. O PSD, à semelhança do que sucede com os outros partidos, aproveita a campanha para ouvir os portugueses, e faz questão de os escutar com particular atenção agora, uma vez que vai passar os próximos cinco anos a ignorá-los. Há um tempo para tudo.
O cartaz do PCP contém a palavra "Mudança" (change, em inglês), e a frase "Sim, podemos ter uma vida melhor" (em inglês, "Yes, we can", etc.). Onde é que eu já ouvi isto? Não me lembro, mas parece-me que a fotografia do cartaz mostra um Jerónimo de Sousa bastante mais bronzeado do que é costume. A campanha dos comunistas portugueses usa os mesmos lemas que a campanha do chefe do imperialismo americano, facto que mais uma vez me obriga a constatar que não percebo nada de política.
O cartaz mais arriscado é o do CDS. Ao lado da fotografia de Paulo Portas aparece a frase "Há cada vez mais pessoas a pensarem como nós". "Sim, mas são todos sócios da Autocoope", dirão os cínicos que sistematicamente identificam o discurso do CDS com o dos taxistas. O certo é que a mensagem do cartaz é arriscada na medida em que, para chegar à conclusão de que há cada vez mais pessoas a pensar como o CDS, os democratas-cristãos tiveram forçosamente que fazer uma sondagem. Ora, os democratas-cristãos têm-nos dito com muita insistência que não devemos fiar-nos nas sondagens. Que fazer? Eis um cartaz que estimula o pensamento político mas também o filosófico.
Quanto ao Bloco, que eu tenha visto, não tem ainda novos cartazes com as suas principais caras. O Bloco tem, evidentemente, caras para pôr em cartazes, mas talvez não saiba ainda quais dessas caras vão estar nos cartazes do PS. Há que esperar e ver quem sobra.”
Ricardo Araújo Pereira, na “Visão” do passado dia 27